A sucumbência pode ser objeto de recurso autônomo e não impede o cumprimento de sentença da condenação principal

Não é incomum que os advogados se deparam com situações nas quais a sentença é favorável ao seu cliente...

Hélio Vieira e Zênia Cernov*
Publicada em 24 de outubro de 2019 às 13:54
A sucumbência pode ser objeto de recurso autônomo e não impede o cumprimento de sentença da condenação principal

Não é incomum que os advogados se deparam com situações nas quais a sentença é favorável ao seu cliente (seja pela procedência ou improcedência), não havendo interesse recursal da própria parte, mas a sucumbência foi fixada de forma incorreta, sem atender aos parâmetros definidos no Código de Processo Civil. A título de exemplo, a sentença que fixa os honorários em valor nominal irrisório, ou em percentual abaixo do mínimo previsto no art. 85 § 2º do CPC. Nesse caso, ao advogado interessa recorrer da sentença para majorar seus honorários e adequá-los aos parâmetros legais. 

É importante ao advogado ter em mente que a sucumbência é parcela autônoma da condenação e lhe pertence, conforme está previsto tanto no Estatuto da OAB quanto no Código de Processo Civil:

“EAOAB, Art. 23. Os honorários incluídos na condenação, por arbitramento ou sucumbência, pertencem ao advogado, tendo este direito autônomo para executar a sentença nesta parte, podendo requerer que o precatório, quando necessário, seja expedido em seu favor.”

“CPC, Art. 85. A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor. 

§ 14.  Os honorários constituem direito do advogado e têm natureza alimentar, com os mesmos privilégios dos créditos oriundos da legislação do trabalho, sendo vedada a compensação em caso de sucumbência parcial.”

Por tal motivo, tem legitimidade própria para recorrer quanto ao valor fixado a título de sucumbência. O recurso será interposto pelo advogado, em nome próprio, ou em nome da sociedade que integra: 

“O advogado, na condição de terceiro interessado, tem legitimidade para recorrer de parte da sentença onde fixados os honorários” (STJ, REsp 724.867/MA, Rel. Ministro FERNANDO GONÇALVES, Quarta Turma, julg. 17/03/2005, DJ 11/04/2005, p. 330).

Mais ainda, as características que acompanham essa condenação impõem que o recurso pode ser interposto independentemente do interesse recursal da parte. Assim, é possível que o advogado opte por não recorrer da sentença quanto ao principal, mas interponha recurso, em separado, quanto aos honorários de sucumbência. Fundamentam essa afirmativa, o fato de que trata-se de parcela autônoma da condenação, pertencente ao advogado conforme previsto no art. 23 do Estatuto da OAB, supra transcrito; e o fato de que o Código de Processo Civil admite a cisão da sentença em capítulos. Essa permissão é dada pelo art. 523: 

“Art. 523.  No caso de condenação em quantia certa, ou já fixada em liquidação, e no caso de decisão sobre parcela incontroversa, o cumprimento definitivo da sentença far-se-á a requerimento do exequente, sendo o executado intimado para pagar o débito, no prazo de 15 (quinze) dias, acrescido de custas, se houver.”

A respeito desse dispositivo, o artigo “Novo CPC e a cisão da sentença em capítulos”, de Maurício Pereira Cabral, assim elucida a separação da sentença em capítulos: 

“Esse comando inova a ordem processual, uma vez que o CPC/1973 não previa expressamente a chamada ‘cisão da sentença em capítulos’, o que gerava diferentes interpretações pela doutrina e pela jurisprudência, majoritariamente contrária à cisão.

(...) Ora, a interpretação que se constrói dos dispositivos citados em conjunto com o art. 523 é a existência da coisa julgada de capítulo incontroverso da sentença, ou seja, a ocorrência do trânsito em julgado parcial do processo quando parte da decisão não é objeto de recurso.” 

(https://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI258979,101048- Novo+CPC+e+a+cisao+da+sentenca+em+capitulos, div. em 158/05/2017). 

De fato, esse dispositivo admite não só que o advogado recorra de forma autônoma exclusivamente quanto aos honorários como, igualmente, admite que seja efetivado o cumprimento de sentença da condenação principal, se transitada em julgado. Isso porque o recurso quanto à sucumbência não impede o trânsito em julgado da sentença quanto à sua parte principal. 

Até porque o advogado pode promover o cumprimento de sentença autônomo de seus honorários. Em nosso livro “Honorários Advocatícios” (LTr, 2018), assim elucidamos essa questão: 

“O advogado pode promover o cumprimento de sentença em conjunto com o crédito de seu cliente (em peça única, com o crédito principal e a sucumbência no mesmo procedimento, apenas separando-os na planilha de cálculos) ou, se preferir, promovê-la em separado, em nome próprio (caso em que promoverá dois cumprimentos de sentença, um do crédito principal e outro dos honorários de sucumbência).” (p.76)

Ressaltamos ainda que o preparo recursal, se for recurso autônomo, será calculado exclusivamente sobre a parte da sentença que está sendo objeto do recurso, qual seja, sobre os honorários de sucumbência fixados no processo. Os regimentos de custas impõe, em regra, que o preparo recursal seja calculado sobre o valor da “condenação”. Ora, no caso do recurso quanto a honorários de sucumbência, interposto de forma autônoma pelo advogado, a “condenação” propriamente dita é a parte da sentença que fixou os honorários em seu favor, servindo de base de cálculo para o preparo recursal. 

A respeito, exemplificamos o seguinte precedente: 

“Agravo de Instrumento. Preparo de apelação. Ação de cobrança. Recurso que versa somente sobre honorários advocatícios. Requerente procedeu ao recolhimento das custas sobre o valor da verba honorária pleiteada. Admissibilidade. Garantia ao acesso ao duplo grau de jurisdição. Direito fundamental decorrente do acesso à Justiça. Decisão reformada. Recurso provido.” 

(TJ/SP, AI 3373510.2012.826.0000, 38ª Câm. Dir. Privado, Rel. Spencer Almeida Ferreira, publ. 27/04/2012). 

Por outro lado, por ser verba de titularidade do advogado, e não da parte, a assistência judiciária eventualmente deferida à parte também não se estende ao advogado, devendo este recolher o preparo ou requerer a gratuidade em nome próprio: “(...) a teor do art. 10 da Lei n. 1.060/50, referido beneplácito é pessoal e intransferível, de modo que não se comunica ao procurador da requerente” (TJ/SC, AC 000819382.2013.824.0008, 2ª Câm. Dir. Comercial, Relª. Rejane Andersen, julg. 158/09/2018). 

Com base nessa autonomia, o advogado deve proceder da seguinte maneira: propõe o recurso exclusivamente quanto aos honorários de sucumbência (caso não haja interesse de recorrer da parte principal da sentença); promove o cumprimento de sentença da parte principal (caso não haja recurso da parte contrária); após o trânsito em julgado do capítulo da sentença quanto aos honorários, com o julgamento do recurso, promove novo cumprimento de sentença quanto a estes. 

* São advogados e autores dos livros “Estatuto da OAB, Regulamento Geral e Código de Ética interpretados artigo por artigo” (LTr, 2016) e “Honorários Advocatícios” (LTr, 2018).

Comentários

  • 1
    image
    waldemir seixas 25/10/2019

    Então trocado em miúdos é o seguinte: Além do que já foi cobrado a título de Honorários Advocatícios(20%), os caras ainda tem direito a ficar com a sucumbência(só que quem perdeu a ação foi a União e quem ganhou foram os funcionários públicos e não o Advogado). Vocês já viram as caras desses dois espertos(verdadeiros ratinhos), a pergunta que não quer calar: "Quem poderá nos defender", levando-se em consideração que tem muita gente grande envolvida.

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