Bolsonaro: quem manda sou eu

"Enquanto todos, eu disse todos os chefes de estado dos países do mundo dariam o pescoço para obterem a vacina para salvar o seu povo, Bolsonaro agora há pouco deu-se ao luxo de declarar: 'toda e qualquer vacina está descartada'", escreve Denise Assis, do Jornalistas pela Democracia

Denise Assis
Publicada em 22 de outubro de 2020 às 11:42

Bolsonaro e vacina (Foto: Reuters)

O general Eduardo Pazuello, que atua como ministro da saúde apareceu com febre. Estados emocionais abalados costumam enviar para o corpo notícias de fragilidade que baixam as defesas imunológicas. Mas, por via das dúvidas, submeteu-se a exames e testou positivo para a Covid-19. Por meio de sua assessoria, mandou confirmar o diagnóstico. Em tempos de pandemia, todo cuidado é pouco. Em tempos em que se é o “coordenador” da pandemia, muito mais cuidados são necessários. Principalmente quando o “chefe” é uma toupeira que briga com os fatos, se arvora em peitar a Ciência e se investe do papel de “charlatão”, receitando o que não deve e sonegando o que é preciso. Por exemplo, vacinas já tidas como eficientes, (conforme a chinesa sinovac, anunciada pelo Instituto Butantã – SP).

Enquanto todos, eu disse todos os chefes de estado dos países do mundo dariam o pescoço para obterem a vacina para salvar o seu povo, Bolsonaro agora há pouco deu-se ao luxo de declarar: “toda e qualquer vacina está descartada”. Em seguida, se irritou com uma repórter que perguntou se não há comunicação entre ele e Pazuello. Em resposta, mandou o ministro da saúde cancelar a intenção de compra da vacina sinovac. E arrematou com aquela frase de moleque inseguro, do Vale da Ribeira, que invejava os filhos do Rubens Paiva, por passearem na sua frente, a cavalo e tomarem banho de piscina, enquanto ele os espiava do muro, derretendo no sol a pino: “o presidente sou eu”.

Bolsonaro tem baixa autoestima, recalques da infância, trauma por ver o pai ser preso por praticar odontologia sem ter diploma de dentista. Bolsonaro nunca vai se livrar do eco das broncas dos superiores do Exército, mestres em humilhar subordinados. Bolsonaro juntou tudo isto numa só cesta e transformou-se num déspota inseguro, com pitadas de orientações ideológicas de ultradireita e, muito, de falta do que fazer nos corredores da Câmara, onde ficou por 28 anos sem apresentar um projeto que prestasse.

O resultado desse amontoado de sentimentos negativos transformou-se em ressentimento, que o leva a três por dois repetir que quem manda é ele. Há limites. E ele soube bem que limites são esses, quando o ministro do STF (agora aposentado), Celso de Melo, escreveu nota puxando-lhe as orelhas, alertando que os poderes têm autonomia e que não convinha colocar as unhas de fascista de fora, pois seria enquadrado nos limites constitucionais como um cidadão qualquer.

Pazuello é pau mandado, age como subordinado como mero gerente de um sistema de saúde que desconhecia como funcionava, até ser jogado no cargo, batendo continência e assinando recomendações para o uso de remédio ineficaz (a cloroquina), coisa que os seus antecessores se recusaram a fazer. Num rasgo de bom senso, depois de pressionado pelo conjunto de governadores, testemunhas do que se passa nos recônditos desse país com a falta de recursos e o excesso de contágio, assinou termo de compromisso para a aquisição da vacina da China – aquele país que Bolsonaro se recusa até a dizer o nome -, mas que numa atitude superior, bem ao estilo chinês, continua nos comprando toneladas de produtos, no mais puro estilo pragmático e cortês, como devem ser as relações entre países soberanos.

O que Bolsonaro não sabe é que pensando ter ganho trono, cetro e coroa, atenta contra a vida dos brasileiros, contra a economia que quer ver crescer e contra os princípios constitucionais que rezam ser a saúde um direito de todos. A saúde não pode ser pautada por ideologia. A pandemia não obedece a recalques de infância de déspotas mal resolvidos.

Bolsonaro ignora – porque não sabe, não procura saber e tem raiva de quem sabe -, que há normas internacionais e rigores de leis e tribunais, para punir mandatários que atentam contra a vida do seu povo. O título de “genocida” nunca lhe caiu tão bem. Esta fatura vai chegar.

Denise Assis

Jornalista. Passou pelos principais veículos, tais como: O Globo; Jornal do Brasil; Veja; Isto É e o Dia. Autora de "Propaganda e cinema a serviço do golpe - 1962/1964" e "Imaculada". Membro do Jornalistas pela Democracia

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