Brasil de Bolsonaro termina estagnado com resultado ruim no principal índice de corrupção do mundo

Índice de Percepção da Corrupção (IPC), lançado hoje pela Transparência Internacional, mostra que o Brasil teve uma década perdida no combate à corrupção

Assessoria
Publicada em 31 de janeiro de 2023 às 15:48
Brasil de Bolsonaro termina estagnado com resultado ruim no principal índice de corrupção do mundo

O ex-presidente Jair Bolsonaro encerrou seu mandato deixando o Brasil estagnado com desempenho ruim no Índice de Percepção da Corrupção (IPC), divulgado hoje pela Transparência Internacional e considerado o principal indicador de corrupção no mundo. Em uma escala de 0 a 100, o país alcançou apenas 38 pontos, mesma nota obtida nas duas edições anteriores do índice. Apesar da nota inalterada, o país passou da 96a para a 94a colocação, entre os 180 países e territórios avaliados -- isto ocorre pela piora da nota de outros países. O Brasil ficou empatado com Argentina, Etiópia, Marrocos e Tanzânia.

A série histórica do IPC mostra que o Brasil teve uma década perdida no combate à corrupção. No período que vai de 2012, quando uma mudança na metodologia do índice passou a permitir comparação em série histórica, a 2022, o país perdeu 5 pontos e caiu 25 posições no ranking, caindo da 69ª para a 94ª colocação.

O resultado reflete o desmanche acelerado dos marcos legais e institucionais anticorrupção que o país havia levado décadas para construir. Junto com o retrocesso na capacidade de enfrentamento da corrupção, o Brasil sofreu degradação sem precedentes de seu regime democrático, como destacado pelo relatório Retrospectiva Brasil 2022, lançado hoje pela Transparência Internacional -- Brasil.

O resultado do IPC 2022 coloca o país, mais uma vez, abaixo da média global (de 43 pontos), da média dos BRICS (39 pontos), da média regional para a América Latina e o Caribe (43 pontos) e, ainda mais distante, da média dos países do G20 (53 pontos) e da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico, a OCDE (66 pontos), bloco cuja adesão era um projeto do governo Bolsonaro.

As melhores notas foram atribuídas a Dinamarca (90 pontos), Finlândia e Nova Zelândia (os dois países com 87 pontos) e Noruega (84 pontos), e Singapura e Suécia (ambos com 83 pontos). No extremo oposto, os países com as piores avaliações pelo IPC de 2022 foram Somália (12), Síria e Sudão do Sul (ambos com 13) e Venezuela (14), todos estes envolvidos em conflitos prolongados.

Elaborado desde 1995, o IPC é composto por 13 pesquisas e avaliações de especialistas, produzidas por instituições reconhecidas internacionalmente. Para desenvolver o índice, a Transparência Internacional compila anualmente os resultados de perguntas destas pesquisas, que dizem respeito à percepção da corrupção no setor público dos países em diferentes aspectos. No caso do Brasil, o resultado teve como fonte oito destas pesquisas.

Retrospectiva Brasil 2022 -- No relatório lançado, nesta terça-feira, a TI Brasil faz uma análise detalhada dos muitos retrocessos e poucos avanços que marcaram a agenda anticorrupção e de transparência no ano passado, englobando governo federal, Congresso Nacional, Judiciário, Ministério Público e o espaço cívico nacional.

Entre os fatos destacados, o documento analisa o “Orçamento Secreto” -- considerado o maior esquema de institucionalização da corrupção que se tem registro no Brasil -- e seus impactos sobre a qualidade de políticas públicas essenciais, a pulverização da corrupção nos municípios e, ainda mais grave, a distorção do processo eleitoral, resultando no fortalecimento dos partidos mais fisiológicos e lideranças mais corruptas da política brasileira.

O relatório identifica o Orçamento Secreto como principal moeda de compra da blindagem política de Bolsonaro no Congresso, garantida pelo Centrão. Maior beneficiário dos recursos secretos, o presidente da Câmara Arthur Lira manteve mais de 140 pedidos de impeachment paralisados e se reelegeu deputado federal, com o dobro de votos que teve na eleição anterior.

Outra peça-chave para a blindagem de Bolsonaro e seus aliados, descrito pelo relatório, foi a neutralização da Procuradoria-Geral da República. As omissões da PGR em 2022 tiveram graves consequências para a impunidade das condutas criminosas apuradas pela CPI da Pandemia, o desmanche continuado da governança ambiental e de proteção aos direitos indígenas, o avanço desimpedido de movimentos golpistas e ataques às instituições democráticas, além de retaliações a membros do próprio Ministério Público atuantes em casos de corrupção.

O relatório também analisa como o vácuo constitucional da PGR foi preenchido pela exacerbação do papel do STF e do TSE. Sem poder contar com a PGR para pedir a instauração de processos ou medidas cautelares nas duas cortes, ministros passaram a agir de ofício e homologar coletivamente heterodoxias frente às graves ameaças e ataques às instituições e à ordem democrática. Se esta foi a estratégia possível de sobrevivência das instituições, o relatório da Transparência Internacional - Brasil também alerta que a violação continuada de garantias processuais e direitos individuais trazem consequências perigosas para o Estado de direito e minam, progressivamente, a reserva de autoridade da Justiça.

Por fim, o documento analisa a redução do espaço cívico, com retração extrema do acesso à informação pública, disseminação sistemática de fake news e ataques continuados a jornalistas -- principalmente mulheres. Porém, identifica forte reação da sociedade civil em 2022 e avalia como fundamentais as manifestações que reuniram o empresariado, ONGs, academia e a comunidade internacional para a dissuasão -- ao menos no curto prazo -- de planos golpistas, cuja existência foi posteriormente comprovada materialmente.

Acuado desde antes da posse pela corrupção fartamente comprovada da sua família, a prioridade de Bolsonaro durante todo o seu governo foi garantir sua blindagem, que buscou através da neutralização do aparato institucional e legal que o ameaçava. O impacto disso foi muito maior do que a impunidade nos casos de corrupção e lavagem de dinheiro da família. Durante quatro anos, Bolsonaro desmontou o sistema de freios e contrapesos da democracia brasileira, atacando os três pilares de responsabilização que o sustentam: jurídico, político e social. Foi uma destruição institucional muito grave e de difícil reversão”, destaca Bruno Brandão, diretor executivo da Transparência Internacional - Brasil.

Propostas para a retomada da agenda de transparência e integridade -- Para reverter os graves retrocessos dos últimos anos e sinalizar possíveis caminhos futuros, a TI Brasil lançou a “Agenda de Transparência e Integridade -- Propostas para o Quadriênio 2023-2026".

O documento traz 25 propostas consideradas cruciais para interromper a ingerência política e resgatar a autonomia de órgãos chave na prevenção e no combate à corrupção, ampliar e fortalecer o accountability nas instituições públicas, garantir transparência e o direito de acesso às informações públicas.

Entre as propostas, estão a regulamentação do lobby; a instituição da lista tríplice vinculante para a nomeação do procurador-geral da República; estabelecimento de quarentena para a candidatura eleitoral de membros do Judiciário, Ministério Público, Forças Armadas e polícias; a proteção dos denunciantes; e a recuperação do sistema de proteção ambiental e fortalecimento do combate à corrupção ambiental.

É fundamental que o novo governo demonstre, com ações concretas, que está compromissado com o resgate democrático das pautas de transparência e integridade.

Corrupção, conflito e segurança -- Neste ano, o relatório global do IPC destaca a relação entre os temas corrupção, conflito e segurança. Como explica o relatório lançado pelo Secretariado da Transparência Internacional, em Berlim, a corrupção diminui a capacidade do Estado de garantir paz e segurança a seus cidadãos. O enfraquecimento das instituições policiais e de defesa dificulta o papel do Estado de controlar seu território e prevenir ameaças de violência, incluindo o terrorismo. Ao mesmo tempo, a corrupção cria novos conflitos sociais - ou agrava os que já existem - ao minar a confiança nas instituições e desgastar a legitimidade do Estado. Países que tiveram a pontuação abaixo de 50 no IPC foram palco de 80% dos protestos contra corrupção e de 82% das respostas violentas contra os manifestantes.

 

O Brasil é um dos principais exemplos hoje no mundo de deterioração democrática e aumento de conflitos associados à corrupção. Eleito sequestrando o discurso anticorrupção, o ex-presidente Bolsonaro promoveu retrocessos e um desmanche institucional sem precedentes, disseminou notícias falsas e discurso de ódio, enalteceu um projeto autoritário e fomentou a violência política, que teve seu ápice no último 8 de janeiro”, diz Nicole Verillo, gerente de Apoio e Incidência Anticorrupção da TI Brasil.

  

Conteúdo de apoio

Ano 

2012 

2013 

2014 

2015 

2016 

2017 

2018 

2019 

2020 

2021 

2022 

Nota do Brasil

43

42

43

38

40

37

35

35

38

38

38

Posição do Brasil

69

72

69

76

79

96

105

106

94

96

94

Quantidade de países avaliados

176

177

175

168

176

180

180

180

180

180

180


 

 


 

 


Sobre a Transparência Internacional

A Transparência Internacional é um movimento global com um mesmo propósito: construir um mundo em que governos, empresas e o cotidiano das pessoas estejam livres da corrupção. Atuamos no Brasil no apoio e mobilização de grupos locais de combate à corrupção, produção de conhecimento, conscientização e comprometimento de governos, empresas e cidadãos com as melhores práticas globais de transparência e integridade, entre outras atividades. A presença global da TI nos permite defender iniciativas e legislações contra a corrupção e que entes públicos e privados efetivamente se submetam a elas. Nossa rede também significa colaboração e inovação, o que nos dá condições privilegiadas para desenvolver e testar novas soluções anticorrupção.

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