Delação premiada de Mauro-Cid aponta mais para beneficiá-lo, do que à CPMI

'Sai com a farda chamuscada, sem a perspectiva de se tornar um reluzente general', escreveu a colunista Denise Assis em referência ao tenente-coronel

Denise Assis
Publicada em 26 de agosto de 2023 às 09:18
Delação premiada de Mauro-Cid aponta mais para beneficiá-lo, do que à CPMI

Tenente-coronel Mauro Cid (Foto: Pedro França/Agêcia Senado)

Caminham para a reta final os trabalhos da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI), que apura os atos terroristas ocorridos na capital, Brasília, no dia 8 de janeiro. Na próxima terça-feira (29/08), os deputados e senadores terão oportunidade de ouvir o depoimento do coronel Fábio Augusto Vieira, ex-comandante-geral da PM do DF, - surpreendentemente - de folga no dia dos ataques. O coronel foi preso juntamente com mais sete integrantes da Polícia Militar do DF, no dia 18, uma sexta-feira. Com eles foram apreendidos celulares com troca de mensagens golpistas.

Um grupo de “resistentes” formados por membros da comissão se juntou para reunir o máximo de dados colhidos pela Polícia Federal (PF), de modo a que o oficial não tenha margem para pontar o dedo e falar de “falhas” na estratégia traçada para o dia 8, por atores do governo.

Um dos pontos a que esses oficiais da PMDF se pegam, é o de que o ministro Flávio Dino não usou a Guarda Nacional preventivamente. O argumento cai por terra quando se examina as mensagens. Em uma delas, o major Flávio Silvestre de Alencar, que comandava o 6º Batalhão da PMDF, responsável pela segurança da Praça dos Três Poderes e a Esplanada dos ministérios, desafia a autoridade do seu superior - que se cala e, portanto, consente -, quando diz que se a Guarda Nacional chegar, ele vai impedir a ação dos seus componentes e não vai deixá-la atuar.

E, o mais importante: documento comprova que o ministro Flávio Dino ofereceu à PMDF o reforço da GN no dia 7 de janeiro. Seu ofício, no entanto, só foi respondido no dia 8, depois de 20h, quando Brasília estava sob escombros.

Esse grupo que se organiza para contrapor os argumentos dos policiais do DF acredita que reuniu provas suficientes para colocar por terra a teoria totalmente desvairada do autogolpe. O próximo militar a ser ouvido, do grupo de policiais presos na operação do dia 18, será o próprio major Flávio Silvestre de Alencar.

Agora a perspectiva é deixar para o fecho os depoimentos dos militares do Exército. O próximo será o do general G. Dias, que falará na CPMI na quinta-feira, dia 31. Está na agulha o depoimento do general Dutra, o comandante do Exército no Distrito Federal, que se negou a retirar o acampamento da frente do quartel. Em seguida, o plano é colocar o general Heleno se explicando. Mas, quanto a esses depoimentos, há certa preocupação.

Ao final dos trabalhos do dia de ontem (quinta-feira, 24/08) uma reunião a portas fechadas e restrita – só estavam presentes o presidente da Comissão, Arthur Maia; a relatora Eliziane Gama e o senador Randolfe Rodrigues -, chamou a atenção dos jornalistas e demais envolvidos. A notícia que se teve foi a de que os três discutiram uma possível “delação premiada” do tenente-coronel Mauro Cid. Pelo que se sabe de declarações da própria Polícia Federal, é que o material do celular do tenente-coronel já revelou fatos importantes. Falta o pulo do gato. Quem mandou fazer o quê. Isso, do ponto de vista militar, seria a quebra do principal dogma, o de não delatar os seus superiores.

Depois de um dia de intensa movimentação e muitos cafezinhos entre o presidente da Comissão, Arthur Maia e o comandante do Exército, Tomás Paiva, de encontro do ministro Flávio Dino com o ministro da Defesa José Múcio e conversas com o chefe da Polícia Federal, Andrei Rodrigues (também ontem, 24/08), tudo leva a crer que há um empenho para tirar do radar figurões do Exército.

Ficou-se com a impressão de que uma delação premiada de Mauro Cid, tem mais a ver com a intenção de beneficiá-lo, do que à própria Comissão. Deste modo, entregando alguma coisa, ele conseguiria em troca a redução da sua pena, que se for menor do que dois anos, o livra da expulsão das fileiras do Exército. Ele mantém a patente e a carreira. Sai com a farda chamuscada, sem a perspectiva de se tornar um reluzente general, mas livra a Força de ter que colocar para fora de suas fileiras, um oficial antes promissor. 

Denise Assis

Jornalista e mestra em Comunicação pela UFJF. Trabalhou nos principais veículos, tais como: O Globo; Jornal do Brasil; Veja; Isto É e o Dia. Ex-assessora da presidência do BNDES, pesquisadora da Comissão Nacional da Verdade e CEV-Rio, autora de "Propaganda e cinema a serviço do golpe - 1962/1964" , "Imaculada" e "Claudio Guerra: Matar e Queimar".

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