MPF pleiteia que Polícia Federal garanta isonomia em provas de natação de concursos
Temperatura da água de piscina em São Paulo prejudicou o desempenho dos candidatos
O Ministério Público Federal (MPF) ajuizou ação civil pública (ACP) para que a Polícia Federal (PF) faça constar nos editais de seus concursos para delegado, agente, escrivão e papiloscopista que, em todas as piscinas nas quais forem realizadas provas de natação, a temperatura mínima da água seja de 25º C, conforme parâmetros da Federação Internacional de Natação (Fina).
A ação baseia-se em fatos ocorridos no concurso realizado em 2021. Na petição inicial, o MPF aponta que houve infração ao princípio constitucional da isonomia e que a União Federal expôs os candidatos a sérios riscos de saúde e integridade física.
O concurso para os cargos de papiloscopista federal e delegado, agente e escrivão da Polícia Federal foi organizado pelo Centro Brasileiro de Pesquisa em Avaliação e Seleção e de Promoção de Eventos (Cebraspe). Segundo edital no 12 DGP/PF, de 28 de junho de 2021, todos os inscritos deveriam passar por teste de aptidão física (TAF), de caráter eliminatório, que incluía testes de barra fixa, impulsão horizontal, corrida de 12 minutos e natação de 50 metros.
O TAF foi realizado nos dias 3 e 4 de julho de 2021. Na capital paulista, as provas ocorreram no Centro de Práticas Esportivas da Universidade de São Paulo (Cepeusp). Os candidatos informaram que a água estava extremamente fria (em torno de 18o C), diferentemente das piscinas nas quais aconteceram as provas de natação em outras cidades, o que comprometeu as condições de isonomia no certame e prejudicou o desempenho dos candidatos, expondo-os também a sérios riscos de saúde.
Uma candidata relatou que a piscina era ao ar livre, descoberta e sem aquecimento; no momento da prova, a temperatura ambiente era de 10 a 12o C. Narrou que os examinadores apenas lhe autorizaram molhar o corpo em uma ducha próxima e, após o sinal sonoro, ela deveria pular na piscina e nadar 50 metros em 64 segundos. Após mergulhar, a candidata imediatamente sentiu suas pernas afundarem em razão da constrição muscular. Apesar de não conseguir mergulhar a cabeça devido ao frio intenso, conseguiu nadar cerca de 25 metros, porém, sentindo que poderia desmaiar, segurou-se na borda lateral e pediu para ser socorrida pelo bombeiro, que lhe atirou uma boia. Ao ser retirada da água, imediatamente caiu ao chão e apresentou quadro convulsivo. Levada ao hospital mais próximo, foi diagnosticada com hipotermia grave.
Outros candidatos também fizeram relatos semelhantes sobre o teste no Cepeusp. Um deles sofreu um choque térmico somado a um estiramento muscular ao mergulhar, de modo que suas pernas paralisaram e ficou ofegante, acabando por engolir muita água. Ao final, precisou ser retirado por um enfermeiro contratado pelo Cebraspe e ficou deitado no chão, ao lado da piscina, onde permaneceu em estado de torpor e quase inconsciência por cerca de 30 minutos. Foi necessário retirá-lo de cadeira de rodas.
Segundo os concorrentes, o teste de natação foi realizado em piscinas com e sem aquecimento. Cidades como Curitiba (PR), Florianópolis (SC), Porto Alegre (RS), Belo Horizonte (MG) e Campo Grande (MS) tinham piscinas aquecidas, enquanto em outras localidades, como São Paulo (SP), Rio de Janeiro (RJ) e Brasília (DF) não havia aquecimento.
Ao ser questionado, o Cebraspe informou não medir a temperatura da água das piscinas onde são realizadas as provas, mas afirmou que todas são “adequadas” para a realização dos testes. Posteriormente confirmou que a piscina do Cepeusp não tem aquecimento e que a temperatura da água no dia das provas era de 18o C.
Normas técnicas – A Federação Internacional de Natação (Fina), reconhecida pelo Comitê Olímpico Internacional, estabelece normas rígidas para a temperatura da água em provas de natação. Para provas em piscinas, a temperatura deve estar entre 25 e 28o C. Já em águas abertas, se a temperatura estiver entre 16 e 17,.9o C é obrigatório o uso de roupas de borracha, que serão facultativas entre 18 e 20o C.
Para tentar assegurar a isonomia dos candidatos em provas futuras, o MPF realizou reuniões com a Polícia Federal e com o Cebraspe sobre a possibilidade do estabelecimento de limites para temperatura da água. No entanto, nenhuma das instituições demonstrou interesse, alegando, em síntese, que não haveria ilicitudes nas provas discutidas nos autos e que as entidades organizadoras dos certames enfrentariam dificuldades para localizar, em todo país, piscinas com aquecimento.
Por esse motivo, o MPF pede, em caráter de urgência que seja obrigatório constar nos próximos concursos para os cargos de papiloscopista federal e delegado, agente e escrivão da PF:
- que, em todas as piscinas nas quais forem realizadas as provas de natação, a temperatura mínima da água seja de 25o C, conforme parâmetros da Federação Internacional de Natação (Fina);
- a obrigatoriedade da medição da temperatura de todas as piscinas onde forem realizados testes de natação, que deve ser feita antes do início da prova, repetindo-se a cada hora até o último candidato, com os registros devidos, assegurando-se a publicidade entre os inscritos no concurso;
- que, caso a União Federal não consiga ofertar piscinas com temperatura mínima de 25o C, os candidatos sejam convocados para realizar a prova em até 15 dias seguintes ou, alternativamente, dispensados de realizar o teste de natação.
Número da ação: 5000499-04.2023.4.03.6100. A tramitação pode ser consultada aqui.
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