Musk & Bolsonaro: o preço a pagar

Visita do homem mais rico do mundo mostra que apoio da extrema direita internacional a Bolsonaro custará caro ao país, escreve Paulo Moreira Leite

Paulo Moreira Leite
Publicada em 22 de maio de 2022 às 11:07

www.brasil247.com - (Foto: Reprodução)

O tom geral da recepção do governo Bolsonaro a Elon Musk, o homem mais rico do planeta, um dos patronos da extrema direita mundial, pode ser resumido numa cena  estrelada pelo ministro das Comunicações Fabio Farias. 

Atuando como mestre-de-cerimônias da visita, Farias encenou um número celebrizado pelos programas de auditório de seu sogro, o empresário Sílvio Santos, que durante décadas mobilizou milhões de brasileiros e brasileiras em torno da promessa de enriquecimento fácil e rápido, o Baú da Felicidade. 

--Everybody loves you, declarou o ministro,  microfone na mão, dirigindo olhos devotos ao homem mais rico do mundo, diante de uma platéia de figurões do governo brasileiro.  

Ali, no universo "Todo mundo ama você" avistava-se a cúpula das Forças Armadas sob o governo Bolsonaro. O  general Paulo Sérgio Nogueira, ministro da Defesa; o general Augusto Heleno, da Segurança Institucional; o general Braga Netto, provável companheiro de Bolsonaro na eleição presidencial; o general Luiz Eduardo Ramos, ministro-chefe da Secretaria Geral da Presidência. Além deles, também estava o presidente Ciro Nogueira, dono do Centrão e atual ministro da Casa Civil. Outra presença era Dias Toffolli, do STF.  

Num  cenário de colapso econômico, tragédia social e cenas de entreguismo explícito, como a privatização da Eletrobras,  o encontro flagrou os dois numa hora difícil.  

Se Bolsonaro enfrenta o esvaziamento visível de sua campanha, Musk chegou ao país dias depois que o mundo inteiro viu que algo deu errado na compra do Twitter, antes anunciada como o grande negócio de um  milênio que mal começou.  

O sorriso de propaganda de pasta de dente que Musk exibiu ao Brasil estava longe da carranca golpista de 2020, quando estava de olho nas reservas de lítio da Bolívia, indispensáveis para a bateria dos automóveis elétricos que fabrica.  

Numa comentário de quem sabia do risco que aquela presença representa aos países latino-americanos, um cidadão lhe mandou uma mensagem pelo tuíte onde denunciava a relação promíscua entre golpes de Estado na América Latina e ataques imperialistas à democracia: 

“Você sabe o que não interessa às pessoas? O governo dos EUA organizando um golpe contra Evo Morales na Bolívia para que você possa obter lítio lá”. Musk reagiu com truculência típica: "Vamos dar um golpe em quem quisermos. Lide com isso!"

No Brasil de Musk & Bolsonaro as conversas públicas envolveram dinheiro e tecnologia. Musk anunciou um projeto supostamente sofisticado para monitorar o desmatamento de nossas florestas -- ideia que os estudiosos do assunto classificam como puro apenas desperdício de dinheiro -- dos brasileiros e brasileiras, é claro. 

Num aceno obviamente eleitoral, Musk falou de uma proposta socialmente útil -- conectar 19 mil escolas da região -- mas não disse como nem quando isso poderia ser feito, numa omissão significativa. Já autorizada pela Anatel a instalar 4408 satélites no Brasil, até agora a Starlink, empresa de Musk, só deu conta de dois (2), ambos colocada nos céus do Sudeste. (Convergência Digital, 20/5/2022). 

Coordenador do MapBiomas e especialista em monitoramento ambiental, o professor Tasso Azevedo afirmou ao portal G1 que o Brasil não precisa de satélites de Musk para monitorar a Amazônia brasileira.  "(Os equipamentos de Musk) são satélites de comunicação. (...) Não são satélites óticos, eles não conseguem enxergar coisas na superfície, no território, o que é usado para fazer monitoramento do desmatamento", explica Tasso Azevedo. "Não é por falta de achar desmatamento e de monitorar que a gente não tem fiscalização e controle do desmatamento. Pelo contrário, o que falta é essa parte da fiscalização e do controle", afirma, numa referencia direta à omissão do governo.

Para além do barulho midiático e dos  negócios estratosféricos,  a viagem deixou duas mensagens. No plano eleitoral, confirma que Bolsonaro conserva o apoio da extrema-direita internacional em sua tentativa de permanecer no cargo. No plano econômico, os rascunhos de Elon Musk-Bolsonaro  mostram que o plano é obrigar brasileiros e brasileiras a pagar um alto preço por isso. 

Alguma dúvida?

Paulo Moreira Leite

Paulo Moreira Leite é colunista do 247, ocupou postos executivos na VEJA e na Época, foi correspondente na França e nos EUA

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