Não interrompam a caminhada de Bolsonaro em direção ao penhasco
"As instituições e a oposição não podem oferecer ao encurralado nenhuma chance de fugir da eleição, sob quaisquer pretextos", defende Moisés Mendes
Bolsonaro em encontro com embaixadores (Foto: Reprodução/Facebook)
Por Moisés Mendes, para o 247
A pior coisa que poderia acontecer agora para a democracia, a quase dois meses da eleição, seria a transformação de um traste em mártir da extrema direita.
Se for submetido a um cerco de instituições tardias, Bolsonaro pode arranjar o pretexto que busca para saltar fora e desencadear uma série de fatos só aparentemente imprevisíveis.
Quais fatos? Todos que possam provocar o caos e, nos desdobramentos que ele imagina, transformá-lo em ditador, herói ou mártir.
É desconfortável imaginar que só agora, quando o sujeito sabe que será derrotado, estejam sendo erguidas com vigor algumas vozes legalistas na tentativa de enquadrar o criminoso.
O terrorista comete um crime eleitoral por dia, todos com acinte. Há muito tempo o que ele mais faz é desafiar leis e normas de uma campanha antecipada desde que assumiu.
Bolsonaro já atacou ministros do Supremo de forma reiterada, sem que nada de efetivo para contê-lo tivesse sido tentado.
Agrediu todo o Supremo, não só com palavras, ao desafiar a condenação do deputado Daniel Silveira com um perdão que foi empurrado para a área das controvérsias jurídicas.
Incentiva a morte de inimigos políticos, despreza os que são assassinados sob o comando da sua voz e a cada semana oferece mais uma surpresa.
A reunião com os embaixadores, por mais que tenha sido uma barbeiragem política de pré-derrotado, foi mais uma provocação aos que ainda tentam adverti-lo.
Bolsonaro produz fake news no mesmo ritmo em que produzia antes de Alexandre de Moraes alertar que o TSE não iria admitir que candidatos propagassem mentiras. Pré-candidato pode?
O maior erro político hoje seria interromper a caminhada de Bolsonaro em direção à derrota e à sua morte política. Nem as ruas, que fracassaram até agora por falta de quorum, devem ser requisitadas numa hora dessas.
Tentar contê-lo agora equivale a oferecer desculpas para que ele aperte antes do tempo algum dos botões da esculhambação programada.
Bolsonaro avisa que vai desencadear ações violentas depois de derrotado. Mas é preciso que, antes, seja derrotado. E no primeiro turno.
As instituições e a oposição não podem oferecer ao encurralado nenhuma chance de fugir da eleição, sob quaisquer pretextos.
É preciso cercá-lo no canto e fazer com que vá até o fim, mesmo porque nada indica que, por ação de qualquer frente, no Congresso, no Ministério Público, no TSE ou no Supremo, seja possível interditar seus movimentos e muito menos tirá-lo do cargo.
O que Bolsonaro quer é, com outra versão, uma nova facada, o imponderável que desta vez o salve do pior, que é enfrentar Lula.
Não ofereçam pretextos a Bolsonaro a essa hora do jogo. Não busquem novas provas de crime eleitoral ou de abuso de poder.
O que mais existe contra Bolsonaro são provas e mais provas que nunca usadas contra ele.
Não caiam na armadilha de fragilizar Bolsonaro para no fim fortalecê-lo, agora que é apenas um traste em busca de apoio que não existe.
Esqueçam a ameaça da terceira via. Não é esse o risco com a antecipação do fim de Bolsonaro.
O risco é a concessão de habeas corpus antes da eleição. Deixem Bolsonaro seguir seu rumo até a beira do penhasco, para que a democracia se vingue do golpe contra Dilma e da prisão de Lula.
Moisés Mendes
Moisés Mendes é jornalista, autor de “Todos querem ser Mujica” (Editora Diadorim). Foi editor especial e colunista de Zero hora, de Porto Alegre.
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