O que deverá substituir o bolsonarismo a partir do ano que vem?

Precisamos de uma hegemonia do conhecimento que possa combater a hegemonia da ignorância e da brutalidade que vemos hoje

Marcia Tiburi
Publicada em 23 de julho de 2022 às 13:46

www.brasil247.com - LulaLula (Foto: Ricardo Stuckert)

Há anos eu venho falando de “cultura do diálogo”. Do meu ponto de vista, é essa cultura que devemos colocar no lugar do chamado bolsonarismo, nome que se tornou comum, mas que tem o grande defeito de mascarar o termo “fascismo”, ou seja, o fascismo à brasileira, o que de fato, o bolsonarismo é. Creio que é importante enfrentar o fascismo como um fato, para não nos iludirmos de que seja menos mau do que isso. A monstruosidade do fascismo não pode ser velada, pois o velamento ajuda a sua manutenção. 

Vemos no fenômeno do fascismo à brasileira que se produziu entre nós, resquícios de nazismo, de integralismo, de ditadura militar, de grupos de extermínio do milicianato carioca, de retorno do racismo e do trabalho escravo que caracterizaram os tempos do horror escravocrata, vemos nele as habituais táticas do patriarcado e os jogos de poder das oligarquias, bem como o terrorismo. Vemos nele o neoliberalismo que toma o Brasil como um laboratório, como um campo de testes que a cada dia se assemelha mais a um campo de concentração e de extermínio. 

Portanto, não podemos pensar que o bolsonarismo seja só a aventura do grotesco político entre nós, de um casamento entre generais cafonas com milicianos que se mudam das periferias do Rio para a Barra da Tijuca para viver na estética do novo rico e que vencem no grito e na ameaça, instaurando a barbárie geral. 

Sabemos que o bolsonarismo gosta de dinheiro e poder, de gritaria e baixaria, e mesmo que seja derrotado em 2022 para a eleição presidencial e também derrotado no congresso nacional, seguirá ocupando todos os espaços porque essa é a natureza do patriarcado capitalista e do fascismo. Logo, precisamos impedir que essas tendências avancem. Para isso, há que se ocupar o congresso nacional e as assembleias legislativas nas eleições de 2022, há que se ocupar todos os espaços e cargos de decisão possíveis agora. Além disso, precisaremos de um projeto de educação e cultura nacionais, o que inclui os meios de comunicação de massa e o sistema de justiça rumo à desfascistização e desnazificação do país. Isso tem que ser levado a sério imediatamente. É uma das atitudes mais urgentes que o governo democrático há de tomar. 

Por fim, o bolsonarismo pode ser lido também como um alerta pelo qual se sabe que se as forças democráticas não ocuparem a política, os representantes da personalidade autoritária, ou seja, os fascistas, ocuparão todos os espaços e transformação a vida no Brasil em algo inviável e insuportável, como se viu até agora, e sempre mais. O jogo de poder dos fascistas não é apenas um simbólico elogio à morte, mas uma apologia pragmática e performativa que visa a destruição e o extermínio de todos. 

Na notória incitação de Bolsonaro à guerra civil, o que ele busca é a intensificação do espetáculo do banho de sangue que já vem acontecendo. O banho de sangue se dá de diversas formas: na matança de indígenas, de jovens e crianças nas favelas, na matança de mulheres em suas casas, na matança de ativistas. Bolsonaro quer mais e lava as mãos antes que todos se matem a seu pedido.

Ora, todas as matanças são sintoma de um projeto do qual armar a população é parte. Temos um aumento dos índices de violência e todos são promovidos na retórica de ódio e de confusão e desnorteio promovidos pelo presidente atual. A matança de pessoas idosas, pobres ou com comorbidades na pandemia, foi uma espécie de pogrom.  

Precisamos de uma hegemonia do conhecimento que possa combater a hegemonia da ignorância e da brutalidade que vemos hoje. Precisamos de uma cultura do diálogo contra a cultura da violência e do preconceito, do extermínio, do estupro e do assédio. Nessa medida, ocupar as redes sociais, ocupar o poder, ocupar todos os postos numa luta por hegemonia democrática radical é o caminho para vencer as eleições em 2022, pois democracia é diálogo, o resto é mistificação.

Marcia Tiburi

Professora de Filosofia, escritora, artista visual

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