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Setembro é o mês dedicado à prevenção ao suicídio, o que estimula as discussões sobre saúde mental e a necessidade de se procurar ajuda profissional. De acordo com o Ministério da Saúde, são registrados cerca de 12 mil suicídios todos os anos no Brasil e mais de 1 milhão no mundo, sendo que cerca de 96,8% dos casos estão relacionados a transtornos mentais, principalmente, à depressão.[1]
Quando o paciente não apresenta melhora com o uso de antidepressivos prescritos ou de outros recursos terapêuticos, o quadro pode ser ainda mais complicado, e os riscos ainda maiores. Uma boa notícia é que essas pessoas, que sofrem com depressão resistente a medicamentos, já contam com uma nova opção de tratamento. A LivaNova, empresa de equipamento médico líder no mercado de neuromoduladores, está iniciando no Brasil o uso de seu mais inovador sistema de estimulação do nervo vago ("VNS Therapy"), já utilizado para o tratamento de epilepsia, para depressão. O sistema SYMMETRY™ é um sistema de programação de última geração para o tratamento de pacientes com depressão de difícil tratamento, também conhecida como refratária.
Recentemente a tecnologia foi implantada, pela primeira vez no Brasil, em dois pacientes com depressão resistente ao tratamento. Os procedimentos foram feitos em agosto, pelo neurocirurgião Dr. Wuilker Knoner Campos no Hospital SOS Cárdio, em Florianópolis, sob acompanhamento dos doutores João Quevedo, psiquiatra, neurocientista e professor do Departamento de Psiquiatria e Ciências do Comportamento da McGovern Medical School de Houston, no Texas, com ampla experiência internacional na regulação da terapia VNS, e Matheus Souza Steglich, médico psiquiatra da equipe de Psiquiatria Intervencionista do Instituto São José - Centro de Psiquiatria e Dependência Química (ISJ), responsável pelos pacientes indicados à terapia.
“A terapia VNS representa uma nova esperança para o caso desses pacientes, que já vínhamos acompanhando há algum tempo e que já tinham tentado outras alternativas de tratamentos para a depressão resistente, como a eletroconvulsoterapia, cetamina, estimulação magnética e combinações dessas opções. Porém, ou não obtiveram a resposta esperada, ou tiveram muitos efeitos colaterais”, explica o Dr. Steglich. “O VNS surge então como uma alternativa com o perfil de ter poucos efeitos colaterais, além de parâmetros ajustáveis que podem melhorar a tolerabilidade, o que pode ter uma resposta muito interessante principalmente a longo prazo”.
O SYMMETRY recebeu a aprovação da Anvisa em 2019, juntamente com todos os geradores para terapia VNS da LivaNova. Nos Estados Unidos, os geradores foram aprovados em 2017 pelo FDA, órgão regulador de produtos de saúde e alimentação, e pela Comunidade Europeia em 2018. Os testes clínicos nos EUA começaram a ser publicados em 2018, chegando à marca de 795 pacientes em 5 anos de estudos. Os resultados desse processo indicaram melhora significativa da depressão de difícil tratamento em aproximadamente 70% dos envolvidos, além da recuperação completa de cerca de 40% dos pacientes.
Esses estudos também mostram que, quando a terapia VNS é usada em conjunto com outras formas de tratamento, como a psicoterapia e medicamentos indicados para o caso de cada paciente, há uma redução significativa na taxa de suicídio. “O ápice do quadro depressivo grave é a ideação suicida. Oferecer um tratamento eficaz, tolerável, com acompanhamento constante, é uma forma de não deixarmos a situação chegar a esse ponto extremo”, explica Dr. Steglich.
No Brasil, Quevedo ressalta que a tecnologia tem grande potencial de se consolidar no mercado, pois a realização das primeiras cirurgias no país despertou grande interesse da comunidade psiquiátrica. “O uso de tecnologias inovadoras para o tratamento da depressão é de extrema relevância, pois é mais uma alternativa que pode melhorar o quadro dos pacientes brasileiros com depressão de difícil tratamento. Em outros países, como os Estados Unidos, os resultados já são muito positivos, indicando melhora nos sintomas depressivos, ideações suicidas e taxas de mortalidade desses pacientes, bem como em sua qualidade de vida de maneira geral”, conta.
Dr. Quevedo também aponta que está participando de um novo estudo, o RECOVER, que está sendo realizado atualmente nos Estados Unidos para aferir os resultados do SYMMETRY em cerca de mil pacientes estadunidenses com depressão resistente, sendo que, durante os primeiros 12 meses, metade dessa população estará com o device ligado, e a outra metade não. “Isso tem como objetivo eliminar o viés de placebo nos resultados da terapia”, explica o especialista. “O estudo começou em 2020, e novos pacientes foram incluídos no estudo até o ano passado. Ao final de 2023, todos os pacientes terão concluído o primeiro ano de uso, e então analisaremos os dados obtidos, e seguiremos assim anualmente. A previsão é que o estudo seja finalizado totalmente em 2027”.
O sistema de programação de última geração permite ao médico adequar o funcionamento do SYMMETRY às necessidades e respostas de cada paciente. É também possível iniciar novos tratamentos, como o uso de medicação ou psicoterapia, mesmo depois da ativação do gerador. Além disso, a maioria dos efeitos colaterais comuns do SYMMETRY são leves e se tornam menos perceptíveis com o tempo, sendo ele também uma boa opção para pessoas com intolerâncias médicas a antidepressivos.
De acordo com o cirurgião Dr. Wuilker, que também é presidente da Sociedade Brasileira de Neurocirurgia, o fato dos efeitos colaterais serem poucos e leves é uma das principais vantagens da terapia. “Depois da implantação da Terapia VNS, o que o paciente pode apresentar é soluço, rouquidão ou tosse, mas, a partir do momento em que são identificados esses efeitos, é possível regular a dose do estímulo que o paciente recebe a fim de amenizá-los. Em comparação a outros tratamentos, como a eletroconvulsoterapia (ECT), que requer que o paciente seja hospitalizado e sedado cada vez que for fazer o procedimento – que podem ser dezenas por ano, e podem causar lapsos de memória – a terapia VNS oferece essa vantagem”, explica.
Dr. Steglich também ressalta que a terapia VNS é recomendada somente aos pacientes com depressão resistente mas, para quaisquer outros casos dessa ou de outras doenças psiquiátricas, o acesso ao tratamento adequado deve ser realizado o quanto antes, a fim de evitar a piora dos sintomas e o desenvolvimento da resistência. “Quanto mais tempo o paciente demora para ter acesso, mais provável é que ele desenvolva um quadro de difícil tratamento. Por isso, é fundamental combatermos o estigma e o preconceito em relação às doenças mentais, que é um dos fatores que leva o paciente a demorar a buscar ajuda. As campanhas de psicoeducação, como o Setembro Amarelo, com a divulgação da mídia, são ferramentas de promoção de saúde que devem ser incentivadas, pois podem ajudar muitas pessoas a darem o primeiro passo em busca da melhora da sua condição”, finaliza.
Sobre a terapia VNS
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