Responsabilização Penal de Autoridades por Mortes em Áreas de Risco

A responsabilidade primária recai sobre o Poder Público, que define legalmente as áreas onde é proibido construir

Fonte: Pedro Cardoso da Costa - Publicada em 28 de janeiro de 2025 às 16:54

Responsabilização Penal de Autoridades por Mortes em Áreas de Risco

Os problemas sociais no Brasil, infelizmente, seguem uma lógica de repetição, como enredos de novelas que atravessam décadas. Entre eles, um dos mais emblemáticos é o das mortes causadas pelas chuvas em áreas de risco. É preciso abandonar a prática de atribuir essas tragédias à Natureza ou ao acaso e reconhecer que, na grande maioria dos casos, há responsáveis que devem ser penalizados por homicídio, sob a ótica do dolo eventual.

O dolo eventual caracteriza-se quando o agente, mesmo sem intenção direta de causar um resultado, assume o risco de produzi-lo. Durante muito tempo, mortes causadas por motoristas embriagados foram tratadas como culposas, perpetuando a impunidade. Apenas após o agravamento desse tipo de crime, a Justiça passou a enquadrar algumas dessas ocorrências como dolo eventual, ainda que esporadicamente.

É hora de aplicar o mesmo entendimento jurídico às mortes provocadas pelas enxurradas em áreas de risco. Um exemplo recente dessa negligência foi a tragédia ocorrida no Rio Grande do Sul, em maio de 2024, onde centenas de pessoas morreram, em circunstâncias semelhantes às de 1941, sem que medidas preventivas eficazes tivessem sido tomadas.

A responsabilidade primária recai sobre o Poder Público, que define legalmente as áreas onde é proibido construir. No entanto, as mesmas autoridades frequentemente ignoram as próprias normas, permitindo que populações inteiras se instalem em locais perigosos.

Quando as tragédias ocorrem, as autoridades frequentemente culpam as vítimas, apontando 'teimosia' ou resistência a alertas de evacuação. O que se ignora, porém, é que muitos desses avisos chegam tarde demais, quando as enxurradas já estão intensas e deixar o local pode significar ser arrastado pelas águas. Assim, as famílias que permanecem em casa enfrentam uma escolha cruel entre a espera pela morte em casa ou a exposição imediata a um risco igualmente fatal ao abandonar a residência.

Embora falte empenho de parte da população em prevenir essas situações, a omissão do Poder Público em oferecer condições seguras e alternativas eficazes contribui diretamente para a perpetuação dessas tragédias.

A responsabilização penal precisa ser um marco. Além de impedir novas construções em áreas de risco, deve-se investigar e punir autoridades que, por omissão, conivência ou corrupção, deixam de agir para prevenir tragédias, evitando ou retirando as construções das áreas de risco. Curiosamente, o Estado indeniza quem tem sua casa retirada por desapropriação, mas não assume a responsabilidade quando essas mesmas casas são levadas pelas águas, junto com vidas humanas.

Chegou a hora de romper com esse ciclo secular de impunidade e exigir que as autoridades sejam responsabilizadas. As vidas perdidas em cada verão não podem continuar sendo tratadas como números em estatísticas previsíveis, mas evitáveis.

Pedro Cardoso da Costa

Interlagos-SP

Responsabilização Penal de Autoridades por Mortes em Áreas de Risco

A responsabilidade primária recai sobre o Poder Público, que define legalmente as áreas onde é proibido construir

Pedro Cardoso da Costa
Publicada em 28 de janeiro de 2025 às 16:54
Responsabilização Penal de Autoridades por Mortes em Áreas de Risco

Os problemas sociais no Brasil, infelizmente, seguem uma lógica de repetição, como enredos de novelas que atravessam décadas. Entre eles, um dos mais emblemáticos é o das mortes causadas pelas chuvas em áreas de risco. É preciso abandonar a prática de atribuir essas tragédias à Natureza ou ao acaso e reconhecer que, na grande maioria dos casos, há responsáveis que devem ser penalizados por homicídio, sob a ótica do dolo eventual.

O dolo eventual caracteriza-se quando o agente, mesmo sem intenção direta de causar um resultado, assume o risco de produzi-lo. Durante muito tempo, mortes causadas por motoristas embriagados foram tratadas como culposas, perpetuando a impunidade. Apenas após o agravamento desse tipo de crime, a Justiça passou a enquadrar algumas dessas ocorrências como dolo eventual, ainda que esporadicamente.

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É hora de aplicar o mesmo entendimento jurídico às mortes provocadas pelas enxurradas em áreas de risco. Um exemplo recente dessa negligência foi a tragédia ocorrida no Rio Grande do Sul, em maio de 2024, onde centenas de pessoas morreram, em circunstâncias semelhantes às de 1941, sem que medidas preventivas eficazes tivessem sido tomadas.

A responsabilidade primária recai sobre o Poder Público, que define legalmente as áreas onde é proibido construir. No entanto, as mesmas autoridades frequentemente ignoram as próprias normas, permitindo que populações inteiras se instalem em locais perigosos.

Quando as tragédias ocorrem, as autoridades frequentemente culpam as vítimas, apontando 'teimosia' ou resistência a alertas de evacuação. O que se ignora, porém, é que muitos desses avisos chegam tarde demais, quando as enxurradas já estão intensas e deixar o local pode significar ser arrastado pelas águas. Assim, as famílias que permanecem em casa enfrentam uma escolha cruel entre a espera pela morte em casa ou a exposição imediata a um risco igualmente fatal ao abandonar a residência.

Embora falte empenho de parte da população em prevenir essas situações, a omissão do Poder Público em oferecer condições seguras e alternativas eficazes contribui diretamente para a perpetuação dessas tragédias.

A responsabilização penal precisa ser um marco. Além de impedir novas construções em áreas de risco, deve-se investigar e punir autoridades que, por omissão, conivência ou corrupção, deixam de agir para prevenir tragédias, evitando ou retirando as construções das áreas de risco. Curiosamente, o Estado indeniza quem tem sua casa retirada por desapropriação, mas não assume a responsabilidade quando essas mesmas casas são levadas pelas águas, junto com vidas humanas.

Chegou a hora de romper com esse ciclo secular de impunidade e exigir que as autoridades sejam responsabilizadas. As vidas perdidas em cada verão não podem continuar sendo tratadas como números em estatísticas previsíveis, mas evitáveis.

Pedro Cardoso da Costa

Interlagos-SP

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