Rubens Paiva chegou a ser inocentado pela repressão, um ano antes de sua morte
'O ex-deputado foi inocentado pela Polícia Política e teve o processo arquivado, dando-o como inocente', escreve a jornalista Denise Assis

Rubens Paiva (Foto: © Secretaria de Estado da Cultura / SP)
Tivesse esse documento abaixo valido para enterrar, de vez, as suspeitas contra o então deputado Rubens Paiva (PTB), e a história trágica, que nos legou um Oscar – pelo filme Ainda Estou Aqui, dirigido por Walter Salles -, seguiria outro rumo. Rubens Paiva estaria ao lado de sua família, em paz, levando os filhos à praia, tomando lanche na Cavé com a mulher Eunice, e talvez estivesse vivo, como alguns dos seus contemporâneos. Está aí o senador Almino Afonso (95 anos), que não nos deixa mentir.
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No documento, Rubens Paiva foi inocentado pela Polícia Política e teve o processo arquivado, dando-o como inocente. A abertura do inquérito se deu, em 14 de abril de 1969, depois que uma equipe de arapongas do Departamento de Operações Políticas e Sociais (DOPS), se deslocou para segui-lo, em um evento cultural – na sede do Clube dos Artistas e Amigos da Arte -, em uma atividade de inauguração da “União Brasil-Cuba”.
Com o nosso rico dinheirinho, foram para lá os investigadores, gastaram a gasolina da viatura, certamente pilha para os gravadores analógicos, tempo, a grana do lanche... Ficaram lá, paranoicamente observando o que fazia um deputado federal, metido em reuniões “suspeitas”.
E o seguiram também em atividades outras num sindicato, em reunião com estudantes da USP, enfim, fazendo o que faziam na época: se ocupavam da vida alheia. Buscavam pelo em ovo, que era a prática mais comum – e temida -, da época. Tudo em vão.
A conclusão foi o arquivamento de um inquérito aberto, segundo a avaliação de Augusto Flaviano Arruda Costa, um dos membros da Comissão Geral de Investigações – subcomissão - do Estado de São Paulo, aberto indevidamente. Sua decisão, lavrada em 15 de junho de 1970, na condição de relator do caso, bem poderia ter valido para tirar da mira o deputado Rubens Paiva, mas todos sabemos que não foi o que aconteceu.
De qualquer modo, é importante o registro de que houve um tempo, um ano antes da sua prisão e morte, em que ele foi considerado inofensivo ao sistema repressivo. Na decisão, o relator faz mesmo uma “reprimenda” à equipe do DOPS, chamando de “engano formal”, um “informe rotineiro”, o resultado da tarde cultural de Paiva.
Os dias eram assim, e caso algum desses sujeitos achassem que você tinha levantado o braço esquerdo, numa dessas reuniões, não para sinalizar para o amigo onde estava sentado, mas para uma saudação esquerdista, e você ia parar no fundo de uma cela do DOI-CODI, ou seja, o porão. Uma pena ver que depois disso, no ano seguinte, com base em documentos cheios de “consta que”, levando-se em conta”, dizem que ”os arapongas voltaram à carga, capturando e levando Rubens Paiva, à morte, nas dependências de uma unidade do Exército Brasileiro, que é onde funcionava o DOI-CODI.
Documento. Foto: Reprodução
Documento. Foto: Reprodução
Documento. Foto: Reprodução
Documento. Foto: Reprodução
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Denise Assis
Jornalista e mestra em Comunicação pela UFJF. Trabalhou nos principais veículos, tais como: O Globo; Jornal do Brasil; Veja; Isto É e o Dia. Ex-assessora da presidência do BNDES, pesquisadora da Comissão Nacional da Verdade e CEV-Rio, autora de "Propaganda e cinema a serviço do golpe - 1962/1964" , "Imaculada" e "Claudio Guerra: Matar e Queimar".
800 artigos
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