Abusos, corte de vantagens e até violência física foram as causas da revolta em Jirau

Atualizada: Obras não serão mais retomadas nesta segunda-feira.

Publicada em 19/03/2011 às 09:36:00

Da reportagem do TUDORONDONIA

Atualizada às 10h35

Porto Velho, Rondônia - Trabalhadores da Usina de Jirau que residem em Porto Velho disseram nesta sexta-feira à reportagem do TUDORONDONIA que a revolta no canteiro de obras da Camargo Corrêa e a  explosão de violência no local são conseqüências de uma série de conflitos e abusos por parte da empresa contra os operários.

A briga entre trabalhadores e motoristas de uma empresa terceirizada foi apenas o estopim para a revolta, que era latente e ganhou intensidade com o corte de hora extra, adicional noturno, entre outras vantagens suprimidas do contra-cheque dos operários.

“Eu gosto de trabalhar na Camargo, mas ultimamente a situação tem ficado insustentável, com encarregados praticando assédio moral direto em cima da gente”, diz uma trabalhadora que mora em Porto Velho e foi chamada para prestar assistência na capital aos operários que saíram de Jirau após o quebra-quebra das instalações e incêndio de mais de 50 ônibus.

"Sai de lá corrida com medo da violência. Andei dez quilômeros até arrumar uma carona. No meio do caminho, só via gente que se achava o tal (encarregados) tirando a farda e jogando no meio do mato com medo de indetificação por parte dos 'foguinhos' - o pessoal que ateou fogo em tudo", acrescenta a trabalhadora.

Segundo ela, o pânico era generalizado e todo mundo gritava: "Tira a farda que eles querem pegar os encarregados! Por via das dúvidas, eu, mesmo não sendo chefe de nada, joguei a farda no mato e meti sebo nas canelas (correu)".

Além das questões trabalhistas e do assédio moral, a comida (péssima, na avaliação dos operários) é outro foco de discórdia. “A gente é proibido de trazer um vidro de pimenta para tentar mascarar o sabor da comida que, suspeita-se, sofre adição de salitre. A aparência é ruim e o sabor, pior ainda”, conta o operário Luiz, que, “por necessidade”, pretende continuar trabalhando na Camargo Corrêa. "O cardápio aqui é variado: sola de sapato (bife), boi ralado (carne moida), cobrão (peixe, tipo bagre, carregado no colorau), bife de 'zoião' (ovo), tudo preparado com 'capricho' pra ficar bem ruim mesmo. E o pior é que a gente paga por isso e não tem outra alternativa, pois estamos a vários quilômetros da cidade mais próxima", acrescenta.


“É bom que as pessoas saibam que, embora o clima de revolta fosse geral, apenas alguns 'peões' rodados participaram do quebra-quebra e dos incêndios. São pessoas aliciadas pela Camargo Corrêa em outros estados, com promessas de vantagens e mais vantagens. Brincar com peão é coisa perigosa. Essa gente é sem eira nem beira e não tem nada a perder, e deu no que deu. Todo mundo falava que isso ia acontecer. Inclusive tinha gente lá que sabia da intenção de tocar fogo em tudo, pois me contaram que já haviam feito isso em outras obras de outros estados”, relatou um encarregado.

Perguntado sobre a ação do Sindicato da Construção Civil para levar estas queixas à gerência da Camargo, o encarregado  emendou: "É tudo um bando de pelego, vendido pra construtora. Esse povo perdeu a moral aqui, e se aparecesse no local na hora da revolta, teriamos sindicalistas enforcados e grelhados na brasa".

Todos pediram para não ter o nome citado na reportagem temendo algum tipo de represália por parte da empresa.
Há relato de casos de violência física por parte de funcionários da Camargo Corrêa contra operários, que relataram os fatos  aos ministérios públicos Federal, Estadual e do Trabalho, que ouviram também queixas contra “os preços exorbitantes dos produtos no canteiro de obras”.

Os trabalhadores também reclamam do descumprimento de contrato trabalhistas em relação à folga a que têm direito a cada quatro meses de trabalho.

Numa reunião nesta sexa-feira com os ministérios públicos do Trabalho, Federal e Estadual, as reclamações  contra a Camargo Corrêa mostraram que, diferente do que diz a empresa, as relações trabalhistas no canteiro de obras nunca foram normais.

Durante a reunião, trabalhadores e dirigentes sindicais relataram que havia crescente clima de insatisfação dos trabalhadores de Jirau com a empresa Camargo Corrêa por causa dos critérios de divisão da Participação nos Lucros (PL) realizada no final do ano, existência de violência física sofrida pelos empregados, atribuída aos funcionários da Camargo Corrêa; ocorrência de vencimento de “baixadas” (folgas de campo concedidas aos trabalhadores pela empresa a cada quatro meses de trabalho) e prática de preços exorbitantes dos produtos oferecidos aos trabalhadores pela empresa Camargo Corrêa.

Segundo eles, a insatisfação contribuiu para a crise que se instaurou na usina na terça-feira, dia 15 de março. A agressão de um trabalhador por três motoristas de ônibus foi o estopim para o início dos acontecimentos. Os trabalhadores solicitaram que as medidas trabalhistas que forem adotadas contemplem todas as empresas, inclusive as terceirizadas.

O consórcio Energia Sustentável do Brasil, responsável pelas construção da hidrelétrica de Jirau, informou que as obras continuarão paralisadas, diferente do que havia anunciado anteriormente quando divulgou que os trabalhos em Jirau reiniciariam nesta segunda-feira.