Pouco conhecimento sobre sua existência e baixa representatividade junto aos consumidores, sites desatualizados ou inexistentes, falta de assiduidade dos conselheiros, gestão inadequada do orçamento e falta de clareza na prestação de contas. Esses são alguns dos principais problemas dos Conselhos de Consumidores de Energia Elétrica apontados por um estudo do Idec (Instituto de Defesa de Consumidores), apoiado por uma pesquisa encomendada à Opinion Box para medir o nível de conhecimento da população brasileira sobre esses órgãos.
[Para acessar o estudo completo do Idec, clique neste link.]
Foram entrevistadas 2.672 pessoas entre os dias 1 e 21 de abril de 2024, com idade a partir dos 25 anos e abrangendo as cinco regiões brasileiras. Com base nesse universo, o estudo detectou um índice muito baixo de conhecimento sobre os Conselhos, já que 85% dos consumidores não estão a par de sua existência. Ainda assim, dentre os 15% que dizem saber sobre esses órgãos, 29% não conhecem seus papeis e responsabilidades.
Apesar disso, quando informados sobre o papel dos Conselhos, 96% dos entrevistados concordam que eles são importantes para a proteção e defesa dos direitos dos consumidores de energia elétrica frente às distribuidoras.
“O fato de a maioria dos entrevistados ter declarado não conhecer os Conselhos, mas, ao descobrir a função desses órgãos, ter reconhecido a importância de sua atuação na defesa dos interesses dos consumidores, destaca a necessidade de os conselheiros se aproximarem mais da população, divulgando suas ações e desenvolvendo atividades direcionadas aos consumidores”, diz Priscila Arruda, pesquisadora do programa de Energia do Idec.
Esses Conselhos foram criados pela Lei nº 8.631 de 1993, com o objetivo principal de representar e defender os interesses dos consumidores de energia elétrica perante as concessionárias e o poder público. Regulamentados pela Resolução Normativa nº 963/2021 da Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica), esses órgãos são custeados pelos próprios consumidores por meio da tarifa de energia e têm atuação focada nas áreas de concessão.
Contudo, os Conselhos enfrentam muitos desafios que dificultam o cumprimento dos seus objetivos. Uma lacuna importante está nas páginas desses órgãos na internet. Embora seja uma exigência estabelecida pela Aneel, parte dos Conselhos não mantêm atualizadas ou não disponibilizam informações essenciais em seus sites, como a lista de conselheiros e as classes de consumo que representam, o Regimento Interno, a agenda de trabalho, o Plano Anual de Metas (PAM), a prestação de contas e as ações realizadas.
O estudo também não identificou a existência dos sites de seis Conselhos: Conselho de Consumidores de Energia Elétrica do Amapá (CONCEAP), Energisa Rondônia, Energisa Acre, Energisa Cataguases, Energisa Nova Friburgo e Energisa Sul-Sudeste.
Outro ponto crítico é a gestão inadequada do orçamento e a falta de clareza na prestação de contas. Foram identificados gastos excessivos em atividades cotidianas, como alimentação e deslocamento (que chegou a R$ 70 mil em um Conselho na região Sudeste). Também houve o custeio de despesas não prioritárias, como a confecção de brindes e cartilhas, que custou R$ 210 mil em um Conselho da região Norte – montante que supera os recursos anuais recebidos, de R$ 146 mil.
Em alguns casos, essas despesas são realizadas mesmo na ausência de gastos em ações importantes, voltadas à divulgação da atuação do Conselho, pesquisas de opinião, reuniões com moradores locais ou projetos junto à comunidade. Há também casos de ineficiência com Conselhos pouco ativos, que realizam o mínimo de atividades previstas na resolução e utilizam menos de 20% do orçamento destinado.
Representatividade prejudicada
Também foram identificados desafios ligados à representatividade dos Conselhos. Segundo o estudo, o envolvimento de outros órgãos de defesa do consumidor é baixo. Com algumas exceções, representantes do Ministério Público, Defensoria Pública da União e Procon não costumam participar das reuniões, mesmo quando são convidados.
“A participação desses agentes é fundamental para qualificar a atuação dos Conselhos na promoção de justiça na relação de consumo, e garantir o cumprimento dos direitos dos consumidores”, explica Priscila.
Um dos desafios mais recorrentes é a baixa assiduidade e participação dos conselheiros. Embora a resolução da Aneel determine que a ausência injustificada em três reuniões ordinárias seja considerada uma hipótese de destituição imediata de um conselheiro, alguns continuam ocupando seus cargos mesmo após terem faltado em três ou mais ocasiões, de acordo com as atas dos Conselhos.
Outra defasagem importante envolve limitações estruturais e organizacionais, que comprometem a capacidade dos Conselhos de assegurar uma representatividade efetiva dos interesses dos diversos consumidores. Tampouco há critérios claros para definir quais entidades serão responsáveis por indicar conselheiros, pondo em risco o caráter representativo e a transparência desses órgãos.
Além disso, a forma como os Conselhos são regulamentados permite que apenas pessoas já enquadradas em alguma classe de consumo – ou seja, que já são consumidoras das distribuidoras – integrem esses grupos. Isso não garante a participação de habitantes de regiões remotas da Amazônia que ainda sofrem com a falta de eletricidade.
A pesquisadora do Idec destaca a necessidade de atualizar as normas legais que dispõem sobre os Conselhos, para definir diretrizes claras e que enderecem as questões levantadas no relatório. Essa medida, diz a especialista, é urgente em um contexto de relançamento do Luz para Todos e da criação do Programa Energias da Amazônia, uma vez que será crucial fiscalizar as distribuidoras quanto ao cumprimento das metas de atendimento dessas iniciativas e ampliar a representatividade das comunidades de áreas isoladas.
“É preciso promover ajustes e garantir o cumprimento das normas legais vigentes que dispõem sobre as atividades dos Conselhos, para criar um ambiente mais participativo e justo para todos os consumidores de energia elétrica. A reforma do setor elétrico pode oportunizar mudanças que assegurem a qualidade do serviço prestado, o fortalecimento da democracia energética e a defesa dos direitos dos consumidores”, diz Priscila.
O estudo também aponta que o caráter apenas consultivo dos Conselhos pode, na prática, torná-los subordinados às distribuidoras de energia – cenário que pode desobrigá-las a seguir as recomendações dos colegiados. Isso também compromete a autonomia desses órgãos e limita a sua capacidade de promover melhorias no fornecimento de energia e de tomar decisões imparciais e independentes que realmente atendam aos interesses da população.
Para acessar o estudo completo do Idec, clique neste link.
|
Comentários
Seja o primeiro a comentar
Envie Comentários utilizando sua conta do Facebook