Alexandre de Moraes é o maior inimigo do Vale do Silício
Em jogo, a soberania informacional frente ao império algorítmico

Alexandre de Moraes (Foto: Fellipe Sampaio/STF)
O Brasil no centro da tempestade digital
O que acontece quando a mais alta corte de um país se vê obrigada a enfrentar não apenas crimes convencionais, mas uma máquina global de desinformação, manipulação algorítmica e guerra cognitiva? Essa é a situação única vivida pelo Supremo Tribunal Federal do Brasil. Em meio à era das redes sociais descontroladas, onde verdades se tornam descartáveis e algoritmos premiam a histeria, o STF brasileiro passou a reunir, de forma inédita no mundo, provas documentadas, processadas e judicializadas sobre o papel das big techs na desestabilização de democracias.
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O epicentro desse embate tem nome e sobrenome: Alexandre de Moraes. Ministro do STF, relator dos principais inquéritos ligados à pandemia de COVID-19, aos ataques digitais contra as instituições e à tentativa de golpe de Estado em 8 de janeiro de 2023, Moraes se tornou a figura mais proeminente do Judiciário global no enfrentamento às plataformas digitais. Ele não apenas reagiu aos ataques, mas desvendou seus mecanismos. E por isso, tornou-se um inimigo declarado de gigantes como Meta, Google e X, e também do trumpismo internacional, que vê no caos digital um instrumento político.
Neste cenário, o Brasil deixou de ser apenas uma vítima da guerra informacional global para se tornar também um território estratégico. É aqui que se encontra hoje o maior acervo institucional de provas sobre como as big techs alimentam o discurso de ódio, promovem o negacionismo, facilitam o golpismo e comprometem a soberania dos Estados. O que está em jogo não é apenas o controle de conteúdos online, mas a integridade do processo democrático e a soberania informacional de todo um país.
Os três inquéritos que mudaram tudo
O que torna o Brasil um caso singular no mundo é o fato de que três grandes investigações, conduzidas pelo Supremo Tribunal Federal sob a relatória de Alexandre de Moraes, mapearam com precisão a engrenagem da desinformação e a participação ativa das plataformas digitais no colapso institucional brasileiro. Juntas, essas investigações revelam um padrão de ação coordenado, repetido e sistematicamente incentivado por algoritmos que favorecem a polarização, a mentira e o discurso de ódio.
O primeiro desses marcos foi a CPI da Covid-19 e os inquéritos relacionados à pandemia. Eles evidenciaram como o negacionismo sanitário foi alimentado e propagado pelas redes sociais, com a promoção de tratamentos sem eficácia, ataques à ciência e sabotagem das medidas de proteção pública. A máquina de desinformação não agiu sozinha: ela foi impulsionada por estruturas políticas, figuras públicas e sistemas digitais que retroalimentavam o caos em tempo real.
O segundo foi o Inquérito das Fake News, instaurado ainda em 2019, muito antes dos Estados Unidos enfrentarem os desdobramentos do trumpismo digital em seu próprio território. Esse inquérito investigou ameaças contra ministros do STF, campanhas de difamação e redes de ódio operadas por influenciadores, empresários e políticos aliados de Jair Bolsonaro. Foi um dos primeiros casos no mundo em que o Judiciário rompeu a inércia e passou a tratar a desinformação como ataque direto ao Estado de Direito.
O terceiro e mais explosivo foi o Inquérito do 8 de janeiro de 2023, que apurou a tentativa golpista que levou à invasão e destruição das sedes dos Três Poderes. Essa investigação consolidou todas as peças anteriores. Mostrou como grupos se organizaram em tempo real pelas redes, como os financiadores operaram sob blindagem digital e como as plataformas falharam — ou se omitiram deliberadamente — na contenção do discurso de ruptura institucional. O resultado: mais de 370 condenações, dezenas de mandados de prisão, rastreamento de financiamentos e a exposição total da engrenagem da guerra híbrida informacional.
Nenhum outro país acumulou, em tão pouco tempo, um volume tão significativo de provas judiciais contra as big techs. Não se trata de suposições ou estudos acadêmicos, mas de documentos oficiais, decisões judiciais, confissões, imagens, dados forenses e rastreamentos bancários. Pela primeira vez, temos o digital escancarado no papel.
A máquina do caos: como operam as big techs na erosão da democracia
As plataformas digitais que dominam o ambiente informacional contemporâneo, como Google, Meta, X (ex-Twitter), YouTube e TikTok, não atuam com neutralidade. Seus algoritmos não apenas organizam o fluxo de dados, mas moldam a própria percepção da realidade. Essas empresas se transformaram no novo centro de poder global, em que os interesses econômicos se impõem à integridade democrática e à verdade factual. Como mostra o jornalista Max Fisher em seu livro "A Máquina do Caos", as redes sociais são projetadas para capturar a atenção humana por meio da polarização, do medo e do conflito, criando ambientes altamente tóxicos para o debate público. No Brasil, os três inquéritos conduzidos por Alexandre de Moraes demonstraram com clareza como esse sistema foi usado para disseminar desinformação, impulsionar discursos extremistas e enfraquecer as estruturas institucionais do Estado.
Ao contrário do que sugerem seus representantes, as big techs não operam como simples intermediárias de conteúdo gerado por terceiros. Os algoritmos que as sustentam são projetados para favorecer aquilo que gera maior engajamento emocional e polêmica, em detrimento da veracidade ou responsabilidade. Nesse ambiente, a mentira tem maior alcance. Ela é mais rápida, mais rentável e mais facilmente propagada. E como revelaram os inquéritos no Brasil, as plataformas têm operado com uma mistura de negligência e conveniência.
Durante a pandemia, essa lógica algorítmica amplificou o negacionismo sanitário. Remédios ineficazes, como a cloroquina, tornaram-se populares graças à viralização digital. A recusa à vacina foi transformada em movimento político e os ataques à ciência passaram a ser premiados com curtidas, compartilhamentos e impulsionamentos. No inquérito das fake news, ficou evidente como as redes permitiram campanhas articuladas de intimidação e difamação contra ministros do STF, jornalistas e opositores do bolsonarismo digital. E no 8 de janeiro, as redes não apenas serviram como canal de organização dos atos golpistas, mas também como vitrine e amplificador de seus efeitos.
Não se trata de falhas técnicas pontuais. Estamos diante de um modelo de negócios baseado no colapso da esfera pública. A desinformação gera cliques. O ódio mantém usuários conectados. A indignação viciada é uma moeda valiosa. A partir das investigações do STF, o Brasil mostrou ao mundo que existe um padrão global de erosão institucional que é incentivado e explorado comercialmente pelas plataformas digitais. E não é coincidência que esse processo tenha ocorrido com tanta força no país. O Brasil virou, por escolha das próprias corporações, um laboratório para o colapso democrático em escala algorítmica.
Alexandre de Moraes no alvo: o maior inimigo do Vale do Silício - Nenhum outro juiz no mundo acumulou, com tamanha consistência, protagonismo e coragem, o enfrentamento direto às big techs como Alexandre de Moraes. Ele não apenas investigou. Ele entendeu o funcionamento da engrenagem, rastreou seu impacto e enfrentou as suas consequências mais perigosas. Em todos os três inquéritos — da Covid, das fake news e do 8 de janeiro — Moraes aparece como o magistrado que ousou fazer aquilo que quase nenhuma corte no Ocidente fez até agora: responsabilizar juridicamente o sistema de desinformação construído pelas plataformas.
Por isso, não é exagero dizer que Moraes se tornou o maior inimigo do Vale do Silício. E o mais curioso é que isso não se deu por uma disputa abstrata sobre liberdade de expressão, mas por um embate direto contra os efeitos práticos das plataformas no colapso democrático. Moraes não está julgando ideias, mas rastros digitais, redes de financiamento, impulsionamentos fraudulentos, campanhas coordenadas de ataque institucional, e algoritmos usados como armas de guerra cognitiva. Seus despachos são, ao mesmo tempo, jurídicos e forenses. E é justamente isso que incomoda as big techs e seus aliados políticos.
O incômodo é global. A administração Trumpista, já de volta ao poder nos Estados Unidos, sinalizou recentemente sanções diplomáticas contra autoridades estrangeiras acusadas de censura a plataformas. Sem citar nomes, a ameaça é interpretada no Brasil como um recado direto a Moraes, exatamente no momento em que o STF retoma o julgamento sobre o artigo 19 do Marco Civil da Internet. Paralelamente, figuras como Eduardo Bolsonaro articulam pressão internacional contra o STF, tentando vender o discurso de que o Brasil vive uma ditadura togada, quando, na verdade, o que se vive é uma ofensiva inédita contra o império da manipulação algorítmica.
Alexandre de Moraes virou o nome mais visado por essas forças porque ele representa, hoje, a única barreira institucional eficaz contra o projeto de desinformação sistemática que serve ao bolsonarismo e ao trumpismo. Seu trabalho tem exposto o funcionamento subterrâneo das redes, retirado a máscara de neutralidade das plataformas e mostrado ao mundo que é possível responsabilizar juridicamente os novos agentes do caos digital.
Reynaldo José Aragon Gonçalves
Reynaldo Aragon Gonçalves é jornalista e pesquisador do Núcleo de Estudos Estratégicos em Comunicação, Cognição e Computação (NEECCC) e do INCT em Disputas e Soberania Informacional.
35 artigos
Todos por Moraes e pela democracia
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