'As pessoas devem sair da pílula no copo d’água para se entenderem mais'

Expressar sentimentos positivos para filhos, familiares e colegas de trabalho parece incomum, mas poderia evitar uma série de problemas que resvalam no adoecimento mental

Montezuma Cruz Fotos: Frank Néry
Publicada em 16 de setembro de 2019 às 09:32
'As pessoas devem sair da pílula no copo d’água para se entenderem mais'

Psicólogo propõe elogios em substituição a críticas e julgamentos entre servidores públicos e pessoas em geral

No passado as pessoas conversavam até à luz de lamparina, saíam às calçadas, se visitavam mais. Atualmente isso já não acontece, por causa do avanço tecnológico nas comunicações eletrônicas, que praticamente obrigam crianças e adultos a serem mais imediatistas em tudo.

“A saúde emocional está escanteada na saúde pública”, disse em palestra na manhã da última sexta-feira (13) o psicólogo Edlei Timbó Passos, 32 anos. Ele participa da campanha Setembro Amarelo, promovida pelo governo estadual.

Como são feitas as perícias no Instituto de Previdência do Estado de Rondônia (Iperon)?  – indagou. Em seguida, disse que o diagnóstico do trabalhador não cabe ao psicólogo. Mais delicado ainda: atestados (e licenciamentos) psicológicos não são aceitos no serviço público, ao contrário de outros motivados por doenças físicas, entre as quais, LER, DORT, hérnias, deficiências na coluna vertebral e doenças respiratórias.

 

“Nem todo clínico geral constata e medica depressão; muitas vezes ele encaminha situações aos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) e para a Policlínica Oswaldo Cruz, cujo atendimento vem desde 2017”, queixa-se.

 Ao enfatizar que o adoecimento físico e emocional é motivado por muitos comportamentos – separação, desemprego, gravidez, pós-parto –, ele ouviu depoimentos de diversos servidores públicos, a respeito de situações pessoais, de filhos, parentes e amigos.

“Aqui mesmo, no dia a dia corrido no governo, passamos um pelo outro e muitas vezes não nos damos conta nem de olhar para o colega que está ao lado”, disse Edlei Passos.

 

Ensinou que refletir e pensar são essenciais: “Julgamos o outro, disso ninguém escapa”. Nas leituras políticas, exemplificou, as pessoas adquirem “defesa maior do que a do time de futebol”, dando margem a intermináveis polêmicas.

SAÚDE EMOCIONAL

A agressividade deve acontecer em algumas ocasiões, ele defende, entretanto, sugere evitar o descontrole que ocasiona uma energia ruim em qualquer ambiente.

“Sair de cama na sexta-feira para trabalhar é um exemplo de ousadia, de agressividade (positiva), porque a pessoa vence barreira. De outro lado, picos de raiva levam ao adoecimento, fazem o subordinado brigar com o chefe e até tirar a vida de outra”, explicou.

Na Escola de Governo, palestra do Setembro Amarelo mobiliza servidores

Revelou que no CAPS Estadual Madeira Mamoré, onde trabalha, crescem os casos de agressões físicas e verbais por parte de pacientes que se consideram imunes a advertências e mesmo a soluções de seus problemas.

Essa desestabilização no serviço público pode mudar, conforme Edlei Passos, quando existe a prática do reconhecimento a boas ações.

O audiovisual mostra o exemplo da saúde emocional. Expressar sentimentos positivos para filhos, familiares e colegas de trabalho parece incomum , há pessoas que estranham, lembrou o psicólogo.

“No trabalho, isso não é usual, mas quando acontece funciona, é lindo, espetacular, e contribui para que a pessoa alcance a terceira idade em melhores condições de manter vínculos de amizade, o que hoje anda escasso”, assinalou.

O audiovisual mostra dois bebês se encontrando, descrevendo claramente a empatia. “Atualmente temos colocado o nosso ponto de vista sobre o problema do outro; olhem os bebês se entendendo”, alertou.

 

“Por mais difíceis que sejam os comportamentos podem ser modificados, desde um simples cumprimento, elogio, a um pedido de favor”, observou o psicólogo.

Lamentou situações viciantes: “Receitas e receitas médicas são ministradas, porém, se necessárias de um lado, de outro não curam a causa do problema”.

Mencionando o aumento dos números de casos de ansiedade, depressão, esquizofrenia e transtorno de personalidade no Brasil e no mundo, questionou: “Há pessoas entre 18 e 80 anos que insistem em tratamentos com remédios, ou seja, para elas é mais fácil a pílula no copo d’água, e não saem disso”.

Na visão de Edlei Passos, não existe prevenção de suicídio, quando já ocorreram tentativas.

A cada ano, cerca de 800 mil pessoas tiram a própria vida e um número ainda maior de indivíduos tenta suicídio, revela a Organização Panamericana de Saúde (Opas).

Cada suicídio é uma tragédia que afeta famílias, comunidades e países inteiros e tem efeitos duradouros sobre as pessoas deixadas para trás. Segundo a Opas, o suicídio ocorre durante todo o curso de vida e foi a segunda principal causa de morte entre jovens de 15 a 29 anos em todo o mundo no ano de 2016.

A palestra abordou também agressões sexuais, bullying, modo de vida de autistas, e limitações quando a denúncia se faz necessária e inadiável. “É prejudicial para a formação da personalidade da criança guardar o bullying”, alertou.

“Contar ou não contar, eis o desafio que pode resultar até mesmo em destruição de reputação”, acrescentou.

QUEM É

Edlei Passos é especialista em Psicologia Organizacional pela Faculdade Católica de Rondônia (2010) e Gestão de Pessoas pela Fundação Getúlio Vargas (2012). Tem habilitação como Especialista pelo Conselho Federal de Psicologia na área de Psicologia Organizacional e do Trabalho (2014). É Mestre em Ensino em Ciências da Saúde pela Unir (2015). Tem experiência na área de Psicologia, com ênfase em Psicologia das Relações Interpessoais e Psicologia Organizacional. É Consultor na Área de Gestão de Pessoas e Psicologia Organizacional, e também docente na Faculdades Uniron, ministrando disciplinas nos cursos de Administração e Gestão de Recursos Humanos. Atua como preceptor do Internato Médico de Saúde Mental do Centro de Ensino São Lucas e psicólogo no Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) Estadual Madeira Mamoré, e é diretor da empresa Fábrica de Competência.

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