Bolivianos unidos recuperam dignidade e democracia

"Merecem os nossos aplausos os valentes vizinhos, que retomam nas mãos o seu destino, numa demonstração da mais pura dignidade"

Denise Assis
Publicada em 20 de outubro de 2020 às 12:51

(Foto: Reprodução)

Os jornalões preferiram não apostar na virada pacífica, pelo voto, do cenário político na Bolívia. As notícias em destaque variaram entre as manifestações de Paris, pela morte de um professor decapitado (segundo a versão da Polícia), por motivos religiosos, e houve quem preferiu a luta do vizinho Chile, destacando a dúvida sobre o resultado das eleições dos vizinhos. Certo é que os bolivianos, desafiando os perigos da Covid-19, que insiste em não ir embora – e até retorna com força na Europa – foram às ruas, foram às urnas e hoje acordaram donos da pauta de quem os quis manchete.

Quando o que está em risco é o destino do país e o rumo de suas vidas, a democracia, os povos costumam reagir em qualquer parte do mundo. A esta altura, podemos não considerar que sejamos “parte do mundo”. Aqui nos quedamos, primeiro, num estado de perplexidade derrotista. Depois, em um imobilismo de dar gosto à direita vitoriosa. Por fim, fizemos o que costumamos fazer: acordos, constas de chegar, vista grossa. Não! Sejamos justos! Produzimos quilos de notas de repúdio. Assinamos um sem fim de manifestos. Encaminhamos alguns pedidos de explicações a políticos que andaram sambando errado. E, finalmente, estamos produzindo carreatas para mudar no voto – pulverizado entre trocentos segmentos da esquerda – a feição da política em algumas cidades brasileiras.

Dá uma inveja danada ver o brio, a maturidade política, o nível de consciência da ameaça do fascismo e a coragem de seguir unidos, sem “mimimi”, com um único ideal, às ruas, às urnas para dizer o que querem para as suas vidas e para o futuro dos seus filhos e netos, dos bolivianos.

Para atingir os (até agora prováveis) 52% sobre os golpistas que lhes tirou do poder o presidente eleito,  marcharam compactos, sem disputas de egos ou de protagonismo, mirando apenas o objetivo máximo: tirar do cargo de mandatária a impostora que unida com forças de todo o tipo – até mesmo milicianos – se apossou da cadeira de dirigente.

Enquanto as veias abertas da América Latina sangram sob os pés da direita branca, violenta e autoritária em países dominados por golpes e governos impostos por forças externas, merecem os nossos aplausos os valentes vizinhos, que retomam nas mãos o seu destino, numa demonstração da mais pura dignidade.

Denise Assis

Jornalista. Passou pelos principais veículos, tais como: O Globo; Jornal do Brasil; Veja; Isto É e o Dia. Autora de "Propaganda e cinema a serviço do golpe - 1962/1964" e "Imaculada". Membro do Jornalistas pela Democracia

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