CNJ disciplina atuação das comissões de heteroidentificação em concursos para magistratura
Os procedimentos de heteroidentificação têm como base as características fenotípicas das pessoas, ou seja, aquelas que podem ser observadas, como cabelo, tom de pele, nariz e boca
19ª Sessão Ordinária de 2023 - Foto: Luis Silveira/Ag.CNJ
O Plenário do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) aprovou nesta terça-feira (12/12), por maioria, princípios e diretrizes que deverão orientar os procedimentos de heteroidentificação – identificação étnico racial – nos concursos de ingresso na magistratura brasileira. A aprovação do Ato Normativo 0005090-13.2023.2.00.0000 ocorreu durante a 19ª Sessão Ordinária de 2023. Também foi chancelada a criação do Banco Nacional de Especialistas para composição de Comissões de Heteroidentificação no âmbito do Poder Judiciário, que servirá para o cadastramento de dados de profissionais com formação em questões raciais.
Os procedimentos de heteroidentificação têm como base as características fenotípicas das pessoas, ou seja, aquelas que podem ser observadas, como cabelo, tom de pele, nariz e boca. As comissões não analisam os concorrentes pelo genótipo, ou seja, a análise não é feita tendo em vista o parentesco com pretos e pardos, e sim com a leitura racial.
A Resolução entra em vigor em abril de 2024. De acordo com o texto, para concorrer às vagas reservadas a candidatos negros, o candidato deverá se autodeclarar no momento da inscrição no concurso, segundo os critérios de raça e cor utilizados pelo IBGE. Os candidatos que se autodeclararam negros deverão ser aprovados inicialmente na 1ª etapa, quando a declaração será ou não confirmada por meio das fotos apresentadas. Somente os que ultrapassarem essa fase seguirão para a entrevista presencial ou telepresencial.
Relator do processo, conselheiro Vieira de Mello Filho, que coordena o Fórum Nacional do Poder Judiciário para a Equidade Racial (Fonaer), explicou que a medida é fundamental como forma de se reduzir ou evitar a fraude e o desvio ético praticado por uma conduta ilícita.
“A autodeclaração tem ensejado desvios indesejados nos concursos de magistratura, uma vez que algumas pessoas brancas vêm se inscrevendo como negras, de maneira a se darem a chance de ir para fases subsequentes do concurso e, com isso, terem a oportunidade de um treinamento real de realização de provas discursiva, de sentenças e até oral. É o que se chama, no universo dos candidatos de concursos públicos, de treineiros”, explicou.
O CNJ já havia determinado como obrigatória a criação de comissões de heteroidentificação nos concursos de ingresso na magistratura. As bancas passaram a ser obrigatórias após a entrada em vigor da Resolução n° 457/2022. A medida se fez necessária para não haver dúvida em relação a quem tem direito a sua utilização e evitar concorrência indevida para essas vagas: brancos de origem multirracial – o que é comum no Brasil – não são beneficiários das cotas.
Vieira de Mello Filho ressaltou que, embora ainda subsista no senso comum uma discussão sobre uma “suposta subjetividade no procedimento de heteroidentificação”, a literatura especializada já definiu critérios claros sobre o fenótipo do negro (que inclui pretos e pardos) a serem utilizados nas avaliações de heteroidentificação.
“A utilização conjugada dos critérios de autoidentificação e heteroidentificação, de forma complementar, permite a aferição, de forma razoavelmente objetiva, da condição pessoal e social de negro do candidato”, completo Vieira de Mello Filho.
Filmagem e gravação
A aprovação do candidato na condição de cotista dependerá do voto favorável da maioria absoluta dos integrantes da comissão de heteroidentificação. O procedimento será filmado e sua gravação será utilizada na análise de eventuais recursos interpostos pelos candidatos. Quem se recusar a realizar a filmagem para fins de heteroidentificação será eliminado do concurso público.
A comissão deverá aferir características exclusivamente fenotípicas do candidato existentes ao tempo da realização do procedimento. Não valerá quaisquer registros ou documentos antigos, eventualmente apresentados, inclusive imagens e certidões referentes à confirmação em procedimentos de heteroidentificação realizados em outros concursos públicos federais, estaduais, distritais e municipais.
Ficou decidido que, para atuar na Comissão, serão designados cinco integrantes titulares e seus respectivos suplentes, que atuarão em caso de suspeição ou impedimento. Seus integrantes deverão ser negros, em sua maioria, além de atender à diversidade de gênero.
Banco de especialistas
A criação de um banco de dados onde serão cadastrados profissionais com formação em questões raciais, para consulta pública dos Tribunais também foi aprovada pelos conselheiros. No cadastro, serão incluídos nomes de profissionais qualificados, aprovados pelo Comitê Executivo do Fonaer. A inclusão não criará vínculos empregatícios de qualquer natureza, nem autoriza que a pessoa cadastrada atue como representante do CNJ perante outras instituições.
As comissões de heteroidentificação poderão acessar banco de dados por meio de painel a ser disponibilizado no Portal do CNJ, ressalvados os dados sujeitos a acesso restrito. O cadastramento de profissionais ocorrerá mediante requerimento da pessoa interessada.
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Capacitação
Com apoio do Fonaer e em parceria com a Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (Enfam), o CNJ deverá realizará (ao menos) anualmente um curso de formação e atualização em questões raciais com o objetivo de capacitar profissionais que comporão as comissões de heteroidentificação.
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