Com um pé em cada canoa, PP e Republicanos preparam desembarque do bolsonarismo
"Ao puxar PP e Republicanos para dentro, o presidente poderá despertar neles relutância em sair do governo e voltar ao bolsonarismo em 2026", diz Helena Chagas
Luiz Inácio Lula da Silva (Foto: Ricardo Stuckert)
Lula cozinhou sua reforma ministerial por quase três meses e agora alguns dizem que perdeu o timing e terá que ceder mais do que precisava antes. O Centrão saiu da fase de bonzinho marcada pela aprovação da reforma tributária e pela troca dos membros da CPI do MST para esvaziar a maioria bolsonarista e agora ameaça desfazer a manobra. As pontas deixadas pela aprovação final do arcabouço fiscal, com a transferência do crédito extraordinário de mais de R$ 30 bilhões para futura votação na LDO, fazem parte do rol da chantagem. E ainda temos o Orçamento/2024 e a segunda parte da reforma tributária pela frente, além de outras matérias de interesse do Planalto. Que canseira. No final, tudo se ajeita.
Antes de qualquer coisa, porque PP e Republicanos estão acompanhando as mudanças num cenário em que Lula se fortalece e fica mais popular — e que, em contrapartida, Jair Bolsonaro e seus seguidores, até ontem os aliados preferenciais dessa turma, vão entrando numa espiral de desgraça.
Lula demora e regateia na entrega dos ministérios pedidos por essas legendas porque sabe também, de antemão, que seus dirigentes não vão entregar a mercadoria completa. É da natureza do PP e do Republicanos acender velas a santos diferentes na mesma missa. Nem num caso, nem noutro, vão aderir formalmente à base do governo ou marchar unidos para o Planalto. Com os ministérios, devem dar a maioria dos votos na Câmara — hoje o PP tem 49 deputados e o Republicanos conta com 41. Se, juntos, derem algo entre 60 e 70 votos ao governo, este já terá maioria folgada na Casa.
É por aí que Lula não tem pressa, e nem obrigação de dar a principal joia da coroa que o PP pede, o MDS, que cuida do Bolsa Família, ao líder André Fufuca. Afinal, o presidente do partido, o bolsonarista Ciro Nogueira, continua batendo no governo dia sim, outro também. Não merece nem de longe levar como prêmio a cabeça de Wellington Dias, seu principal adversário no Piauí — de quem, aliás, tomou tremenda surra em 2022. Não há qualquer sentido nessa operação, e Lula vai mostrar isso na quinta-feira, quando irá ao estado, com Dias, lançar o Brasil sem Fome.
Mas o PP vai entrar no governo, sim, sem hesitação ou constrangimento, levando Ciência e Tecnologia, Microempresa ou outra pasta. Ser governo é da natureza do partido de Arthur Lira, que já levou a promessa de nomear presidente da CEF a ex-deputada Margarete Coelho (PP-PI) e 12 diretorias e vice-presidências para o centrão — o que vale mais em termos de orçamento e capilaridade do que a maioria dos ministérios.
O Republicanos, partido do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, funciona mais ou menos da mesma forma que o PP. Já levou a promessa de Portos e Aeroportos para o deputado Sylvio Costa Filho e não vai reclamar — e nem aderir oficialmente ao governo. Ardilosamente, Lula está destinando ao partido o ministério que controla o porto de Santos, estrutura que faz o governador de São Paulo salivar, até para comandar um processo de privatização com o qual o atual ministro, Marcio França, não concordou. Isso deve ajudar o Republicanos a evitar a debandada de Tarcísio da legenda, apesar da pressão do bolsonarismo.
Contas feitas, noves fora, teremos mais alguns frankensteins políticos. O Planalto terá o apoio parlamentar de dois partidos do espectro bolsonarista cujas cabeças ainda raciocinam — ou fingem fazê-lo — segundo os cânones da direita, que em tese terá um candidato para assumir o legado do ex-presidente inelegível. Quem sabe até o governador de São Paulo.
Mas aí é que está o salto triplo carpado de Lula: ao puxar PP e Republicanos para dentro de casa, oferecendo-lhes abrigo em cargos federais e farta alimentação em verbas e emendas, o presidente petista poderá despertar neles, gordos e satisfeitos, relutância em sair da casa do governo e voltar à embarcação precária do bolsonarismo em 2026. Isso vai depender do grau de aprovação de Lula e de outros fatores. Mas a estratégia desses partidos de passar a ter desde já um pé em cada canoa diz muito.
Helena Chagas
Helena Chagas é jornalista, foi ministra da Secom e integra o Jornalistas pela Democracia
Comissão aprova ampliação de prazo para renegociação de dívidas do Fies
Medida vale para estudantes que estavam inadimplentes em 2021
Comissão aprova projeto que determina instalação de delegacias especializadas em crimes rurais
"Só em Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso foram 70.966 furtos e roubos nos últimos dois anos”, ressalta o relator
Lula assina medida provisória para taxar fundos de super ricos
Estimativa do governo é que regra alcance 2,5 mil brasileiros
Comentários
Seja o primeiro a comentar
Envie Comentários utilizando sua conta do Facebook