Desesperar da esperança
O vocábulo ilustra adequadamente a realidade brasileira no momento em que a pandemia impõe 300 mil mortes ao país e uma verdade inescapável
“Não vamos desesperar da esperança. Aceitar perdê-la, nunca!” - O trecho, pinçado de manifestações da população de Londres, fustigada pela obsessão de Hitler em vergar, com bombardeio jamais visto sobre a cidade, sobre a qual foram despejadas mais de 80 mil bombas, integra a construção do “Novo Sapiens”, pelo historiador holandês Rutger Bregman. Ele cataloga, no livro “Humanidade: uma história otimista do homem”, diferentes episódios, como aquele de Londres, no qual a população civil, ao contrário de se submeter ao poderio alemão, se fortaleceu em uma resistência furiosa e solidária, que acabou por dobrar o opressor e conduzir os aliados à vitória.
Desespero, do Latim “desesperare” ou “perder a esperança” - estado de desânimo de alguém que se encontra em grande dificuldade; exasperação, é convertido, com uma pitada de licença poética, na construção do texto em “deixar de esperar” (pela esperança). O vocábulo ilustra adequadamente a realidade brasileira no momento em que a pandemia impõe 300 mil mortes ao país e uma verdade inescapável: só com a mobilização de toda a sociedade será possível vencer essa guerra. O otimismo de Bregman, embora possa parecer exagerado por aqui, num momento em que a crueldade e a falta de empatia permitem incorporar discussões estéreis sobre reflexos e dividendos político/eleitorais à busca de estratégias eficazes de enfrentamento do verdadeiro inimigo: o vírus.
Observe-se, porém, que as ações, antes absurdamente dispersas, começam a convergir na direção correta, em uma conjuminância de forças capaz de impor a necessária mobilização geral em favor desse esforço de guerra. Já existe consenso – expresso no manifesto dos 500 empresários, banqueiros e economistas – sobre não ser possível alavancar a economia sem combater o vírus. Diz o texto que “A contração da economia afetou desproporcionalmente trabalhadores mais pobres e vulneráveis. Esta recessão, assim como suas conseqüências sociais nefastas, foi causada pela pandemia e não será superada enquanto a pandemia não for controlada”. O ministro Paulo Guedes concorda.
Exemplo disso está em uma das primeiras propostas partidas dos empresários na direção do Congresso: a efetivação de um programa de renda básica no País. O Movimento Convergência Brasil, lançado no ano passado, propõe direcionar às famílias uma parcela dos recursos obtidos com as privatizações e com a reforma administrativa. É oportuno sugerir que sejam buscados também aí os recursos que faltam às universidades brasileiras para investimentos em pesquisas.
Exemplos de mobilização em defesa da vida tem partido da OAB desde o início da pandemia. Ações em favor da fiscalização na aplicação dos recursos da saúde e otimização dos resultados de seu emprego adequado já foram desenvolvidas desde há um ano pela OAB Rondônia. Na esfera nacional, a OAB já entrou com ação no STF para pedir que recursos recuperados no âmbito da operação Lava Jato e de fundos que não têm destinação específica determinada por lei ou aplicação vinculada sejam direcionados à compra de vacinas, de forma a desafogar os já combalidos estados da federação.
Na última sexta-feira a OAB pediu novamente o STF, uma liminar para obrigar o presidente Jair Bolsonaro a adquirir vacinas em quantidade suficiente para imunização em massa da população de forma urgente e no menor prazo possível. Esta ação complementa pedido anterior, já autorizado pelo ministro Lewandowsky, que autoriza Estados e Municípios a comprar e distribuir vacinas contra a covid-19 que tenham sido aprovadas por agências ou autoridades sanitárias estrangeiras, mesmo antes que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) expedisse a autorização para isso no prazo de 72 horas.
O STF acatou também, por unanimidade, medida cautelar da OAB para determinar ao Ministério da Saúde a retomada da divulgação diária dos dados epidemiológicos relativos à pandemia. Foi igualmente de autoria da Ordem, já em abril de 2020, a ADPF 672, acolhida pelo STF, para garantir a governadores e prefeitos o direito constitucional de atuar no enfrentamento da crise sanitária, independentemente de decretos governamentais. A atuação da Ordem tem seguido rigorosamente o que ensinou Chico Xavier: “Ninguém pode voltar atrás e fazer um novo começo. Mas é possível começar de novo e fazer um novo fim”. É o que o Brasil inteiro espera.
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