Estudos apresentam dados sobre eficiência do uso mediação e conciliação na Justiça

Dessa vez, o tema que reuniu pesquisadores e magistrados foi o alcance das soluções por meio da mediação e conciliação

Regina Bandeira Edição: Thaís Cieglinski Agência CNJ de Notícias/Fotoarte: Romulo Serpa/CNJ
Publicada em 09 de junho de 2022 às 17:28
Estudos apresentam dados sobre eficiência do uso mediação e conciliação na Justiça

Em Primavera do Leste, município no interior do Mato Grosso, as tentativas de se chegar a um acordo alcançam melhores resultados quando as audiências de conciliação e mediação são feitas na etapa pré-processual. Uma pequena mas relevante radiografia sobre o índice de eficiência das soluções autocompositivas na cidade de 61 mil habitantes foi apresentada no dia 19 de maio, durante a edição dos Seminários de Pesquisas Empíricas aplicadas a Políticas Judiciárias, promovida pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Dessa vez, o tema que reuniu pesquisadores e magistrados foi o alcance das soluções por meio da mediação e conciliação.

Gestora do Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania (Cejusc) do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT), a mediadora judicial Marina Soares Vital Borges apresentou dados relativos à cidade do interior do Mato Grosso – estado que ocupa a sétima colocação em número de Cejuscs no país: são 42 centros em 79 comarcas, segundo dados do CNJ.  Elaborado em 2019, com números de 2018, o estudo revelou que, quando as técnicas de resolução autocompositivas são utilizadas em sessões pré-processuais, o índice de acordo é alto (77,4%). Das 93 audiências realizadas, houve acordo em 72.

Quando se trata de sessões em que se utiliza a técnica da mediação pré-processual o índice é ainda melhor, chega a 85%. Das 152 tentativas de mediação realizadas, em 129 foi possível fechar um acordo. Em sua maioria, são tratados conflitos familiares. A diferença entre as técnicas de conciliação e de mediação é sutil: a primeira é utilizada preferencialmente nas ações em que não há vínculo entre as partes, normalmente em uma única sessão, e o conciliador pode sugerir soluções. Já a mediação é geralmente sugerida quando os conflitos ocorrem entre pessoas que mantem algum tipo de relações, pessoal ou comercial, com o objetivo de restabelecer o diálogo. As propostas de solução, em geral, surgem após algumas sessões.

Quando as conciliações se dão depois de iniciada o processo judicial, o índice de acordo é bem menos expressivo: das 444 sessões de conciliação realizadas no Cejusc daquela localidade, houve acerto em apenas 11% (49 casos). Já as mediações judiciais familiares obtiveram 70% de acordo – das 126 sessões realizadas, houve sucesso em 88.

Marina Soares ressaltou que as ferramentas usadas nas soluções autocompositivas têm contribuído para diminuir a sobrecarga processual e resolver os conflitos, mas não serve para todos os casos. “As sessões pré-processuais ocorrem em casos que ainda não chegaram à Justiça e o incentivo para todos os envolvidos é exatamente esse: evitar os custos da judicialização e a demora da tramitação. As partes têm mais disposição para fazer o acordo. É um recurso que deve ser cada vez mais incentivado. Assim como os cursos de formação em mediação devem ser mais intensificados.”

Efetividade

Instrutor de mediação judicial formado pelo CNJ, o servidor do Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE) Adriano Marcos Barreto da Costa apresentou resultados da pesquisa “Conciliação e mediação no âmbito dos processos das varas cíveis do TJPE”, que trata da efetividade das audiências de conciliação e mediação em processos das varas cíveis do Recife, conforme previsão do artigo 334 do novo Código de Processo Civil (CPC). A lei sancionada em 2015 determina que, se a petição inicial preencher requisitos essenciais, o juiz designará audiência de conciliação ou de mediação com antecedência mínima de 30 dias, devendo o réu ser citado com pelo menos 20 dias de antecedência.

Os dados entre novembro de 2018 e outubro de 2019 revelaram que, dos 13 mil processos cíveis submetidos à sessão prévia de conciliação, foram realizadas efetivamente apenas 6.300 audiências (48% de comparecimento), tendo havido apenas 386 acordos (6%). Tomando por base as audiências designadas, o índice ficou em 2,9%.

“Para cada 100 demandas com audiência designada, apenas três resultam em acordo. A grande maioria das empresas apresenta índice de conciliação baixíssimo”, disse Adriano Costa. Segundo o servidor do TJPE, a atuação dos conciliadores não chegou a fazer diferença. Destaca-se que nesses casos não estão contemplados processos de família, mas apenas questões cíveis. “O que apresentou maior influência sobre o resultado foi a parte demandada, e seu desinteresse em conciliar. A gente observa isso nas sessões, mesmo com uma designação volumosa de audiência, e uma estrutura montada para esse fim.”

O índice de acordo entre os grandes demandados – aqueles que representam mais da metade dos processos (57%) – foi de 3,4%. A Sul América Saúde, por exemplo, só aceitou fazer acordo em uma das 492 sessões realizadas. Das 479 sessões, o Banco do Brasil entrou em acordo em apenas cinco casos.  Já a Azul Linhas Aéreas foi um exemplo de bons índices, com índice de quase 35%. Dos 53 casos analisados, houve conciliação em 28.

No seminário, também foi apresentado levantamento que abordou as estatísticas de conciliações e mediações ocorridas em 94 comarcas piauienses. O “Estudo Jurimétrico sobre conciliações e mediações no Estado do Piauí” foi o primeiro levantamento sobre o assunto elaborado por servidores do Tribunal de Justiça do Piauí (TJPI), em parceria com o Laboratório de Colaboração e Estatística da Universidade Federal do Piauí (UFPI). Os dados analisados, referentes aos anos 2016 e 2017, puderam revelar detalhadamente índices de acordo por grupos de comarcas, separadas por tamanho.

O analista judiciário Thalison Clovis Ribeiro da Costa, mestrando da UFP em políticas públicas e um dos autores do trabalho, revelou que a partir do estudo, até o final deste ano, os especialistas deverão detalhar uma série histórica sobre os últimos 10 anos, aplicando a mesma metodologia. O método também ajudará a fazer uma projeção até 2026. “Será o momento em que encaixaremos tudo: planejamento estratégico, os dados trazidos pela jurimetria, essa parceria da academia com a instituição pública e as políticas públicas.”

“Certamente com dados e informações, instituições e gestores públicos construirão políticas públicas cada vez melhores”, reforçou a juíza auxiliar da Presidência do CNJ Trícia Navarro, que coordenou o seminário.  Especialista na temática da mediação e conciliação, o juiz Alexandre Lopes de Abreu, do Tribunal de Justiça do Maranhão (TJMA), reforçou a necessidade de se investir e estimular a conciliação pré-processual para o melhoramento dos resultados e também da satisfação da sociedade. “É um acesso à Justiça, mesmo fora do Judiciário.”

“As pesquisas ajudam a planejar as políticas públicas e é interessante perceber como a política de tratamento adequado dos conflitos já tem mais de 10 anos, mas ainda sofre com muitas críticas, desconhecimento e falta de investimento nos tribunais, em termos de estrutura e pessoal”, afirmou a juíza Luciana Sorrentino, do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT), uma das debatedoras do evento.

Reveja o seminário no canal do CNJ no YouTube

Comentários

    Seja o primeiro a comentar

Envie seu Comentário

 
NetBet

Envie Comentários utilizando sua conta do Facebook