Fixação de curatela compartilhada para interditado não tem caráter obrigatório

Por meio de recurso especial, o interditado – cujo advogado é o próprio pai, seu curador provisório – alegou que seria obrigatório que ele fosse ouvido para se manifestar sobre a adoção da curatela compartilhada

STJ
Publicada em 03 de agosto de 2021 às 15:53
Fixação de curatela compartilhada para interditado não tem caráter obrigatório

Diferentemente do que ocorre com a guarda compartilhada de filhos, a adoção da curatela compartilhada de pessoa interditada não é obrigatória para o juízo, mesmo que haja pedido dos interessados, já que o artigo 1.775-A do Código Civil estabelece que a Justiça poderá – e não que deverá – fixar o compartilhamento.

Para decidir sobre a concessão da curatela compartilhada, o juízo deve levar em conta algumas circunstâncias, como o interesse e a aptidão dos candidatos a exercê-la e a constatação de que a medida é a que melhor resguarda os interesses do curatelado.

O entendimento foi aplicado pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao manter acórdão do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT) que, com base em laudo pericial, confirmou sentença de interdição e nomeou a mãe do interditado como curadora definitiva.

Por meio de recurso especial, o interditado – cujo advogado é o próprio pai, seu curador provisório – alegou que seria obrigatório que ele fosse ouvido para se manifestar sobre a adoção da curatela compartilhada. Também defendeu a reforma do acórdão do TJMT, entre outros motivos porque o Ministério Público não participou da audiência de interrogatório e não houve a intimação pessoal do curador provisório.

Ausência do MP em atos processuais

A ministra Nancy Andrighi, relatora do recurso, explicou que, de acordo com o artigo 279 do Código de Processo Civil de 2015, a causa de nulidade não é a falta de participação do Ministério Público em atos processuais, mas a inexistência de intimação. No caso dos autos, porém, a relatora lembrou que o MP foi devidamente intimado.

"Ademais, não se extrai do artigo 751 do CPC/2015 (correspondente ao artigo 1.181 do CPC/1973) qualquer obrigatoriedade da presença do representante do Ministério Público na audiência de instrução ou entrevista", completou a magistrada.

A relatora apontou que, se é possível ao MP se colocar contra o interesse do autor da ação de interdição, ele também pode, se for intimado, deixar de se manifestar ou intervir na prática de ato processual que considerar dispensável.

Intimação pessoal do curador provisório

Em relação à intimação pessoal do curador provisório, Nancy Andrighi citou jurisprudência no sentido de que a desobediência a formalidades legais só invalida o ato quando sua finalidade estiver comprometida pelo vício, trazendo prejuízo às partes.

No caso em julgamento, entretanto, a ministra ressaltou que o curador especial provisório é advogado habilitado nos autos, e recebeu a intimação sobre a data da audiência de instrução por meio do Diário de Justiça eletrônico. Por esse meio, inclusive, o curador foi intimado de atos processuais anteriores, mas não questionou o procedimento.

"Essa espécie de subterfúgio não encontra amparo no sistema jurídico processual em vigor, por representar indisfarçável violação ao princípio da boa-fé processual, que impõe aos sujeitos processuais o dever de atuar com lealdade no decorrer do processo", destacou.

Regras da guarda compartilhada

Em seu voto, Nancy Andrighi também afirmou que, de acordo com o princípio do melhor interesse, o incapaz deve ter seus direitos tratados com prioridade pelo Estado, pela sociedade e pela família, tanto na elaboração quanto na aplicação das normas jurídicas.

Nesse sentido, explicou, o compartilhamento foi desenvolvido pela jurisprudência para facilitar o desempenho da curatela, ao atribuí-la simultaneamente a mais de um curador.

Embora a doutrina defenda que, na ausência de detalhamento legal sobre a curatela compartilhada, poderiam ser-lhe aplicadas as normas relativas à guarda compartilhada, a ministra lembrou que a redação do artigo 1.584 do Código Civil prevê que o regime compartilhado deve ser aplicado, obrigatoriamente, para filhos, salvo se um dos genitores declarar ao magistrado que não deseja a guarda do menor.

Ao contrário do que ocorre na guarda compartilhada, Nancy Andrighi apontou que o dispositivo legal que consagra o instituto da curatela compartilhada não impõe, obrigatória e expressamente, a sua adoção.

"Pelo contrário. A redação do novel artigo 1.775-A do CC/2002 é hialina ao estatuir que, na nomeação de curador, o juiz 'poderá' estabelecer curatela compartilhada, não havendo, portanto, peremptoriedade, mas sim facultatividade", ressaltou.

Ao manter o acórdão o TJMT, a relatora ainda lembrou que a curatela compartilhada não chegou a ser formalmente pleiteada pelo curador especial durante a tramitação do processo em primeiro grau, só sendo reivindicada quando o processo já estava em fase de apelação.

O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.

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