Governo não consegue levar dinheiro a quem precisa, apontam senadores
A baixa execução tem dificultado a sobrevivência de pequenas e médias empresas e gerado mais desemprego, segundo apontou o senador Esperidião Amin (PP-SC)
Levantamento do portal Siga Brasil mostra que o governo liberou 42,9% dos recursos anunciados
O governo não está conseguindo fazer com que os recursos liberados para combater a crise econômica provocada pela pandemia do novo coronavírus chegue a quem precisa. A crítica foi feita por deputados e senadores nesta sexta-feira (22), durante audiência pública remota da comissão mista que acompanha as ações para o enfrentamento do coronavírus, que contou com a presença do ministro-chefe da Casa Civil, general Walter Braga Netto.
Segundo levantamento do portal Siga Brasil, dos R$ 255,83 bilhões autorizados pelo Palácio do Planalto por meio de medidas provisórias (MPs) para o combate à pandemia do coronavírus, R$ 109,76 bilhões foram efetivamente pagos. O valor corresponde a 42,9% do total do dinheiro anunciado.
A baixa execução tem dificultado a sobrevivência de pequenas e médias empresas e gerado mais desemprego, segundo apontou o senador Esperidião Amin (PP-SC). Ele citou o caso do Programa Emergencial de Suporte a Empregos (Pese), criado por meio da MP 944/2020 para financiar a folha de pagamentos das empresas com recursos do Tesouro Nacional e dos bancos e assim tentar conter demissões.
A MP entrou em vigor no dia 3 de abril, quase duas semanas depois de o governo decretar estado de calamidade pública em todo o país, mas apenas R$ 1,6 bilhão — de um total programado de R$ 40 bilhões — foi repassado para as empresas. Segundo Amin, "a caixa d'água está cheia, mas a torneia segue pingando".
— De R$ 40 bilhões anunciados na medida provisória do começo de abril, até hoje, aliás até 15 de maio, apenas R$ 1,64 bilhão, dos R$ 40 bilhões disponibilizados, chegou às pequenas e médias empresas. Repito: dos R$ 40 bilhões, que é a dotação, R$ 1,64 bilhão saiu na torneira — criticou Amin, que cobrou explicações do ministro.
Relator da comissão, o deputado Francisco Jr. (PSD-GO) também questionou o ministro sobre a demora na execução do dinheiro.
— O senhor falou que não faltam recursos para a Saúde, contudo percebemos que a dotação autorizada, o que foi empenhado e o que foi de fato executado, tem uma distância muito grande, parece que o governo está tendo dificuldade de gastar — apontou.
Braga Netto admitiu a dificuldade de fazer os recursos chegarem “na ponta”. O ministro atribuiu o problema à atual legislação que, segundo ele, é muito “amarrada” e pediu a ajuda do Congresso para facilitar o processo de execução orçamentária.
— O Congresso pode nos ajudar muito nessa situação para melhorar o gasto, porque um dos focos do [programa] Pró-Brasil é a melhoria dessa legislação que nos amarra, sem abrir brechas para qualquer tipo de irregularidade — disse.
Para o senador Izalci Lucas (PSDB-DF), um dos problemas está em conseguir gestores públicos para assinar a liberação dos recursos. Muitos, segundo o senador, temem atrelar seus nomes a determinados programas por medo de serem posteriormente responsabilizados por eventuais desvios.
— Ninguém mais quer assinar nada, porque hoje, no Brasil, quem faz alguma coisa responde, seja ao TCU, à AGU, à CGU... Todos esses "us" aí realmente acabam inviabilizando encontrarmos gestores no Brasil. Acho que o Executivo precisava levantar esses problemas e apresentar proposta para flexibilizar sem deixar brecha para corrupção e desvio de recursos, mas de fato essa burocracia é prejudicial — avaliou Izalci.
O deputado Cacá Leão (PP-BA) manifestou opinião semelhante ao comentar uma notícia de fevereiro, no auge da epidemia da covid-19 na China, quando o país asiático construiu um hospital em 10 dias. Segundo o parlamentar, o gestor que fizesse isso no Brasil seria preso pela atual legislação.
— Se acontecesse no Brasil, estaria todo mundo preso. Nossa burocracia não permite. As decisões de gestores precisam estar respaldadas — disse, ao defender a MP 966/2020, que relativiza a responsabilidade do gestor público durante a pandemia de coronavírus.
Sobre a MP, ministro da Casa Civil reforçou que decisão judicial deve ser cumprida, mas pediu a colaboração do Congresso em relação ao tema. Na quinta-feira (21), o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu impor limites à medida provisória e apontou que é preciso considerar como erro grosseiro o ato administrativo que ensejar violação do direito à vida, à saúde ou ao meio ambiente equilibrado em razão da inobservância de normas e critérios científicos e técnicos.
— A MP tira a responsabilidade por decisões tomadas pelos agentes públicos durante a pandemia, com exceção de dolo ou culpa. Se houve dolo ou culpa, ele é punido, está escrito ali, então, não existe isso. O governo cumpre a decisão do STF, mas o Parlamento pode nos ajudar — disse Braga Netto.
Retomada
Em resposta a indagações de deputados e de senadores sobre medidas para a retomada do crescimento e a visão do governo sobre o distanciamento social, o ministro enfatizou que o governo está se preparando para o "pós-pandemia", mas que não se fala em “abertura irresponsável”.
— Ninguém está pregando não haver o distanciamento social. O que o governo tem dito é exatamente o excesso. Ao mesmo tempo que nós temos que seguir o protocolo, seguir o distanciamento, isso não significa lockout, em que fica todo mundo em casa e para a economia, pois o país vai quebrar. [...] O que eu posso dizer para o senhor é que nós estamos trabalhando exatamente agora já nos preparando para pós-pandemia, com um olho na pandemia, logicamente.
Por diversas vezes Braga Netto defendeu o programa Pró-Brasil como caminho para a recuperação econômica depois da Covid-19.
— O Pró-Brasil é uma ferramenta, uma ferramenta exatamente para priorizar os projetos existentes no governo, com ênfase em projetos que possam atrair investimentos, particularmente investimentos privados. Eu tenho sido procurado por diversos empresários, diversas entidades nacionais e internacionais que querem colocar dinheiro, mas têm insegurança de aplicar no país — disse.
Golpe
Braga Netto foi questionado pela senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA) sobre a possibilidade de um golpe de Estado por parte do governo. A senadora pediu “uma palavra” do ministro para “trazer tranquilidade”. Em resposta, Braga Netto disse que isso se trata de “teoria conspiratória”.
— Não há nada de golpe de Estado. Eu não sei de onde estão tirando essa ideia - afirmou.
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