Jorge Pontual é o homem-bomba da Globo

As posições do comentarista de Nova York empurram toda a Globo para o desastre de uma cobertura suicida sobre a matança em Gaza, escreve Moisés Mendes

Moisés Mendes
Publicada em 06 de novembro de 2023 às 17:21
Jorge Pontual é o homem-bomba da Globo

Jorge Pontual. Foto: Reprodução (Youtube)

A Globo desqualifica todas as informações que venham de Gaza sobre a matança de crianças, sempre com a mesma desculpa de que os dados não podem ser “verificados de forma independente”.

É o padrão Globo: se a informação vem de Gaza, mesmo que com as imagens de gente morrendo, não há como saber quem e quantos Israel está matando.

E assim se repete o bombardeio diário da Globo, em várias frentes, em todos os seus telejornais, sempre com as versões de Netanyahu, Biden e seus aliados. Jorge Pontual, o comentarista que apoiou ataques a ambulâncias e depois disse estar arrependido, é apenas o complemento radical dessas posições.

A Globo criou as condições para que Pontual fosse o seu homem-bomba. Desde o começo dos ataques, o jornalista defendeu os bombardeios e condenou as propostas de cessar-fogo. E agora, na sexta-feira, implodiu-se ao vivo, com crachá, e tudo ao dizer na GloboNews:

"Israel já tinha avisado que se tivesse gente do Hamas nessas ambulâncias, atacaria. E não deu outra. Se eles estavam na ambulância, infelizmente era isso que Israel tinha que fazer. Alvejar esses seus inimigos. Agora, era uma ambulância, e morreram pessoas que estavam perto e que não eram do Hamas. Isso é um exemplo de como é complicada essa situação".

No sábado, saiu-se com esta numa rede social:

"Minha intenção foi a de dar a versão de Israel. Admito que não fui feliz, pois a muitos pareceu um endosso. Isso seria impossível, ninguém tem informações seguras sobre o que lá se passa. Os palestinos de Gaza vivem uma tragédia, com muitas perdas civis, que lamento profundamente. Peço desculpas por não ter deixado isso claro".

Pontual sabe que homens-bombas não pedem desculpas. Mas usou um truque manjado dessa antiga direita que virou extrema direita inclusive no jornalismo. Até a família Bolsonaro já recorreu à tática dos falsos arrependimentos.

O que ele fez cumpre um roteiro básico. Joga para a galera que apoia o massacre, fideliza audiência, fica bem com as hienas e com a casa que o emprega e depois se desculpa. Mas o bombardeio já foi feito.

Por isso o pedido de desculpas é inútil como tentativa de reparação da própria imagem e dos danos provocados. A inutilidade está na primeira frase: "Minha intenção foi a de dar a versão de Israel”.

Mesmo os mais fiéis ouvintes de Pontual não são tão estúpidos. A versão de Israel sobre as ambulâncias todo mundo conhece. O que o comentarista fez foi dar a sua opinião, que reforça a versão de Israel.

A segunda parte piora a coisa. Pontual diz que errou por não ter informações seguras sobre “o que lá se passa”. Lá, longe dos escritórios da Globo em Nova York, onde ele está, a informação segura é esta: Israel mata crianças.

E o encerramento da nota é um desastre, ao pedir desculpas por “não ter deixado isso claro”. Tudo está claro. Claro demais, em meio aos destroços da cobertura da Globo. Pontual é uma criação da Globo, a sua criatura escolhida para o sacrifício.

Não há nada fora da curva no que ele diz desde o começo dos ataques. Há coerência com o que vem sendo feito diariamente em todos os jornais da corporação.

Pontual sabe que os melhores correspondentes de guerra da Globo em Gaza, que nos contam tudo o que lá se passa, são Shahed al-Banna, de 18 anos, e Rasan Rabe, ambos brasileiros de origem palestina.

Eles falam todos dias do horror, enquanto são impedidos de sair de Gaza pelas represálias de Israel ao governo Lula. Em seus primeiros relatos, há quase um mês, Shahed avisou: “Não podemos mais ficar aqui, os israelenses vão atacar todos os lugares”.

E estão atacando todos os lugares, hospitais, escolas, casas, todos os dias, enquanto Shahed e Rasan não conseguem fugir para o Egito. No mesmo relato, Shahed disse, falando para a Globo em que Pontual trabalha: “Eu não quero morrer”.

Shahed disse que não queria morrer no dia 13 de outubro. No dia seguinte, Pontual defendeu na GloboNews que Israel não poderia parar os bombardeios à Gaza, “porque pedir cessar fogo agora é ajudar o Hamas”.

Pontual pediu que Israel jogasse bombas sobre Gaza, onde Shahed conta o seu drama e dos que estão por perto, fazendo o trabalho que um colega de Pontual não consegue fazer. Shahed trabalha de graça para a Globo sobre o que lá se passa, e Pontual pede que Israel bombardeie Gaza.

Dizer que é cruel é não dizer quase nada. Pontual ajudou a Globo a se implodir na cobertura que afunda a organização no pior pântano da sua história, com o sangue de milhares de crianças.

Pontual não é o cão que foge da coleira, ele dá sentido à cobertura da Globo na sua ação extremada de ativista pró-genocídio. Não há nada fora do controle. Pontual está no controle absoluto da cobertura suicida da Globo sobre a matança em Gaza.

Moisés Mendes

Moisés Mendes é jornalista, autor de “Todos querem ser Mujica” (Editora Diadorim). Foi editor especial e colunista de Zero hora, de Porto Alegre.

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