Magistrada institui boas práticas para atendimento a autistas
Larissa Pinho partiu de uma pesquisa para adotar procedimentos de inclusão em sua vara de atuação
Sensibilizada com a situação das pessoas com deficiência, pontualmente com o transtorno do espectro autista, a juíza Larissa Camargo Pinho, da 1ª Vara Criminal da Comarca de Ariquemes, vem fazendo uma pesquisa em sua unidade com o fim de prestar uma melhor e mais adequada prestação jurisdicional a esse público.
A pesquisa para conhecer e compreender as necessidades das pessoas autistas, de mães/pais atípicos que necessitem dos serviços jurisdicionais da unidade. Iniciada há um mês, foi aplicada entre os réus, testemunhas, advogados, promotores, defensores que de certa forma respondem ou atuam na vara. Os resultados apurados demonstram que 87,8% desse público não tem conhecimento do Manual de Atendimento a pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA), lançado pelo Conselho Nacional de Justiça.
“O desconhecimento desse público sobre a importante ferramenta para preparar a Justiça para o atendimento e o acolhimento de autistas me causou muita preocupação, por isso resolvemos tomar algumas medidas aqui para atender ao principal objetivo do Manual”, explicou a magistrada que é mãe atípica. O filho de 12 anos é autista.
Iniciativas
Entres as iniciativas foi a formação dos servidores(as), realizada pela própria magistrada, puderam conhecer melhor o manual, e sobretudo a legislação voltada à inclusão.
A Lei 13.146/2015, Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência, que garante a atuação da pessoa com deficiência em todo o processo judicial, prevê, no § 1o do art. 79, prevê a capacitação de membros e os servidores (as) que atuam no Poder Judiciário.
Já a Resolução CNJ no 401/2021 dispõe sobre o desenvolvimento de diretrizes de acessibilidade e inclusão de pessoas com deficiência nos órgãos do Poder Judiciário. Há ainda a Portaria CNJ n. 315/2022, que instituiu grupo de trabalho que resultou no Manual.
Outra iniciativa foi a implantação da sala sensorial, um espaço preparado para receber adequadamente crianças, adolescentes e adultos autistas envolvidos ou que tenham alguma ligação com os envolvidos em processos (filhos de advogados, promotores, defensores, testemunhas, partes, etc).
“Sabemos que as mulheres/mães atípicas são muito demandadas em relação aos cuidados com o filho(a) nessa condição e, portanto, a fim de evitar qualquer agravamento de crise, “meltdown” ou “shutdown” por exemplo, durante a sua oitiva em Juízo, preparamos essa sala para acolher esse público”, justificou.
O meltdown é quando a pessoa extravasa seu descontrole por meio de gritos, choro, movimentos corporais, ocasionalmente por comportamentos agressivos. E o shutdown é quando a pessoa “desliga-se” do ambiente, como uma bateria que se apaga e precisa ser recarregada.
Para completar o atendimento humanizado e adequado, outra providência tomada pela equipe da 1ª Vara Criminal de Ariquemes foi o desenvolvimento de mandados de intimação com base em design think e visual law já com pedido de antecipação de eventual necessidade que aquela pessoa com espectro autista possa precisar.
Para a construção dos modelos foram levados em conta algumas premissas, elencadas no manual, como uso de linguagem clara, simples, evitando figura de linguagem; mensagem explícita apontando o quê, quando e como deve ser realizado. Imagens e cores também ajudam a complementar a informação de forma direta.
On-line
Além dos procedimentos presenciais, a magistrada também adota protocolos para audiências on-line como a que ocorreu recentemente na qual uma advogada, diante de uma crise do filho de seis anos, contou com a compreensão de todos os membros com a decisão de suspensão da audiência pela magistrada. “É o que recomenda o manual”, reforçou Larissa Pinho.
Acolhimento
A advogada Ana Caroline Cardoso de Azevedo, mãe de Teodoro, de cinco anos, recebeu com entusiasmo as medidas, pois já enfrentou diversas situações em que não se sentiu acolhida nos órgãos públicos. Ela pontuou que uma mãe atípica precisa recorrer ao atendimento privado de saúde para garantir qualidade de vida ao filho autista, o que implica em mais custos no orçamento. Ao mesmo tempo, precisa abrir mão da carga de trabalho para se dedicar ao acompanhamento em terapias e outras atividades de apoio. “Precisamos de mais dinheiro e temos menos tempo, isso acarreta uma sobrecarga emocional”, explicou.
Para a advogada, as iniciativas implantadas em Ariquemes podem fazer toda a diferença. “Essas práticas brilham nos meus olhos. Sinto-me extremamente acolhida, pois sei que posso contar com a empatia e a compreensão do Judiciário. Poder suspender uma audiência, repetir uma informação porque você não compreendeu no primeiro momento, ou apenas ouvir as necessidades de uma parte são atitudes simples, que geram menos traumas e instauram o respeito e dignidade aos autistas”, defendeu.
Ana Caroline completou ainda que a sala sensorial é muito bem vinda, principalmente em momentos de ansiedade, que ela confessa já ter vivido, com essa rotina com tantas exigências.
Clique aqui para acessar o manual
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