Me Too Brasil pede a derrubada do veto de Bolsonaro à distribuição de absorventes

O movimento enviou ofício ao Congresso Nacional junto a dezenas de entidades

Assessoria
Publicada em 08 de outubro de 2021 às 18:59
Me Too Brasil pede a derrubada do veto de Bolsonaro à distribuição de absorventes

O Me Too Brasil assinou ofício que pede a derrubada do veto do presidente Bolsonaro à distribuição de absorventes a estudantes, pessoas de baixa renda e em condições de vulnerabilidade social prevista no Projeto de Lei (PL) nº 4.968/2019, que institui o Programa de Proteção e Promoção da Saúde Menstrual. Encaminhado ao Congresso Nacional nesta quinta (8), o documento foi assinado por dezenas de instituições, organizações e coletivos que manifestam a impropriedade jurídica do veto.

As entidades reafirmam o interesse público envolvido na aprovação da medida e dizem que é inaceitável que o Brasil não possua medidas públicas para combater a situação de pobreza menstrual "que afasta meninas, mulheres e outras pessoas que menstruam do ambiente escolar e de atividades laborais’.

A Diretora Jurídica do Me Too Brasil, Luciana Terra, destaca que o PL atende o acesso universal à saúde, garantido pela Constituição Federal. "É responsabilidade da União, dos Estados e dos Municípios promover o acesso à saúde e o mínimo existencial básico para uma vida digna para todas as meninas e mulheres. O artigo 5º prevê os direitos fundamentais, dentre eles, os da dignidade, da saúde e da igualdade de todas as meninas e mulheres", disse, lembrando ainda os direitos previstos no Estatuto da Criança e do Adolescente e a signatura do país em tratados internacionais de combate a desigualdade, nos quais se incluem os direitos sexuais das mulheres.

Terra destaca que o argumento orçamentário de Bolsonaro não se justifica, pois o programa atende itens de primeira necessidade. "Com o veto, o presidente vai contra os direitos humanos das meninas e mulheres", diz.

O ofício afirma que as pessoas mais atingidas com a falta desses itens básicos são as meninas negras, que "sofrem com os impactos cumulativos da ausência das demais políticas públicas, políticas essas que poderiam impactar positivamente a saúde menstrual, como o acesso à água, a saneamento básico, à coleta de lixo e à energia elétrica". O ofício destaca ainda que o problema dificulta, ainda, o acesso à educação.

As beneficiárias do programa seriam, dentre as mulheres e demais pessoas que menstruam, as estudantes de baixa renda matriculadas em escolas da rede pública de ensino; as pessoas em situação de rua; em situação de vulnerabilidade social extrema; e apreendidas e presidiárias, recolhidas em unidades do sistema penal ou internadas em unidades para cumprimento de medida socioeducativa. O PL ainda previu a inclusão dos absorventes higiênicos como item essencial das cestas básicas, entregues no âmbito do Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, SISAN.

A proposição legislativa foi recomendada pelo Conselho Nacional dos Direitos Humanos (Recomendação CNDH nº 21/2020) com o objetivo de criar um marco legal para superar a pobreza menstrual. Aprovado em agosto pela Câmara dos Deputados e, em setembro, pelo Senado Federal, o programa garante a "oferta gratuita de absorventes higiênicos femininos e outros cuidados básicos de saúde menstrual", trecho vetado pelo presidente.

LEIA O OFÍCIO:

Aos Excelentíssimos Senhores Senadores e Senhoras Senadoras da República Aos Excelentíssimos Senhores Deputados e Senhoras Deputadas Federais Ref. Veto presidencial ao Projeto de Lei nº 4.968/2019

As instituições, organizações e coletivos abaixo-assinados vêm, por meio do presente ofício, manifestar a impropriedade jurídica do veto presidencial ao Projeto de Lei (PL) nº 4.968/2019.

Trata-se de proposição legislativa de iniciativa parlamentar, cuja aprovação foi recomendada ao Presidente da República e ao Congresso Nacional pelo Conselho Nacional dos Direitos Humanos (Recomendação CNDH nº 21/2020). O objetivo era a criação de um "marco legal para superar a pobreza menstrual".

A aprovação do PL na Câmara dos Deputados se deu em agosto de 2021, com a criação do Programa de Proteção e Promoção da Saúde Menstrual. Ato contínuo, em setembro, o projeto foi aprovado no Senado Federal, para garantir a "oferta gratuita de absorventes higiênicos femininos e outros cuidados básicos de saúde menstrual".

As beneficiárias do Programa seriam, assim, dentre as mulheres e demais pessoas que menstruam, as estudantes de baixa renda matriculadas em escolas da rede pública de ensino; as pessoas em situação de rua; em situação de vulnerabilidade social extrema; e apreendidas e presidiárias, recolhidas em unidades do sistema penal ou internadas em unidades para cumprimento de medida socioeducativa. O PL ainda previu a inclusão dos absorventes higiênicos como item essencial das cestas básicas, entregues no âmbito do Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, SISAN.

Cabe ressaltar que este ofício enfatiza que a superação da pobreza menstrual se efetivará somente mediante o reconhecimento de todas as pessoas brasileiras que menstruam como possíveis beneficiárias do PL em questão, sendo estas mulheres, meninas, homens trans e demais pessoas com útero.

Neste grupo diretamente atingido pela precariedade das condições menstruais, o maior percentual é composto por meninas negras, sendo essas as que mais sofrem com os impactos acumulativos da ausência das demais políticas públicas, políticas essas que poderiam impactar positivamente a saúde menstrual, como o acesso à água, a saneamento básico, à coleta de lixo e à energia elétrica. Este cenário torna o problema ainda mais agudo ao dificultar o acesso à educação para a população negra, além de repercutir em uma imobilidade social ainda mais exacerbada para um grupo já fortemente oprimido, que vivencia, de forma histórica, condições sanitárias que intensifica, ainda mais, o estado de vulnerabilidade social e economicamente. A pobreza menstrual também é, de fato, uma questão racial.

O acesso a itens para atender às necessidades básicas de saúde é essencial para dignidade humana. A ausência de políticas públicas que assegurem a distribuição gratuita desses bens a mulheres e pessoas que menstruam em situação de vulnerabilidade social e econômica ofende valores constitucionais básicos: a integridade física é colocada em risco, na medida em que se valem de substitutos inadequados para a contenção do fluxo menstrual, como miolo de pão, jornal e tecidos.

O acesso à educação é igualmente comprometido: quatro entre dez estudantes deixam de frequentar a escola em razão da falta de acesso a produtos de higiene menstrual. Como resultado, perdem, por ano, em média, 45 dias de aula. De acordo com o estudo "Pobreza Menstrual no Brasil: desigualdade e violações de direitos", divulgado pelo Unicef e pelo UNFPA, mais de 4 milhões de estudantes frequentam colégios com estrutura deficiente de higiene, como banheiros sem condições de uso, sem pias ou lavatórios, papel higiênico e sabão. Desse total, quase 200 mil meninas e mulheres não contam com nenhum item de higiene básica no ambiente escolar e 713 mil não têm acesso a nenhum banheiro (com chuveiro e sanitário) em suas casas.

Trata-se de um produto cujo consumo é recorrente e obrigatório, diante da falta de substitutos capazes de garantir efeitos similares, para a quase totalidade das mulheres e demais pessoas que menstruam por um longo período de sua vida (em média, 40 anos) em razão de uma característica biológica inafastável. A distribuição gratuita desses bens para meninas, mulheres, homens trans e demais pessoas que menstruam em situação de vulnerabilidade social e econômica e o reconhecimento de sua essencialidade preconiza a isonomia, na dimensão da igualdade de gênero, nos termos do artigo 5º, inciso I da Constituição de 1988, além de colocar em prática mandamentos constitucionais relacionados com o direito à saúde e à educação.

Diante disso tudo, fica claro que as razões apresentadas pelo Presidente da República para o veto ao PL nº 4.968/2019 não se sustentam e sua derrubada, pelo Congresso Nacional, é medida que se impõe.

O interesse público envolvido na aprovação da medida é manifesto. É inaceitável que o Brasil não possua uma medida pública sequer para combater a situação de pobreza menstrual que afasta meninas, mulheres e outras pessoas que menstruam do ambiente escolar e de atividades laborais. A previsão de distribuição gratuita de absorventes por instituições de ensino não conflita com a autonomia de tais estabelecimentos, pois se trata de medida de saúde pública e preservação da dignidade da pessoa humana, que prefere à eventual interesse da administração pública em particular.

Ademais, a alegação de que a criação do Programa em referência conflita com a Lei de Responsabilidade Fiscal - a Lei Complementar nº 101/2000, é absolutamente descabida. Os artigos 2º, § 2º e 6º do PL nº 4.968/2019 preveem, de modo expresso, as fontes de custeio que farão frente às despesas públicas decorrentes da criação do Programa. Além disso, o relatório apresentado pela Comissão de Defesa dos Direitos da Mulheres da Câmara dos Deputados apresentou a estimativa do impacto orçamentário financeiro da medida, em plena observância dos dispositivos da Lei de Responsabilidade Fiscal.

Diante do exposto, faz-se necessária a derrubada do veto apresentado pelo Presidente da República, uma vez que dissonante dos valores constitucionais e contrário ao interesse público.

Brasília, 07 de outubro de 2021
 

Assinam o documento:
 

Oxfam Brasil
 

Instituto Ethos
 

Grupo Mulheres do Brasil
 

Instituto Para a Defesa dos Direitos
 

Humanos
 

Me Too Brasil
 

Visão Mundial
 

Women in Tax Brazil
 

Coletivo aBertha
 

Ladies of Liberty Alliance no Brasil
 

Instituto Liberta
 

Elas Discutem
 

Clínica de Direitos Humanos da
 

Amazônia
 

Movimento Acredito
 

Plan International Brasil
 

Programa Conexões de Saberes da
 

UFMG
 

Clínica de Direitos Humanos da UFMG
 

Programa Polos de Cidadania da UFMG
 

Observatório para a Qualidade da Lei da
 

UFMG
 

Elas no Poder
 

Projeto Deixa Fluir
 

Projeto Dignidade Menstrual
 

Elas pedem vista
 

Instituto Serenas
 

Absorvente das Manas
 

Instituto de Defesa do Direito de Defesa
 

Centro de Direitos Humanos de
 

Petrópolis
 

Vozes da Educação
 

Coletivo Feminista Várias Marias
 

Frente pelo Avanço dos Direitos
 

Políticos das Mulheres
 

Grupo Tributação e Gênero do Núcleo
 

de Direito Tributário do Mestrado
 

Profissional da FGV Direito SP
 

Grupo de Pesquisa em Direito, Gênero e
 

Identidade da FGV Direito SP
 

Grupo de Pesquisa Direito, Economia e
 

Política da UFPE
 

Grupo de Pesquisa Tributec
 

Grupo de Pesquisa Direito e Feminismos
 

da UFRN
 

Núcleo Tributação, Democracia e
 

Desenvolvimento da Universidade
 

Federal de Lavras
 

Girl Up Brasil
 

Vote Nelas
 

Vote Nelas Mauá
 

Vote Nelas SP
 

Vamos Juntas
 

Projeto Luas
 

Associação Brasileira de Direito
 

Tributário
 

Grupo de Estudos Tributários da UFPR
 

Pastoral Carcerária Nacional
 

Agenda Nacional pelo
 

Desencarceramento
 

Rede Nacional de Feministas
 

Antiproibicionistas
 

Associação de Amigos e Familiares de
 

Pessoas em Privação de Liberdade
 

Rede de Comunidades e Movimentos
 

Contra a Violência
 

Coletivo Sobre Elas
 

Instituto Arueras
 

Rede Nacional de Mães e Familiares
 

Vítimas de Terrorismo de Estado
 

GAJOP - Gabinete Assessoria Jurídica
 

Organizações Populares
 

Instituto Pernambucano de Estudos
 

Tributários
 

Processualistas
 

Odara - Instituto da Mulher Negra
 

FOPIR - Fórum Permanente pela
 

Igualdade Racial
 

Comissão de Direito Tributário da
 

OAB/SP
 

Comissão de Direito Penal da OAB/SP
 

Comissão de Direito Tributário da
 

OAB/MG
 

Comissão de Direito Tributário da
 

OAB/CE
 

Comissão da Mulher Advogada da
 

OAB/CE
 

Comissão da Mulher Advogada da
 

OAB/DF
 

Caixa de Assistência dos Advogados do
 

Ceará
 

Centro Feminista de Estudos e
 

Assessoria
 

Ordem dos Advogados do Brasil -
 

Seccional de Pernambuco

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