O momento político e a inversão de valores

"A extrema direita defende a inversão de valores, trocando correção por perdão e impunidade. Assim, bandidos viram heróis e infratores, dignos"

Fonte: Ronaldo Lima Lins - Publicada em 17 de fevereiro de 2025 às 14:15

O momento político e a inversão de valores

Jair Bolsonaro (Foto: REUTERS/Adriano Machado)

Cada momento na existência possui dinâmicas e características próprias. Houve ocasiões em que privilegiamos a honestidade, a transformação das estruturas, a manutenção do status quo, etc. O atual, por incrível que pareça, em formulações muito ligadas à extrema direita, defende acintosa e espertamente a inversão dos valores. Isto significa que o que antes definíamos de um jeito, por exemplo: a correção nos costumes – passa-se a bater na tecla, despudoradamente, do perdão, o que, com frequência, implica em impunidade. Dentro de semelhante perspectiva, bandidos viram heróis e infratores surgem como representantes da dignidade, ainda que tenham cumprido biografias de fazer corar o cidadão comum.

Na busca por garantias que nos protegessem contra oportunistas, e por iniciativa popular, conseguiu-se o que se passou a denominar de “Ficha Limpa” como exigência para candidatos a cargos eletivos. Quem não possuísse uma folha corrida à altura, via-se impedido, por decisão judicial, de acampar, a partir da boa vontade dos eleitores, nas áreas da administração pública. Trata-se de medida saneadora, compreendendo-se que nem sempre os que se apresentam nas campanhas, com maior ou menor adesão dos votantes, proporcionarão bons resultados na qualidade dos serviços. Uma ex-jogadora de vôlei, com acesso à televisão, argumentou contra a citada lei, tomando o exemplo dos Estados Unidos. Lá, Trump pôde se eleger; aqui, entre nós, o TSE o barraria. Um argumento que, como tem ocorrido em nosso momento político, trabalha com a inversão dos valores. O certo, afirma ela, sem se envergonhar, está errado; o errado, que os infratores permaneçam livres, está certo.

Só que não é apenas no capítulo da “Ficha Limpa” que a tendência se manifesta. Jair Bolsonaro sequer enrubesce quando apoia projetos de anistia. Quer por que quer que o novo documento legal sirva para absolvê-lo. Adeptos no Parlamento, também não enrubescem nas negativas da história recente. Nem Hugo Motta, empossado na posição de Presidente da Câmara, se intimida em louvar os golpistas do 8 de janeiro, transformando-os num grupo de vândalos integrado por senhorinhas, todos, é claro, sedentos por indultos para voltar a casa e, amanhã ou depois, reincidir nos crimes. Eles depredaram patrimônios da cultura nacional sem piedade, como se fossem pedaços odiados de nossa constituição. Merecem complacência? Óbvio que não, a não ser se, numa completa troca de valores, nos convencermos de que, como diria Glauber Rocha em Deus e o diabo na terra do sol, o Sertão tenha virado mar e o mar virando Sertão. Nesse pedaço de realidade que habitamos, não.

O modismo da inversão de valores parece inocente, mas não é. Quando se aproxima dos princípios da cidadania, arrisca provocar tragédias. É o mal que acomete os criminosos tão habituados a roubar e matar que já não distinguem quando e onde parar. E, se na existência, é assim, na política não se foge à regra. Positivamente, não. Viva a Lei da Ficha Limpa! E, novamente, abaixo a anistia! Que paguem por suas ações, se possível cumprindo pena nos presídios! O Brasil, como um todo, se sentirá melhor e mais seguro.

Ronaldo Lima Lins

Escritor e professor emérito da Faculdade de Letras da UFRJ

247 artigos

O momento político e a inversão de valores

"A extrema direita defende a inversão de valores, trocando correção por perdão e impunidade. Assim, bandidos viram heróis e infratores, dignos"

Ronaldo Lima Lins
Publicada em 17 de fevereiro de 2025 às 14:15
O momento político e a inversão de valores

Jair Bolsonaro (Foto: REUTERS/Adriano Machado)

Cada momento na existência possui dinâmicas e características próprias. Houve ocasiões em que privilegiamos a honestidade, a transformação das estruturas, a manutenção do status quo, etc. O atual, por incrível que pareça, em formulações muito ligadas à extrema direita, defende acintosa e espertamente a inversão dos valores. Isto significa que o que antes definíamos de um jeito, por exemplo: a correção nos costumes – passa-se a bater na tecla, despudoradamente, do perdão, o que, com frequência, implica em impunidade. Dentro de semelhante perspectiva, bandidos viram heróis e infratores surgem como representantes da dignidade, ainda que tenham cumprido biografias de fazer corar o cidadão comum.

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Na busca por garantias que nos protegessem contra oportunistas, e por iniciativa popular, conseguiu-se o que se passou a denominar de “Ficha Limpa” como exigência para candidatos a cargos eletivos. Quem não possuísse uma folha corrida à altura, via-se impedido, por decisão judicial, de acampar, a partir da boa vontade dos eleitores, nas áreas da administração pública. Trata-se de medida saneadora, compreendendo-se que nem sempre os que se apresentam nas campanhas, com maior ou menor adesão dos votantes, proporcionarão bons resultados na qualidade dos serviços. Uma ex-jogadora de vôlei, com acesso à televisão, argumentou contra a citada lei, tomando o exemplo dos Estados Unidos. Lá, Trump pôde se eleger; aqui, entre nós, o TSE o barraria. Um argumento que, como tem ocorrido em nosso momento político, trabalha com a inversão dos valores. O certo, afirma ela, sem se envergonhar, está errado; o errado, que os infratores permaneçam livres, está certo.

Só que não é apenas no capítulo da “Ficha Limpa” que a tendência se manifesta. Jair Bolsonaro sequer enrubesce quando apoia projetos de anistia. Quer por que quer que o novo documento legal sirva para absolvê-lo. Adeptos no Parlamento, também não enrubescem nas negativas da história recente. Nem Hugo Motta, empossado na posição de Presidente da Câmara, se intimida em louvar os golpistas do 8 de janeiro, transformando-os num grupo de vândalos integrado por senhorinhas, todos, é claro, sedentos por indultos para voltar a casa e, amanhã ou depois, reincidir nos crimes. Eles depredaram patrimônios da cultura nacional sem piedade, como se fossem pedaços odiados de nossa constituição. Merecem complacência? Óbvio que não, a não ser se, numa completa troca de valores, nos convencermos de que, como diria Glauber Rocha em Deus e o diabo na terra do sol, o Sertão tenha virado mar e o mar virando Sertão. Nesse pedaço de realidade que habitamos, não.

O modismo da inversão de valores parece inocente, mas não é. Quando se aproxima dos princípios da cidadania, arrisca provocar tragédias. É o mal que acomete os criminosos tão habituados a roubar e matar que já não distinguem quando e onde parar. E, se na existência, é assim, na política não se foge à regra. Positivamente, não. Viva a Lei da Ficha Limpa! E, novamente, abaixo a anistia! Que paguem por suas ações, se possível cumprindo pena nos presídios! O Brasil, como um todo, se sentirá melhor e mais seguro.

Ronaldo Lima Lins

Escritor e professor emérito da Faculdade de Letras da UFRJ

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Comentários

  • 1
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    Miguel Alvarez 17/02/2025

    Bolsonaro deveria passar uns 15 anos no xilindró. Cometeu um grande número de crimes e ainda segue endeusado por muitos idiotas obtusos. Cana pro boso!

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