O recado indecoroso e ameaçador de Flávio Bolsonaro para Alexandre de Moraes
O senador propõe que todos se acovardem diante do poder que a família e a extrema direita ainda pensam ter. Essa é a pacificação, escreve Moisés Mendes
Alexandre de Moraes, Flávio, Jair e Eduardo Bolsonaro (Foto: Carlos Moura/SCO/STF | Roberto Jayme/Ascom/TSE)
O choro de Bolsonaro diante dos militares levou o filho Flávio a entregar armas como um derrotado desastrado e prepotente.
Flávio mandou dizer a patriotas e manés ainda nas estradas e diante dos quartéis que a ideia do golpe nunca existiu. E aproveitou para fazer uma proposta.
Sugeriu que Alexandre de Moraes arquive os inquéritos contra ele, o pai dele, os irmãos, os milicianos, os empresários e os amigos golpistas.
Fez a sugestão com a candura de uma mãe que pede clemência a um juiz por ter furtado um pacote de massa miojo para enganar a fome de quatro filhos.
Foi isso o que disse Flávio em entrevista a Paulo Cappelli, do Metrópoles:
“A pacificação do país passa pelo arquivamento dos inquéritos que estão com o Alexandre de Moraes no STF. A defesa da democracia passa pelo arquivamento desses inquéritos. Se Moraes continuar nessa toada, o próximo Bolsonaro será o Lula. Amanhã, será a vez da esquerda”.
Nessa toada, Moraes toca os inquéritos mais importantes da República, porque juntam os principais desmandos da extrema direita desde a eleição de 2018.
As investigações tratam das milícias digitais, das fake news, dos atos golpistas em Brasília, do que chamam, no conjunto, de gabinete do ódio, dos tios do zap que se organizaram para defender o golpe, dos manés que ocuparam estradas e ruas depois da eleição e dos financiadores das arruaças.
Há no recado do senador uma advertência: Moraes pode fazer com Lula amanhã o que faz hoje contra Bolsonaro.
É uma tese que circula inclusive entre carnavalescos de esquerda do bloco do eu-estou-avisando.
Há na fala de Flávio uma ofensa grave ao ministro que relata os crimes da família e dos agregados dos derrotados.
Há também uma aposta no pano quente e nos imbróglios da burocracia judiciária, diante da possibilidade de transferência de parte dos casos para a Justiça Comum.
E aí tudo pode acontecer e não acontecer, ainda mais agora que as próprias autoridades finalmente reconhecem que o bolsonarismo expôs muitos xerifes sem brio. E brio não é mercadoria barata.
Há ainda no recado de Flávio, mesmo que não explicitado, o alerta que o fascismo dissemina com insistência sobre a granada que espera Moraes no Senado.
A forte bancada de extrema direita manterá o ministro e seus colegas sob ameaça de impeachment, mesmo que pareça improvável.
O Senado bolsonarista poderia puxar o pino da granada quando quisesse.
Nessas circunstâncias, a ideia da pacificação é um truque raso, mesmo que seja da natureza da política e de seus apêndices fazer arranjos sujos e limpos, alguns até hoje mantidos sob os pântanos.
Foi assim na anistia de 1979. Todos estavam cansados, e os exilados queriam voltar. Não havia o que fazer.
Aceitaram o que havia sido imposto. Os exilados voltaram, os dois lados seguiram a vida, mas em algum momento se daria um jeito de pegar os criminosos.
Alguns tentaram fazer o que argentinos, no melhor exemplo, e chilenos e uruguaios fizeram.
Tentaram revisar a anistia, para pelo menos processar os torturadores. Faltou lastro político em todas as esferas, do povo às elites que poderiam transmitir alguma bravura e confiança.
E foi assim que o Supremo decidiu: não mexam com isso daí. Não mexeram, apesar da Comissão da Verdade e de valentes mobilizados pela reparação de crimes de lesa humanidade.
E assim o país elegeu um presidente que elogia torturadores. Foi essa a pacificação à brasileira.
Bolsonaro é produto desse esforço pacificador, com o Supremo e com tudo, patrocinado por, terei de repetir, autoridades sem brio.
É o que Flávio propõe que se repita, mas sem que exista reciprocidade, como se pretendeu que existisse na anistia de 1979.
O que o Brasil ganha com a anistia para as quadrilhas investigadas por Alexandre de Moraes? Nada.
A pacificação proposta é o que é. Uma tentativa de passada de mão na bunda. É um acinte do porta-voz dos investigados, incluindo sonegadores que patrocinam o golpe.
Flávio pede que instituições e autoridades façam fila para que ele toque suas partes, enquanto o pai e os filhos dão gargalhadas.
O senador propõe que todos se acovardem diante do poder que a família e a extrema direita ainda pensam ter.
Essa é a pacificação. Um gesto em que Flávio é apenas o emissário do pai. A atitude do empreendedor da família é o que há muito tempo chamavam de desplante.
Promotores, procuradores, juízes, desembargadores e ministros das altas Cortes sabem que é desfaçatez mesmo.
Moisés Mendes
Moisés Mendes é jornalista, autor de “Todos querem ser Mujica” (Editora Diadorim). Foi editor especial e colunista de Zero hora, de Porto Alegre.
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