Uso de armas em escolas divide opiniões de senadores e especialistas

Um dos debatedores foi o diretor de Estratégia Política do movimento Todos pela Educação, João Marcelo Borges.

Agência Senado
Publicada em 14 de maio de 2019 às 16:20
Uso de armas em escolas divide opiniões de senadores e especialistas

Em audiência pública sobre a segurança nas escolas, os senadores da Comissão de Educação, Cultura e Esporte (CE) ouviram especialistas e tiveram acesso a estudos que apontam o efeito da violência na aprendizagem de alunos do ensino fundamental e médio. A audiência foi pedida pelo senador Confúcio Moura (MDB-RO) na tentativa de ouvir soluções para a violência que culmina em ações como o massacre de Suzano (SP), na qual dois jovens entraram na escola estadual Raul Brasil, mataram sete pessoas e feriram dezenas em 13 de março.

O senador Marcos do Val (Cidadania-ES) usou o massacre de Columbine, nos Estados Unidos, e a política de repressão daquele país para neutralizar franco atiradores em escolas. Ele lançou à mesa o questionamento sobre a possibilidade de armar professores e funcionários, como já previsto nas leis da Flórida e no Texas, para que neutralizem (ou matem) os assassinos como forma de prevenir novos ataques.

Um dos debatedores foi o diretor de Estratégia Política do movimento Todos pela Educação, João Marcelo Borges. Ele admitiu ter dúvidas sobre armar professores, como tem acontecido nos EUA, e disse que esse debate precisa ser aprofundado e trazido para a realidade brasileira, onde muitos espaços têm policiamento armado, mas ainda assim registram nível alto de violência.

— É um cenário muito preocupante ter uma escola com boa parte das pessoas armadas. É provado que quanto mais armas, mais violência, mas isso também não significa dizer que armar pessoas capacitadas para dar uma resposta rápida em certas situações seja ruim — avaliou.

Durante a audiência, o senador Welington Fagundes (PR-MT) contou aos senadores que apresentou um projeto que trata de segurança escolar com medidas de segurança para alunos e professores. O texto, segundo ele, sugere controle eletrônico de entrada e saída das escolas, instrução à comunidade escolar de procedimentos de segurança no caso de uma ocorrência grave como a de Suzano, com simulações de emergência (para que todos saibam o que fazer e onde ir).

Violência

Os debatedores demonstraram como o medo de agressão e a cultura de preconceitos molda o sistema ao ponto de ser um dos maiores receios dos estudantes, muitas vezes superando a preocupação com a qualidade do ensino. Borges comentou que, durante a discussão da Medida Provisória que estabeleceu o Novo Ensino Médio, a segurança — não a qualidade do ensino — apareceu como o principal ponto numa pesquisa conduzida com 1.551 jovens de escolas das regiões Nordeste, Centro-Oeste e Sul.

— A segurança não deveria sequer ser preocupação do aluno de 15 a 17 anos que vai à escola. Mas, principalmente nas mais pobres, ela aparece como o fator mais relevante — afirmou.

Borges comentou que violência como a ocorrida em Suzano vai se construindo num ambiente em que as doenças mentais não são tratadas:

— Enxergamos, como em Suzano, a vítima imediata porque foi agredida ou faleceu. No entanto, há muito mais vítimas. O Brasil ainda não está preparado para gerar soluções de acompanhamento dos agravos de saúde mental derivado de situações de estresse crônico e violência nas escolas.

Ele citou que após um episódio traumático, como o rompimento de uma barragem, ou o falecimento de um colega, pelo menos 7% das crianças desenvolvem algum tipo de agravo mental ou transtorno pós-traumático. Entre 15% e 36% vivem a síndrome de estresse pós-traumático, que, se não tratada, leva a extremos como suicídio e assassinatos.

— A violência não é só o que a gente vê, mas o que não vemos. Estudos do Instituto do Cérebro, na PUC-RS, mostram que a violência gera estresse e problemas de funções executivas no cérebro, impedindo a capacidade de o aluno aprender — acrescentou.

Auxílio na escola

Representante do Conselho Federal de Psicologia, a professora Marilene Proença Rebello, que é também diretora do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (USP), disse que o Congresso tem em mãos um importante projeto para mudar a cultura de violência nas escolas: o PLC 60/2007 (Projeto de Lei 3688/00, na Câmara) já aprovado pelo Senado na forma de um substitutivo do senador Flávio Arns (Rede-PR), que presidiu a audiência pública. A proposta garante atendimento por profissionais de psicologia e serviço social aos alunos das escolas públicas de educação básica.

— Infelizmente no Brasil é preciso acontecer uma tragédia para que políticas sejam feitas. Há 13 anos estamos tentando a aprovação deste projeto — desabafou.

Na pesquisa Violência e Preconceitos na Escola, realizada pelo Conselho Federal de Psicologia entre 2013 e 2015, os alunos denunciam a ausência de diálogo com diretores e coordenadores pedagógicos e uma cultura de violência que se manifesta não apenas em agressões físicas, mas em xingamentos e bullying. Marilene defendeu, entre outros pontos, a substituição do discurso repressivo pela escuta e diálogo e o fortalecimento da cooperação da comunidade escolar.

Ela contou que professores se sentem impotentes e despreparados para enfrentar a violência, os pais vivenciam o estresse de ver seus filhos batendo, apanhando, sofrendo e praticando preconceito de orientação sexual, religioso, racial, entre outros. E os alunos apontam preconceitos sobre aparência física, peso e uso de óculos, reclamam de racismo, homofobia, preconceitos pela classe social, ou contra novatos e alunas grávidas, por exemplo.

Redução da violência

Na tentativa de mostrar soluções, Leonardo Pedreira, coordenador-geral de Educação Ambiental e Temas Transversais da Educação Básica, trouxe as diretrizes da Organização Mundial de Saúde (OMS) para programas de redução da violência nas escolas.

São elas: desenvolver as habilidades socioemocionais dos estudantes e o conhecimento sobre comportamento seguro; apoiar as famílias e a comunidade local; mudar normas sociais e fomentar relações que promovam a igualdade; e formar professores que façam melhor a gestão de conflitos e dos alunos, promovendo interações positivas.

Pedreira comentou que duas das dez competências gerais descritas na Base Nacional Comum Curricular — que preconiza combate à violência como parte da aprendizagem — são voltadas para ao desenvolvimento de habilidades socioemocionais.

— Se a gente forma no aluno a competência para que ele cuide da sua saúde emocional e seja um cidadão com empatia pelos outros, estamos trabalhando dentro da raiz da violência — explicou.

Debate

Durante o debate, o senador Confúcio Moura apoiou pequenas reformas no ambiente escolar que tragam melhoria na convivência dos alunos. Nelsinho Trad (PSD-MS) também defendeu programas que melhoram o ambiente escolar e inserem novamente na escola as crianças e os jovens que abandonam os estudos —experiência que, segundo ele, foi muito positiva quando ele conduziu a prefeitura de Campo Grande (MS).

A senadora Renilde Bulhões (Pros-AL) contou sua experiência como professora de 5ª a 8ª séries e disse que é preciso investir no preparo dos professores tanto quanto na capacidade de ele se relacionar com os alunos. Para ela, muito pode ser evitado se a relação dos estudantes com os professores for positiva.

Styvenson Valentim (Pode-RN) contou que o contexto social e as complicações decorrentes de relações familiares conturbadas também refletem na violência escolar.

— Quando a escola for boa para o aluno, tratá-lo, educá-lo, der disciplina, tiver lanche, ele vai querer estar lá.

Styvenson sugeriu que os especialistas em educação recorram aos programas de meditação implementados nas escolas da Índia, segundo ele, bem-sucedidos.

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