Acordo de Guedes com a China é factoide contra o Mercosul
"Quando Paulo Guedes anuncia uma negociação bilateral com a China, está criando pretextos para a próxima crise do Mercosul, marcada para logo depois da posse de Alberto Fernandez na presidência da Argentina", escreve a colunista Tereza Cruvinel
Paulo Guedes (Foto: José Cruz/Agência Brasil)
Paulo Guedes sabe que o Brasil, isoladamente, não pode fechar acordo de livre comércio com a China nem com país algum. Desde o ano 2000 começou a vigorar a cláusula de consenso, pela qual só o bloco faz acordos regionais, e por consenso entre os parceiros. Quando ele anuncia uma negociação bilateral com a China, está criando pretextos para a próxima crise do Mercosul, marcada para logo depois da posse de Alberto Fernandez na presidência da Argentina.
Com a vitória da oposição no maior vizinho, estão praticamente suspensas as tensas negociações sobre a redução da TEC, a Tarifa Externa Comum, que Guedes gostaria de reduzir significativamente, num processo de abertura escancarada e sem precedentes da economia brasileira (e dos parceiros). A Argentina, mais protecionista historicamente, já resistia no governo de Macri. Sob Fernandes, voltará o Brasil a falar de rompimento com o Mercosul ou de suspensão da Argentina, pretensão que carece hoje de qualquer base, segundo o Tratado de Assunção e protocolos posteriores.
Um acordo de livre comércio com a China, ainda que não colidisse com o Mercosul, seria de todo modo nefasto para o Brasil, que só exporta commodities para os chineses, e sofreria uma invasão de produtos industriais avassaladora. Mas Guedes vai ficando abanando esta bandeira para criar problemas com o Mercosul, que ele detesta e não esconde. O governo Bolsonaro soltou fogos para o acordo Mercosul-União Europeia porque naquele momento precisava de um fato positivo na frente externa, onde o desgaste já era grande (mas não ainda monumental como agora) e ainda queria dar uma mãozinha ao parceiro Macri. Em seguida, destratou o chanceler francês e teve sua briga com o presidente Macron, como quem diz que não está nem aí para o acordo, ainda não homologado pelos parlamentos dos dois blocos.
No fundo, eles não querem acordo algum que não seja com os Estados Unidos. Muito menos este com a China, em plena guerra comercial entre os dois gigantes. A disposição pragmática, de “dançar com todos”, como disse o ministro, está longe ainda de ser posta em prática. O que ainda resta de diversidade comercial é legado de Lula, que de fato dançou com todos e turbinou as exportações. Pegou o boom das commodities, é verdade, mas se não fosse um “bom mascate”, como gostava de se definir, não teria tido êxito. Seus governos e o de Dilma deixaram as reservas de US$ 360 bilhões que garantem a estabilidade brasileira diante das trepidações externas.
Aguardemos pois, os chiliques que virão contra o Mercosul.
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