Ameaça nazista no Brasil é para ser levada a sério

"É preciso levar a sério o debate não só sobre a proliferação de células, mas acerca de suas referências e fontes de inspiração política e ideológica", diz Bepe

Bepe Damasco
Publicada em 10 de abril de 2023 às 16:00
Ameaça nazista no Brasil é para ser levada a sério

Não tenho a pretensão de fazer aqui uma reflexão acadêmica sobre ideologias totalitárias. Isso fica para os historiadores, cientistas políticos e demais pesquisadores do assunto.

Contudo, com base na realidade brasileira e de vários outros países, é preciso levar a sério o debate não só sobre a proliferação de células neonazistas no Brasil, mas também acerca de suas referências e fontes de inspiração política e ideológica.

Esta semana, em meio à repulsa e à comoção pelo bárbaro assassinato de crianças a machadadas em Blumenau (SC), o ministro Flávio Dino, agindo acertadamente, determinou que a Polícia Federal abra inquérito para investigar o crescimento do nazismo no Brasil.

O programa Fantástico, da Rede Globo, levou ao ar há cerca de dois meses uma reportagem de fôlego sobre as organizações nazistas existentes no país, detectando sua multiplicação nos últimos anos, especialmente na Região Sul.

O governo Bolsonaro, com sua apologia ao racismo, à misoginia, à violência e à intolerância, certamente ofereceu combustível para que os propagadores do ódio como método de ação política saíssem do esgoto ao qual estavam confinados.

Sentimentos negativos incrustados na alma de pessoas ressentidas, que vão de frustrações acumuladas ao apego a toda sorte de preconceitos, constituem-se em terreno fértil para a expansão de doutrinas totalitárias, excludentes e violentas.

Isso explica uma parte da adesão ao bolsonarismo.

Os graves déficits de informação política, de convicção democrática e de consciência cidadã, que expõem um sistema educacional precário, respondem por outro contingente de adeptos da extrema-direita brasileira.

Também teve papel importante para que chegássemos à situação atual a campanha do cartel da mídia criminalizando a política e apoiando resolutamente o golpe de estado de 2016 e a caçada implacável que resultou na prisão ilegal de Lula, abrindo caminho para a ascensão do fascismo.

O fundamentalismo religioso, que através de pastores e bispos evangélicos neopentecostais, em sua maioria, exploram a boa fé do povo e lhe incute os piores valores também é uma face importante do fenômeno.

Com tudo isso considerado, o resultado é que expressiva parcela da legião de seguidores de Bolsonaro, de forma consciente ou não, é formada por neonazistas, pois comungam dos princípios característicos dessa ideologia, tais como aversão à ciência e às artes, rejeição às manifestações culturais, ódio devotado a pobres, negros, mulheres e comunidade LGBTQIA+.

Semana passada o bravo deputado Andre Janones defendeu em suas redes que o bolsonarismo é o nazismo nativo e como tal deve ser tratado. Em algumas rodas mais intelectualizadas, ele foi criticado, acusado de enveredar pelo caminho da generalização e da simplificação.

Mas Janones acertou o alvo. É preciso dar o nome que as coisas têm e sempre alertar a sociedade para os horrores do nazismo, cuja tentativa de submeter e escravizar o mundo levou à morte de 100 milhões de seres humanos durante a Segunda Guerra Mundial.

Serve de alerta também para a mídia corporativa, que insiste em naturalizar o bolsonarismo, dispensando-lhe uma atenção e uma cobertura como se fosse um ator político democrático e comprometido com os preceitos republicanos.

A imprensa, assumindo uma postura suicida, varre para debaixo do tapete o óbvio: a própria liberdade de imprensa não se sustentaria com o avanço e a consolidação de um regime de extrema-direita à la Bolsonaro no Brasil. Lula, encabeçando uma frente ampla antifascista impôs um dura derrota eleitoral aos inimigos do regime democrático, mas o perigo segue à espreita.

E para quem usa o argumento de que o bolsonarismo disputa eleições no Brasil e, por isso, está inserido no jogo democrático, lembro que o Partido Nazista também venceu eleições na Alemanha, para depois mergulhar o país nas trevas.

Bolsonaro durante quatro anos tentou criar as condições para um golpe militar clássico. Como não conseguiu apoio suficiente, insuflou sua horda de terroristas para tentativa de golpe de 8 de janeiro, depois de também fracassar o plano golpista de instalar um Estado de Defesa no TSE.

Nada mais antagônico do que democracia e bolsonarismo. Se a mídia comercial entendesse isso, já seria um alento.

Bepe Damasco

Jornalista, editor do Blog do Bepe

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