Central de médicos analisa três ações judiciais com demandas de saúde por dia
Em setembro, quando teve de decidir se determinaria à Prefeitura Municipal de Uberlândia o fornecimento do remédio Luccentis para um idoso que sofria de uma doença oftalmológica, o juiz Flávio Andrade acionou o NatJus Nacional, que respondeu em 48 horas
Até começar a usar o serviço do NatJus Nacional, no ar desde o fim de agosto, o juiz federal Flávio Andrade julgava pedidos de internações ou cirurgias urgentes com base apenas nos documentos que tinha à mão, em geral laudos e exames médicos encaminhados pelo advogado do paciente que ingressou com a ação. Agora o juiz federal da 4ª Vara Federal de Uberlândia e todos os magistrados que decidem sobre o direito à saúde contam com o respaldo técnico de uma equipe de médicos mantida pelo Hospital Israelita Albert Einstein que já respondeu a 180 ações judiciais encaminhadas de todas as regiões em pouco mais de um mês de funcionamento do serviço – média de três notas técnicas respondidas por dia.
Em setembro, quando teve de decidir se determinaria à Prefeitura Municipal de Uberlândia o fornecimento do remédio Luccentis para um idoso que sofria de uma doença oftalmológica, o juiz Flávio Andrade acionou o NatJus Nacional, que respondeu em 48 horas. “O serviço ajuda o magistrado a decidir, com mais segurança, de forma rápida, sobre pedidos que envolvem o direito à saúde, muitas vezes em casos de emergência”, afirmou Andrade, que descobriu o serviço ao ler uma notícia a respeito.
Desde 2014 na vara federal do Triângulo Mineiro, o magistrado estima receber entre seis e sete pedidos semanais relacionados à saúde. Em 2015 e 2016, o juiz tentou um paliativo para o problema ao contratar perícias externas para analisar os pedidos encaminhados à Justiça. Esbarrou no alto custo do serviço. Acabou forçado a voltar a analisar laudos médicos, prontuários e documentos das secretarias estaduais e municipais de Saúde para poder decidir sobre a concessão de procedimentos e remédios. A partir de agora, poderá submeter esses documentos à análise técnica, que informará a pertinência ou não do atendimento à demanda e, inclusive, se o caso é de urgência ou não.
Segurança para decidir sobre urgências
O juiz titular da 5ª Vara da Fazenda Pública de São Paulo/SP, Marcos de Lima Porta, também obteve pronta resposta para um pedido de internação urgente que recebeu de um paciente e repassou à equipe do NatJus Nacional. “Era um caso liminar. Acessei o sistema, preenchi um formulário do CNJ e, para a minha surpresa, a resposta veio no dia seguinte”, disse o magistrado.
Segundo o magistrado, o retorno foi ágil e lhe deu a segurança suficiente para determinar ao Sistema Único de Saúde (SUS) a internação ou não uma pessoa. “É um assunto que exige do juiz conhecimentos muito específicos que eu não tenho. Para não pisar em ovos e dar uma decisão injusta, sempre busquei me cercar de informações técnicas. Nesse caso, eu cheguei a transcrever um trecho da nota técnica que obtive do NatJus Nacional no despacho que fiz, pois trata-se de decisão com subsídio técnico, bem calçada, firme, justa, lastreada em quem domina a técnica”, afirmou Porta.
Impacto financeiro
A equipe de médicos se baseia na medicina baseada em evidências para verificar se um medicamento, uma cirurgia ou um tratamento é indicado para o problema de saúde judicializado. Os critérios analisados são eficácia, acurácia, efetividade e segurança da tecnologia. A judicialização do direito à saúde representa atualmente uma fatia significativa do orçamento reservado à saúde dos governos federal, estadual e municipal, que administram os recursos do Sistema Único de Saúde (SUS).
Na maioria dos casos julgados pelo juiz Hugo Ferreira, da 2ª Vara Cível de Cruzeiro do Sul, no extremo-oeste do Acre, as demandas relacionadas à saúde cobram do orçamento da Secretaria de Saúde do Estado. “Somos um estado pequeno com dificuldade de prestação de alguns serviços públicos. E o nosso município é o mais isolado do estado, a 700 quilômetros da capital, na fronteira Brasil-Peru. Há pouca oferta de exames e de especialidades médicas. Além disso, a maioria da população é de baixa renda. Por isso, a maioria das ações requerem do Estado o custeio de um tratamento fora do município”, afirmou o magistrado.
Foi uma demanda desse tipo que levou o juiz Hugo Ferreira a acionar o NatJus Nacional na semana passada. Um paciente com dor lombar e sintomas de formigamento nas pernas recorreu à Justiça para conseguir realizar uma ressonância magnética. O exame não pode ser feito em Cruzeiro do Sul e uma passagem até a capital Rio Branco pode custar até R$ 4 mil no balcão do aeroporto. A 4.142 quilômetros de distância do Hospital Israelita Albert Einstein, o juiz de Cruzeiro do Sul cadastrou-se na plataforma NatJus Nacional e, em menos de 48 horas, recebeu o retorno da equipe médica.
Custo da judicialização
De acordo com o Ministério da Saúde, só a União gasta mais de R$ 1 bilhão anuais no cumprimento de decisões judiciais, com gasto anual médio de cerca de R$ 700 mil por paciente – os 10 medicamentos mais caros respondem por mais de 90% desses custos. Entre 2009 e 2018, o Governo Federal destinou R$ 6 bilhões (R$ 1,4 bilhão em 2018) à compra de medicamentos e outros tratamentos para cumprir decisões judiciais – o valor cresceu 1.083% em 10 anos.
Equipe
Ao todo, 180 médicos do Hospital Albert Einstein atendem 24 horas por dia, sete dias por semana. A plataforma foi desenvolvida e será mantida pelo CNJ, por iniciativa do Fórum Nacional do Judiciário para monitoramento e resolução das demandas de assistência à saúde (Fórum da Saúde). O serviço foi viabilizada por dois convênios que Ministério da Saúde e Conselho Nacional de Justiça assinaram. A parceria institucional possibilitou a participação de dois hospitais de excelência, Sírio Libanês e Albert Einstein, na construção e aperfeiçoamento do projeto e-NatJus.
Para o coordenador do Fórum da Saúde, conselheiro Arnaldo Hossepian, a quantidade de atendimentos revela o sucesso do projeto. “Esta nova ferramenta – o NatJus Nacional – para questões de urgências apenas revela o que o comitê executivo havia diagnosticado quando o projeto foi instituído em novembro de 2017: o juiz carece de informação técnico-científica. Então acho que alcançamos o objetivo, dar conhecimento técnico-científico para a magistratura nacional poder julgar melhor as questões da saúde pública”, afirmou Hossepian.
O Provimento n. 84 da Corregedoria Nacional de Justiça disciplina o funcionamento da plataforma. Basta o magistrado fazer um cadastro prévio, por meio da Corregedoria do seu tribunal. Dois manuais foram publicados para orientar os usuários: o Guia do Usuário do e-NatJus e o Guia para Solicitação e Elaboração de Notas Técnicas (e-NatJus).”
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