CNJ articula equipes psicossociais em audiências de custódia
Nesse sentido, garantir atendimento psicossocial durante seu primeiro encontro com um juiz durante a audiência de custódia é fundamental para a realização de encaminhamentos necessários
FOTO: Luiz Silveira/Agência CNJ
Uma parte significativa dos presos em flagrante estão em condições de vulnerabilidade – não possuem casa ou família, estão em situação de rua ou fazem uso de entorpecentes. Nesse sentido, garantir atendimento psicossocial durante seu primeiro encontro com um juiz durante a audiência de custódia é fundamental para a realização de encaminhamentos necessários. A medida vem sendo fomentada nacionalmente pelo Conselho Nacional de Justiça por meio do programa Justiça Presente, com resultados no Maranhão, Mato Grosso do Sul e Paraná, além de um novo grupo intersetorial em Minas Gerais.
As equipes de atendimento psicossocial auxiliam os juízes na identificação de vulnerabilidades sociais das pessoas custodiadas. Com mais informações sobre cada pessoa, a decisão dos magistrados se torna mais qualificada e individualizada. O desafio do Justiça Presente é instalar equipes de atendimento psicossocial em todas as 27 Unidades da Federação até 2020. Até o início do programa, 13 tribunais informaram oferecer atendimento psicossocial: AC, AM, BA, CE, DF, ES, MT, MG, PE, PI, RJ, SC e SP. Em alguns estados há ainda o atendimento pela equipe após a audiência de custódia, quando são feitos encaminhamentos para a rede.
A instalação de novas equipes de atendimento foi articulada pelos consultores em audiência de custódia do Justiça Presente, que atuam nas 27 Unidades da Federação (UFs). Em parceria com os coordenadores estaduais do programa, trabalharam junto aos Tribunais de Justiça e aos governos locais para estabelecerem rotinas de atendimento e cessão de servidores, por exemplo, assim como a ativação de redes de serviços públicos para encaminhamento –unidades de saúde e cursos profissionalizantes.
Como explica o coordenador do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário (DMF/CNJ), Luís Geraldo Lanfredi, a presença de profissionais de atendimento psicossocial fortalece e confere melhores condições para a atuação dos magistrados. “Esses profissionais apoiam o magistrado com o oferecimento de insumos e informações objetivas para a tomada de decisão mais adequada a cada caso”, afirma.
O fortalecimento das audiências de custódia é um dos campos de ação do programa Justiça Presente, parceria entre o CNJ e o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, com apoio do Ministério da Justiça e Segurança Pública, para enfrentar problemas estruturais do sistema penal e socioeducativo do país. Nas ações sobre audiência de custódia, o programa tem o apoio do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC).
Mato Grosso do Sul e Maranhão
Em Mato Grosso do Sul e no Maranhão, a instalação da equipe envolveu o Executivo, que cedeu profissionais para atuação. O início das atividades envolveu cursos de capacitação e elaboração de questionários sobre saúde da pessoa detida em flagrante (se tem algum transtorno mental, se está em tratamento ou se está em surto, por exemplo), situação profissional e de moradia, entre outros temas, como a estrutura familiar. “O objetivo é uma avaliação prévia e que dê subsídio para decisão do juiz para encaminhamentos sociais”, explica Helena Fonseca, supervisora de proteção social do UNODC, acrescentando que está em desenvolvimento um manual de atendimento psicossocial que será distribuído a todas as varas que realizam audiências de custódia.
O desembargador responsável pelo Grupo de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário (GMF) do Mato Grosso do Sul, Luiz Gonzaga Mendes Marques, considera de extrema importância a avaliação psicossocial dos custodiados. “Os impactos dessa atuação junto às audiências de custódia são no sentido de que os magistrados vão ter mais elementos sobre as pessoas detidas a fim de possibilitar uma decisão mais adequada com a situação de cada caso e com o encaminhamento mais apropriado para a situação de cada detento”, diz. O magistrado adianta que a corte está em articulação com o governo local para formação de equipe também em outras áreas, como no atendimento a pessoas egressas do sistema prisional.
A opinião sobre a relevância do atendimento psicossocial é compartilhada pelo secretário de Administração Penitenciária do Maranhão, Murilo Andrade. “É de extrema importância instalação da equipe, tendo em vista que poderemos analisar os casos antes das audiências e emitir relatórios com conhecimento técnico para auxiliar juízes na tomada de decisão. [A equipe] pode, por exemplo, identificar um problema e que não precisa ficar preso. Diante disso, poderá encaminhar para o tratamento correto, como pessoas com problemas de drogadição”, explica.
Paraná e Minas Gerais
A experiência no sul do país envolve o Judiciário e a Universidade Federal do Paraná (UFPR) por meio de um projeto de expansão em que 25 alunos realizam as entrevistas psicossociais com custodiados acompanhados pela equipe da Corte. “Nos interessa saber as condições psicológicas no momento da audiência para verificar se sugerimos aos magistrados outro encaminhamento que não só o aprisionamento. E, mesmo em casos de relaxamento da prisão, podemos sugerir que o custodiado seja amparado pelo Estado num encaminhamento à Rede de apoio Psicossocial do SUAS (Sistema Único de Assistência social) as ou outras instituições que podem acolhê-lo, fornecendo desde alimentação até documentação, quando for o caso”, esclarece o supervisor do projeto na UFPR, professor Márcio Ferraciolli.
De acordo com Ferraciolli, muitas das pessoas atendidas até o momento possuem baixo rendimento financeiro e baixa escolaridade, além de viverem em situação de rua. “Se o Estado simplesmente os prendem sem observar que fatores como transtornos mentais e outros problemas psicológicos sejam decorrentes do uso de álcool ou outras drogas, ou mesmo por fatores sociais e psicogênicos, muitos que vão presos podem ser recrutados por organizações criminosas ou, em sua saída sem apoio, vão viver em situação de rua, sem emprego, sem condições de lutar por um emprego que os mantenha”, explica.
O atendimento é realizado juntamente com equipe multidisciplinar que atua na Central de Medidas Socialmente Úteis, inaugurada em julho deste ano e que reúne serviços de alternativas penais do Judiciário, como projetos de justiça restaurativa. São dez profissionais de áreas como direito, psicologia e assistência social. Estão em construção fluxos de atendimento pós-audiência, assim como novas parcerias para outros projetos.
“O Tribunal de Justiça do Paraná tem sido parceiro do Justiça Presente, por meio da 2ª Vice-Presidência e do GMF”, explica a consultora do programa no Paraná, Laís Gorski. “É um trabalho também de mudança de cultura, para ter uma central multidisciplinar junto com os juízes. Existe um caminho além do encarceramento, e o os atores tem entendido a importância da tomada de decisão não apenas com direito, mas também com outras áreas”.
Em Minas Gerais, teve início em outubro uma nova abordagem no atendimento psicossocial de pessoas conduzidas à audiência de custódia. Após articulação da coordenação estadual e da consultoria em audiência de custódia do Justiça Presente, foi criado grupo de trabalho intersetorial para aprimorar o acompanhamento das pessoas que são liberadas da audiência com cautelares diversas da prisão, considerando pessoas em situação de rua, pessoas em sofrimento psíquico e pessoas em uso abusivo de substâncias psicoativas, a partir da transversalidade de raça, gênero e orientação sexual. O grupo conta com a participação do Poder Judiciário, Ministério Público, Defensoria Pública, rede de saúde mental e de assistência social, entre outros.
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