Condenações criminais definitivas com pena de reclusão validam dispensas por justa causa
Em duas decisões recentes, a 8ª e a 4ª Turma do TST discutiram o tema
Detalhe de cela prisional
A Oitava e a Quarta Turmas do Tribunal Superior do Trabalho discutiram, em decisões recentes, a validade da dispensa por justa causa de empregados que tiveram de cumprir pena em estabelecimentos prisionais por crimes não relacionados ao trabalho. Nos dois casos, o fundamento foi o artigo 482 da CLT, que lista, entre os motivos para a justa causa, a condenação criminal definitiva do empregado, caso não tenha havido suspensão da execução da pena.
Fiscal de loja
O caso julgado pela Oitava Turma foi o recurso de um fiscal de prevenção de perdas da Base Atacadista Ltda., de Santa Maria (DF). De acordo com a denúncia do Ministério Público do Distrito Federal, em 2013 (três anos antes de ser contratado), ele havia participado do roubo de um carro e, em junho de 2018, foi condenado a cinco anos, sete meses e seis dias de reclusão, em regime inicial semiaberto. Em 2020, quando a condenação se tornou definitiva, ele passou a cumprir a pena e foi dispensado.
Na reclamação trabalhista, ele alegava que o crime não tinha relação com o trabalho e fora cometido antes da admissão. Também argumentou que não caberia justa causa nos casos de cumprimento da pena em regime semiaberto, em que a pessoa tem o direito de trabalhar e de estudar fora da prisão durante o dia, retornando à noite.
A empresa, em sua defesa, sustentou que, antes da dispensa, o fiscal de loja já havia recebido cinco medidas disciplinares por atrasos e faltas ao serviço. Segundo a Base, a função era de confiança, e a condenação por roubo majorado (com uso de arma de fogo), sem suspensão da execução da pena, justificava a rescisão do contrato.
Impossibilidade física
O pedido de reversão da justa causa foi julgado improcedente pelo juízo da Vara do Trabalho do Gama (DF) e pelo Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região. Segundo o TRT, a CLT não prevê exceção quanto ao regime de cumprimento da sentença, e a rescisão motivada não caracteriza discriminação ou dupla penalidade, pois a capacidade de trabalho do empregado está limitada em razão da pena restritiva de liberdade.
O relator do recurso de revista do trabalhador, ministro Agra Belmonte, explicou que, a princípio, é possível que o empregado continue prestando serviços durante o cumprimento da pena, se houver compatibilidade. “A medida, inclusive, garante a ressocialização do preso e inibe a prática de novos ilícitos”, afirmou. Nesses casos, se não tiver interesse em manter a relação de emprego, a empresa pode demiti-lo sem justa causa.
No caso concreto, porém, a jornada do fiscal de prevenção de perdas era das 14h às 22h20, em escala 6x1. E, embora a lei preveja a possibilidade de cumprimento da pena em regime semiaberto, não há notícia de eventuais horários fixados pelo juiz da execução para sair para o trabalho e retornar ao local de detenção. “O que se sabe, ao contrário, é que o empregado foi conduzido ao sistema prisional, fato que evidencia a impossibilidade física de, ao menos temporariamente, continuar exercendo a função contratada. Desse modo, a despeito do regime semiaberto, o empregador estava autorizado a dispensá-lo por justa causa”, concluiu.
A decisão foi unânime.
Agente de correios
Já na Quarta Turma, o caso teve origem numa ação da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT) visando à dispensa de um agente de correios de Santos (SP). Ele fora condenado a oito anos e dois meses de reclusão, em regime fechado, em processo que tramitou em segredo de justiça, e, desde 2016, cumpria a pena na Penitenciária da Papuda, em Brasília (DF).
Como tinha direito à estabilidade sindical, o agente só poderia ser demitido por justa causa, daí o ajuizamento da ação. A ECT ressaltou que não se tratava de falta do ponto de vista trabalhista, mas da impossibilidade de o empregado exercer sua atividade em razão da condenação penal.
O pedido de rescisão foi julgado improcedente pelo juízo de primeiro grau e pelo TRT da 2ª Região com base na demora de mais de 18 meses da ECT para ajuizar a ação. De acordo com as instâncias inferiores, a “letargia” da empresa afastava o requisito da imediatidade para a aplicação da justa causa e caracterizava perdão tácito. Outro ponto considerado foi que o agente, em 2019, havia passado para o regime domiciliar, o que possibilitaria retomar suas atividades, ainda que em outra unidade.
Sem inércia
No recurso de revista, a ECT argumentou, entre outros pontos, que o procedimento administrativo fora instaurado imediatamente após a ciência da prisão. Contudo, a demora na obtenção das informações sobre a ação penal, em razão do segredo de justiça, havia atrasado o andamento do caso.
Para o relator, ministro Ives Gandra, não houve inércia na apuração do caso. “Ao contrário. Tão logo comunicada da prisão do funcionário, instaurou o competente procedimento administrativo disciplinar. E tão logo cientificada do trânsito em julgado da ação com pena de reclusão em regime fechado, determinou o ajuizamento do inquérito para apuração de falta grave”, assinalou. Com o afastamento dessa premissa, e diante da constatação da condenação, o colegiado reconheceu a falta grave e validou a justa causa.
(Glauco Luz e Carmem Feijó/CF)
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