Covid-19: MPF e MPT entram com ação para a União instituir o trabalho remoto como regra no Executivo Federal
Norma vigente deixa a critério de gestores a definição do home office para trabalhadores fora do grupo de risco
O Ministério Público Federal (MPF) e o Ministério Público do Trabalho (MPT) entraram com ação civil pública contra a União para que seja instituída norma tornando obrigatório o teletrabalho na Administração Pública Federal direta, autárquica e fundacional – nas hipóteses em que possa ser adotado sem prejuízo à realização dos respectivos serviços ou atividades e aos imperativos de interesse público – enquanto perdurar o estado de emergência de saúde pública decorrente da covid-19. Ainda, segundo o pedido, o gestor deverá se abster de determinar o trabalho presencial relativo a atividade ou a serviço não essencial.
Uma das principais preocupações é com as recentes notícias de relaxamento na adoção de teletrabalho no âmbito do Poder Executivo Federal e a consequente retomada do trabalho presencial em um momento em que só aumentam os números de casos de infectados pela covid-19 (inclusive no serviço público federal) e o número de óbitos decorrentes da doença, já tendo levado a colapso o sistema de saúde de diversas cidades do Brasil. A ação pede que seja determinada, em caráter de urgência, a antecipação de tutela para obrigar a União a, no prazo de cinco dias, instituir o teletrabalho como regra, nos termos citados, para todo o pessoal civil (servidores, empregados, terceirizados e estagiários, ainda que temporários), sob pena de multa de R$ 100 mil ao dia.
Atualmente, o Executivo Federal determina o trabalho à distância apenas para os servidores do grupo de risco ou que convivam com pessoas nesta situação e deixa a critério das autoridades máximas de cada órgão a deliberação de home office para os demais servidores.
Em abril, MPF e o MPT chegaram a emitir recomendação conjunta ao Ministério da Economia, mas não foi atendida. Para os procuradores signatários da ACP, “embora o governo federal tenha adotado algumas medidas para mitigar os riscos no ambiente de trabalho e tenha, inclusive, previsto (…) a possibilidade de a autoridade máxima de cada entidade federal adotar o trabalho remoto que abranja a totalidade das atividades desenvolvidas, o fato é que, até o presente momento – sobretudo diante do atual quadro de agravamento da pandemia – e mesmo após receber recomendações do Ministério Público Federal e do Ministério Público do Trabalho, limitou-se a determinar (de modo cogente) o trabalho remoto apenas para determinados grupos de servidores, sem torná-lo regra para todos os serviços e atividades que, por sua natureza, e sem prejuízo aos imperativos de interesse público, possam ser desempenhados remotamente, sobretudo nas localidades onde esteja em vigor norma estadual, distrital ou municipal (ou haja determinação judicial) de isolamento/distanciamento social”.
Segundo os procuradores, é incompatível com a Constituição qualquer medida de proteção insuficiente de direitos fundamentais, devendo o Poder Público lançar mão de todos os instrumentos de que disponha para a devida tutela de tais direitos. A ACP chama a atenção para possíveis implicações financeiras, visto que o Supremo Tribunal Federal reconheceu a possibilidade da contaminação pelo novo coronavírus ser considerada doença ocupacional, viabilizando a responsabilização de quem expõe indevidamente os respectivos trabalhadores a riscos.
A ação também destaca a grave crise sanitária causada pelo novo coronavírus; os atuais índices alarmantes da doença no país; as características de contágio inerentes ao vírus; as deficiências estruturais e de pessoal do sistema de saúde nacional; os imperativos constitucionais, convencionais, legais e infraconstitucionais de proteção à vida e à saúde das pessoas; as recomendações da OMS e do Ministério da Saúde acerca do isolamento/distanciamento social como principal ferramenta para o combate à pandemia e para o achatamento da curva de contágio; as providências normativas e administrativas adotadas pelos entes federativos no exercício de sua competência concorrente em questões relacionadas à saúde; a circunstância de o trabalho representar um determinante social que não pode ser esquecido na política nacional de enfrentamento da covid-19; o atual estado de proteção deficiente do direito fundamental à saúde; a relevância do teletrabalho como medida de distanciamento social no ambiente de trabalho necessária para o combate à pandemia; o crescimento significativo dos novos casos da covid-19 entre o pessoal civil da Administração Pública Federal e a circunstância de o Poder Executivo Federal ainda não ter se desincumbido, em sua inteireza, de sua obrigação de adotar todas as providências necessárias para a proteção do trabalhador.
A ação tramita sob o número 1028547-52.2020.4.01.3400 perante a 21ª Vara de Justiça Federal.
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