Devemos prestar mais atenção em Nikolas Ferreira
É preciso rir menos dele e tratá-lo com um adversário perigosíssimo para um futuro próximo
Nikolas Ferreira (Foto: Zeca Ribeiro - Câmara dos Deputados)
Quando setores da esquerda começaram a ridicularizar o deputado Nikolas Ferreira, principalmente depois que ele protagonizou o espetáculo criminoso de ocupar a tribuna da Câmara dos Deputados vestindo uma peruca para expor sua transfobia, alguma coisa me incomodou. O parlamentar já era apelidado de chupetinha e outros adjetivos pejorativos, principalmente após falas que taxávamos como engraçadas. Bolsonaro sempre fez o mesmo e acabou chegando à presidência da República.
Escrevo este texto movido pelo discurso de Nikolas no dia da votação do relatório da CPMI dos atos golpistas de 8 de janeiro. O deputado iniciou fazendo várias ironias contra a relatora Eliziane Gama para desqualificá-la e a seu relatório revelando sua essência puramente fascista. Mas alguns trechos do discurso merecem aguda atenção por parte das forças progressistas do país e não devem ser desprezados.
“Não considero os que pensam diferente como adversários, mas sim como inimigos.”
Uma das principais características do fascismo é justamente a intolerância com quem pensa diferente e a anulação do outro. Da parte dele, que pode ser o único parlamentar genuinamente bolsonarista a admitir isso sinceramente, não há debate de ideias, mas sim, uma guerra com inimigos a serem aniquilados.
Nikolas Ferreira afirmou com muita segurança que Jair Bolsonaro volta em 2026. Essa fala pode ser encarada como blefe, mas, com nossa justiça que às vezes é capenga, ela não deve ser desprezada. Ainda mais com a presidência do TSE sendo entregue em breve ao ministro Raul Araújo, bolsonarista de carteirinha. Espera-se dele uma anulação da sentença que tornou Bolsonaro inelegível por oito anos?
“O desespero da esquerda é que só tem dez meses que estamos no Congresso.”
Sim, com tão pouco tempo, apesar de terem dado um tiro no pé com a instalação da CPMI, já fizeram muito barulho e tentam o tempo todo inviabilizar o governo Lula, convocando ministros o tempo todo para darem explicações.
“A gente só tá começando.”
Realmente. E já se organizam como um bloco sólido.
“A gente pode andar livremente pelas ruas.”
Óbvio. Excetuando um outro que pode admoestá-lo, a esquerda não usa os mesmos métodos de intimidação e ameaças, a que, por exemplo, a senadora Eliziane Gama tem sido exposta.
“A gente precisa ter paciência. Já ocupamos os conselhos tutelares e as CPIs.”
A esquerda dormiu no ponto e deixou a extrema-direita tomar conta dos conselhos. Ela também propôs a CPI do MST que ficou perto de condenar o movimento.
“O presente é seu (da esquerda), mas o futuro é nosso.”
Pode servir de alerta para que se organizem os movimentos populares e se fortaleçam a comunicação do governo, até porque a extrema-direita, apesar de só compartilhar mentiras, tem dado de dez a zero nas redes sociais.
Enfim, é difícil admitir, mas Nikolas Ferreira fez um discurso articulado e digno de alguém que pretende ocupar um espaço muito maior do que ocupa agora.
Além disso, é preciso lembrar que ele possui milhões de seguidores nas redes sociais, principalmente jovens, e aspira à Prefeitura de Belo Horizonte, de onde poderá sair, teoricamente, como governador de Minas Gerais ou presidente do Brasil.
É preciso rir menos dele e tratá-lo com um adversário perigosíssimo para um futuro próximo.
Olho nele, portanto.
Fernando Castilho
Arquiteto, professor e escritor. Autor de Depois que Descemos das Árvores, Um Humano Num Pálido Ponto Azul e Dilma, a Sangria Estancada
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