Extrema direita atrai Eduardo Leite para um labirinto já lotado

"Eduardo Leite é hoje um João Doria sem a CoronaVac", avalia

Moisés Mendes
Publicada em 05 de março de 2023 às 10:54
Extrema direita atrai Eduardo Leite para um labirinto já lotado

Eduardo Leite (Foto: Felipe Dalla Valle / Palácio Piratini)

Eduardo Leite poderia ser a saída que parte da direita procura desesperadamente desde a ascensão de Bolsonaro. É jovem, tem vitalidade e a ambição de salvar o conservadorismo que virou bolsonarista.

Mas, perdido desde o ano passado, Leite volta a procurar sua turma no reacionarismo exacerbado, por achar que aí está a sua base. Enquanto busca os que seriam os seus, ataca Lula de novo.

Em encontro de governadores no Rio, o tucano veio com essa conversa de Rolando Lero:

“Há manifestações que demonstram pouco entendimento do que é governo e do que é Estado. Esse movimento ocorre principalmente por parte do próprio partido do presidente da República, que tem feito ataques frontais ao Banco Central e seus dirigentes”.

Lula, com a sabedoria acumulada depois de dois mandatos e entrando no terceiro, com 13 anos de PT no poder, reconhecido mundialmente como estadista decisivo para o século 21, é acusado por Leite de não saber o que é governo e o que é Estado.

Leite repete o básico do mercado:

“A autonomia concedida (ao Banco Central) tem uma razão de ser, no ponto de vista macroeconômico, então isso gera sobressaltos. E coloca mais dúvidas sobre certezas”.

O tom é sempre o mesmo. É gongórico e enrolativo. Leite tem talento para não ser apenas o Zema gaúcho.

Mas está em situação complicada em meio às reacomodações de direita e extrema direita. Não consegue achar seu grupo desde que enfrentou Doria dentro do PSDB, perdeu, ameaçou ir para o PSD, voltou e virou líder nacional do partido.

O PSDB tem como presidente um líder que meio ano atrás ameaçou jogar sua história tucana na sarjeta para concorrer a presidente por outra sigla.

Não saiu de meio traço nas pesquisas, mesmo depois da desistência de Doria, e recuou.

Leite só é governador porque as esquerdas gaúchas fizeram o que rejeitaram historicamente: votaram por exclusão, para que o Rio Grande do Sul não fosse governado por Onyx Lorenzoni.

As esquerdas do Estado finalmente aderiram ao voto útil em 2022. É simples assim. É uma conta básica.

O tucano perdeu feio para Onyx no primeiro turno, e no segundo teve os votos que haviam sido de Edegar Pretto e de outros segmentos que não queriam Onyx.

Ninguém deve imaginar que os votos que o salvaram tenham vindo de Marte. Leite pediu água para Tarso Genro, na campanha do segundo turno, quando se viu em desespero. Esse pedido de socorro é público, foi comentado em entrevistas por Tarso.

O tucano também procurou ou mandou os mesmos pedidos com recados a Olívio Dutra, Manuela D’Ávila e outros líderes que até então considerava inimigos.

Ninguém pediu nada em troca, nem poderia. Leite elegeu-se, com apoio declarado de lideranças progressistas, sem oferecer compensação nenhuma pelos votos de PT, PSOL, PCdoB e de outros contingentes das esquerdas.

Não havia como compor com o ex-bolsonarista dissimulado de 2018. Compor para compartilhar governo? Era mais do que improvável, era impossível.

Mas era preciso, como disse o próprio Lula em campanha em Porto Alegre, evitar a eleição de Onyx.

As esquerdas o aceitaram como saída. E Leite se reelegeu, voltou a falar como militante de direita, aplaudiu a venda da Corsan e, como deboche aos que o salvaram, foi a um evento nacional do MBL.

Almoçou com as esquerdas e foi jantar com a extrema direita. Agora, ataca Lula porque precisa se reacomodar em algum espaço que lhe permita disputar o espólio de Bolsonaro.

Orientado por marqueteiros do varejo, que quase o condenaram a não entrar no segundo turno, Leite deveria ouvir sua intuição de político para perceber que caminha na direção errada, para a zona inflacionada da direita identificada com Bolsonaro ou próxima do bolsonarismo.

O governador gaúcho poderia reconstruir o caminho de centro-esquerda idealizado pelo PSDB de Covas e FH. E que não seria a terceira via apenas eleitoreira e fracassada de 2022.

Um trocadilhista infame diria que Leite pensa ter café no bule para enfrentar Ratinho Júnior, Romeu Zema, Simone Tebet, Tarcísio de Freitas, Hamilton Mourão e até Michelle Bolsonaro e outros que já estão na parada.

Mas o que tem é o comando de um partido moribundo. Eduardo Leite é hoje um João Doria sem a CoronaVac. 

Moisés Mendes

Moisés Mendes é jornalista, autor de “Todos querem ser Mujica” (Editora Diadorim). Foi editor especial e colunista de Zero hora, de Porto Alegre.

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