Globo não só tomou partido. Ela é parte da trama
A Globo, em suas primeiras notícias sobre o episódio, até que deu uma enganada e soltou uma matéria relativamente equilibrada, no Fantástico
Não há nada mais previsível do que a Globo ter abraçado tão rapidamente a tese difundida pelo hoje ministro Sérgio Moro e pelo procurador Deltan Dallagnol de que hackers teriam invadindo os celulares de alguns procuradores e “descontextualizado” as mensagens do aplicativo Telegram, usadas pelo The Intercept para detonar o bombardeio político e jurídico do século. O site internacional divulgou reportagem baseada em conversas entre procuradores – Dallagnol, particularmente - e Moro, tramando contra a candidatura do ex-presidente Lula e direcionando a Operação Lava Jato para atuar contra o PT nas eleições passadas.
A Globo, em suas primeiras notícias sobre o episódio, até que deu uma enganada e soltou uma matéria relativamente equilibrada, no Fantástico, nesse último domingo, dia em que o caso explodiu. A partir, a emissora voltou a praticar o seu jornalismo de resultados e assumiu seu lado. O crime contra a segurança nacional praticado pelos hackers tornou-se o centro das atenções. Tudo o que foi levantado pelo jornalista Glenn Greenwald e seu site ficou em segundo plano. Uma inversão de valores clássica de um jornalismo parcial e criminosamente tendencioso.
O conteúdo propriamente dito, as denúncias, o desempenho mafioso do então “Juiz da Lava Jato” e dos procuradores, tornaram-se elementos secundários. Todos os envolvidos na trama – comprova-se hoje – estavam (como estão) engajados em um projeto de poder liberal e entreguista que tinha por finalidade a derrubada de Lula e do PT. No caso, um pouco mais adiante e na época das conversas salvas do Telegram de Moro e procuradores, na eliminação de qualquer chance de vitória para Fernando Haddad, substituto de Lula na corrida presidencial. Por tabela, uma trama pérfida que levaria ao poder um igualmente pérfido candidato, o que restou de confiável ao esquema e manipulável por ele.
O papel da Globo sempre foi, é e será o de servir a um projeto de poder que não tem a ver necessariamente com o interesse nacional. Com exceção da nova arrumação das verbas publicitárias – hoje desequilibradas em favor das emissoras ligadas à bancada evangélica – e, em certa medida, do fim do desarmamento, as grandes bandeiras que a Globo defende estão contempladas pelo governo de Bolsonaro e Paulo Guedes. Caso do “aprimoramento” da reforma trabalhista, da reforma da Previdência, da prioridade ao agronegócio, do favorecimento da política externa aos Estados Unidos e da privatização ampla, geral e irrestrita.
Autor das denúncias que estão minando o governo através do seu ministro da Justiça, Glenn Greenwald usou o seu twitter, nessa terça (11), para definir o que ele entende da TV Globo. “A Globo é sócia, agente e aliada de Moro e Lava Jato - seus porta-vozes - e não jornalistas que reportem sobre eles com alguma independência. É exatamente assim que Moro, Deltan e a força-tarefa veem a Globo. Então não esperem nada além de propaganda”, sentenciou o jornalista.
A Justiça, no noticiário “jornalístico” global deste caso, passou a ser elemento de somenos importância. Não seria de outra forma, pois a Globo também nessa história sórdida envolvendo Moro, Dallangol e quejandos, não é simplesmente um veículo. É parte e é partícipe (que se releve a aparente redundância). Mais: é igualmente protagonista, está no centro da trama.
E ainda tem gente, hoje em dia, que não acredita vivemos um golpe.
*Jornalista e compositor/letrista, tendo passado por veículos como Jornal do Commercio, O Globo e Jornal do Brasil, pela revista Veja e pela TV Globo, onde foi comentarista político. Ganhou três Prêmios Esso. Possui dois livros publicados: Bodas de Frevo e “Onde Está meu filho?”
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