Medida Provisória 927/2020 – A flexibilização das normas trabalhistas diante da pandemia do coronavírus

A sócia Aline Corrêa, especialista em direito trabalhista, comenta as medidas que poderão ser tomadas de acordo com a medida provisória

Assessora de Comunicação - Rocha Filho Advogados
Publicada em 24 de março de 2020 às 10:43
Medida Provisória 927/2020 – A flexibilização das normas trabalhistas diante da pandemia do coronavírus

No último domingo (22), o presidente da república Jair Bolsonaro assinou a medida provisória de n° 927, que regulamenta as diretrizes trabalhistas que poderão ser adotadas pelos empregadores para preservação de empregos e manutenção de renda durante o enfrentamento da pandemia do COVID-19.

Nesse período, empregado e o empregador poderão celebrar acordo individual escrito, a fim de garantir a permanência do vínculo empregatício. Importante registrar que esse acordo individual sobrepõe os demais instrumentos normativos, legais e negociais, respeitados os limites estabelecidos na Constituição.

A sócia Aline Corrêa, especialista em direito trabalhista, comenta as medidas que poderão ser tomadas de acordo com a medida provisória:

1. TELETRABALHO

O teletrabalho, também conhecido como trabalho home office, é aquele que o empregado executa o serviço parcialmente ou totalmente fora das dependências da empresa, com uso de tecnologias da informação ou comunicação, porém, sem configurar trabalho externo. Nesse momento de isolamento social para contenção da propagação do coronavírus a medida provisória amplia as possibilidades de adoção dessa formato.

Com a MP 927, o empregador poderá, a seu critério, alterar o contrato de trabalho de presencial para home office, ainda que exista previsão restritiva em acordos individuais ou coletivos, sem necessidade de prévio registro no contrato já existente, sendo razoável que se faça uma aditivo contratual com todas as cláusulas de novo modelo contratual, por precaução.

O empregador que passa a adotar o teletrabalho neste momento deverá comunicar seu colaborar com antecedência de no mínimo 48 horas, pode ser por escrito ou por algum meio eletrônico.

Em alguns casos essa mudança poderá exigir a aquisição e manutenção dos equipamentos necessários para a execução do trabalho, além de possíveis despesas por parte do empregado, ambas situações deverão constar no contrato escrito, firmado previamente ou com 30 dias contados a partir do dia em que foi alterado o contrato de trabalho.

Caso o empregado não possua os meios necessários para realizar o home office o empregador poderá lhe fornecer tais meios através de comodato (empréstimo para uso), podendo também assumir os custos com infraestrutura, como internet, por exemplo, sem que esses valores sejam incorporados ao salário do trabalhador. Agora se o empregador também não conseguir viabilizar todos os meios para exigir o teletrabalho esse período em que o trabalhador deveria trabalhar de sua casa será considerado como tempo à disposição do empregador.

Vale registrar também que o tempo gasto em aplicativos de comunicação fora da jornada de trabalho normal do empregado não será considerado tempo à disposição, regime de prontidão ou sobreaviso, exceto se estiver previsto no acordo individual ou coletivo algo nesse sentido.

Outro ponto importante é que a alteração contratual de presencial para home office poderá ser aplicada também para estagiários e aprendizes.

2. DA ANTECIPAÇÃO DAS FÉRIAS

Outra novidade que a MP 927 trás é a antecipação das férias de seus colaboradores desde que seja informada com antecedência de 48 horas, podendo essa comunicação acontecer por qualquer meio eletrônico, sempre indicando a data de início e término das férias desde que esse período não seja inferior a cinco dias corridos.

As férias poderão ser concedidas por ato do empregador, ainda que o período aquisitivo relativo a elas não tenha transcorrido, ou seja, ainda que o trabalhador não tenha completado um ano de empresa poderá ser antecipadas as férias à critério do empregador.

O prazo para pagamento das férias antecipadas é até o quinto dia útil do mês subsequente ao início do gozo das férias, podendo o empregador optar por efetuar o pagamento do adicional de um terço de férias após sua concessão até o prazo final para pagamento do 13º salário.

O empregado que optar por converter o terço de férias em abono pecuniário, estará sujeito à concordância do empregador, e o pagamento poderá ser feito também até o prazo do pagamento do 13º salário.

Se houver rescisão contratual do colaborador antes dos pagamentos previstos acima, o empregador deverá pagar junto com a rescisão os valores ainda pendentes.

Empregado e empregador poderão negociar a antecipação de períodos futuros de férias, mediante acordo individual escrito.

Aqueles colaboradores que pertençam ao grupo de risco do coronavírus (covid-19) serão priorizados para o gozo de férias, individuais ou coletivas.

O empregador poderá suspender as férias ou licenças não remuneradas aos profissionais da área de saúde ou aqueles que desempenhem funções essenciais e, que por ventura estejam no gozo de suas férias. Isso deverá ser feito mediante comunicação formal, por escrito ou por meio eletrônico, preferencialmente com antecedência de 48 horas.

Caso o empregador opte por conceder férias coletivas, deverá comunicar a todos com antecedência de, no mínimo, de 48 horas, com período ajustado juntamente com os colaboradores, sem necessidade de comunicação aos órgãos competentes.

3. DO APROVEITAMENTO E DA ANTECIPAÇÃO DE FERIADOS  

Mediante concordância dos empregados, os empregadores poderão antecipar os feriados que não sejam religiosos. Essa atitude deverá ser notificada aos funcionários por escrito ou por meio eletrônico com antecedência de, no mínimo, 48 horas, mediante indicação expressa dos feriados aproveitados. Os feriados também poderão ser utilizados para compensação do saldo em banco de horas.

4. BANCO DE HORAS

Outra opção para o empregador que não conseguir alterar o contrato de trabalho para regime home office ou outra modalidade, é o uso do regime de banco de horas, por acordo individual ou coletivo, independentemente de acordo ou convenção coletiva, aquele período que o colaborador ficar com as atividades interrompidas, os dias serão anotados em seu banco de horas e, posteriormente, repostos de acordo com as horas do banco.

Lembrando que não poderá ultrapassar duas horas por dia, não sendo permitido exceder dez horas diárias e o prazo total para compensar será de até 18 meses.

5. DA SUSPENSÃO DE EXIGÊNCIAS ADMINISTRATIVAS EM SEGURANÇA E SAÚDE NO TRABALHO

Fica suspensa a obrigatoriedade de realização dos exames médicos ocupacionais, clínicos e complementares, exceto os exames demissionais, retornando a sua exigência 60 dias após o encerramento do estado de calamidade pública.

Na hipótese de o médico coordenador de programa de controle médico e saúde ocupacional considerar que a prorrogação representa risco para a saúde do empregado, o médico indicará ao empregador a necessidade de sua realização. O exame demissional poderá ser dispensado caso o exame médico ocupacional mais recente tenha sido realizado há menos de 180 dias.

Fica suspensa também a obrigatoriedade de realização de treinamentos periódicos e eventuais dos atuais empregados, previstos em normas regulamentadoras de segurança e saúde no trabalho, sendo permitido apenas os treinamentos na modalidade à distância, retornando sua exigência 90 dias após encerramento do estado de calamidade pública.

Por fim, as comissões internas de prevenção de acidentes poderão ser mantidas até o encerramento do estado de calamidade pública e os processos eleitorais em curso poderão ser suspensos.

6. DO DIRECIONAMENTO DO TRABALHADOR PARA QUALIFICAÇÃO

Uma das opções é a suspensão do contrato de trabalho para que o colaborador se qualifique, pelo prazo de até quatro meses, o curso será a cargo do empregador  não presencial oferecido pelo empregador, sem necessidade de acordo ou convenção coletiva nesse sentido.

Deverá o empregador fazer por escrito e registrar na carteira de trabalho do colaborador, bem como, durante o período de suspensão do contrato e trabalho conceder ao colaborador ajuda compensatória, facultado ao empregador e o valor ajustado livremente, mantendo ao colaborador todos os benefícios voluntariamente concedidos, registra-se que estes não incorporam ao contrato de trabalho.

No caso de suspender o contrato de trabalho para que o colaborador se qualifique e não seja ofertado os cursos oferecidos não ser ministrado, ficará descaracterizada a suspensão e sujeitará o empregador terá que arcar com todos os salários e dos encargos sociais referentes ao período, às penalidades cabíveis previstas na legislação em vigor e às sanções previstas em acordo ou convenção coletiva.

Contudo, na manhã desta segunda-feira (23) o presidente Jair Bolsonaro divulgou em uma de suas redes sociais a revogação do artigo 18 da MP que tratava dessa suspensão, aguardando-se publicação nos veículos oficiais para validação da revogação, o que torna a medida em questão impossibilitada.

7. DO DIFERIMENTO DO RECOLHIMENTO DO FUNDO DE GARANTIA DO TEMPO DE SERVIÇO

Uma das opções festejadas pelo empregador é a suspensão da exigibilidade de recolher os encargos do recolhimento do FGTS, referente às competências de março, abril e maio de 2020, com vencimento em abril, maio e junho de 2020, respectivamente, independentemente do número de empregados, do regime de tributação, da natureza jurídica, do ramo de atividade econômica e da adesão prévia.

Quanto ao recolhimento das competências de março, abril e maio de 2020, o empregador deve pagar de forma parcelada, em até seis parcelas mensais, com vencimento no 7º dia de cada mês, sem a incidência da atualização ou da multa. No caso de descumprimento de alguma das parcelas, a empresa deverá arcar com multas e encargos devidos e ensejará o bloqueio do certificado de regularidade do FGTS.

Lembrando que continua a obrigatoriedade de declarar as informações, até 20 de junho de 2020, conforme já se procede, já que as informações prestadas constituem declaração e reconhecimento dos créditos delas decorrentes, caracterizam confissão de débito e constituem instrumento hábil e suficiente para a cobrança do crédito de FGTS. Os valores não declarados serão considerados em atraso, com obrigação de arcar com o pagamento integral da multa e dos encargos devidos.

Se houver rescisão do contrato de trabalho, o empregador terá que pagar os recolhimentos dos valores correspondentes ao mês da rescisão, sem incidência da multa e dos encargos devidos, com o pagamento dentro do prazo legal estabelecido para sua realização. Se tiver parcelas vincendas, a data de vencimento será antecipada para o prazo aplicável ao mês da rescisão contratual.

Fica suspensa a contagem do prazo prescricional dos débitos relativos a contribuições do FGTS pelo prazo de 120 dias, contado da data de entrada em vigor desta Medida Provisória.

8. OUTRAS DISPOSIÇÕES EM MATÉRIA TRABALHISTA

Aos estabelecimentos de saúde, é permitido, por meio de acordo individual escrito, mesmo para as atividades insalubres e para a jornada de 12x36:

a) Ocorrendo necessidade imperiosa, poderá a duração do trabalho exceder do limite legal ou convencionado, seja para fazer face a motivo de força maior, seja para atender à realização ou conclusão de serviços inadiáveis ou cuja inexecução possa acarretar prejuízo manifesto, fica autorizado a prorrogar a jornada de trabalho

b) Adotar escalas de horas suplementares entre a décima terceira e a vigésima quarta hora do intervalo interjornada, sem que haja penalidade administrativa, garantido o repouso semanal remunerado de 24 horas, preferencialmente no domingo nos termos do disposto.

O prazo para compensar as horas suplementares, poderá ocorrer no prazo de dezoito meses, contado da data de encerramento do estado de calamidade pública, por meio de banco de horas ou remuneradas como hora extra.

Fica suspenso também os prazos referentes aos prazos processuais para apresentação de defesa e recurso no âmbito de processos administrativos originados a partir de autos  de infração trabalhistas e notificações de débito de FGTS, durante o período de 180 dias.

Ainda no que tange às contaminações pelo coronavírus (covid-19) não serão considerados ocupacionais, exceto mediante comprovação do nexo causal.

Os acordos e as convenções coletivas vencidos ou vincendos no prazo de 180 dias, contado da data de entrada em vigor desta Medida Provisória, poderão ser prorrogados, a critério do empregador, pelo prazo de 90 dias, após o termo final deste prazo.

Durante o período de 180 dias, contados da data de entrada em vigor da Medida Provisória, os Auditores Fiscais do Trabalho do Ministério da Economia atuarão de maneira orientadora, exceto quanto às seguintes irregularidades:

I - falta de registro de empregado, a partir de denúncias;

II - situações de grave e iminente risco, somente para as irregularidades imediatamente relacionadas à configuração da situação;

 III - ocorrência de acidente de trabalho fatal apurado por meio de procedimento fiscal de análise de acidente, somente para as irregularidades imediatamente relacionadas às causas do acidente; e

IV - trabalho em condições análogas às de escravo ou trabalho infantil.

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