Não tenho procuração para defender Daniel Pereira, mas questiono: essa espetacularização é realmente necessária?

São incontáveis os casos em que tais operações, espetacularmente realizadas, não resultam em denúncias aceitas pela justiça, em processos instaurados, em julgamentos e condenações.

Itamar Ferreira *
Publicada em 14 de abril de 2019 às 00:53
Não tenho procuração para defender Daniel Pereira, mas questiono: essa espetacularização é realmente necessária?

Segundo noticiado amplamente pela imprensa, se trata de uma ação dentro da operação denominada como “Pau oco”, em um desdobramento batizado como “O Teste do Sabre”, cujo objetivo seria produzir novas provas em inquérito policial que apura a existência de uma organização criminosa instalada na administração pública estadual a partir de abril de 2018, da qual integrantes do alto escalão estavam voltados ao atendimento de demandas criminosas no setor ambiental. Daniel Pereira, que chegou a ter prisão noticiada pelo G1, mas sofreu ‘apenas’ busca e apreensão, é advogado, sindicalista, ex-deputado estadual e ex-governador.

Há que se concordar que é uma investigação da mais alta relevância, todavia, essa modalidade de “grandes operações” com cobertura ao vivo da imprensa, com entrevistas coletivas e outros aparatos midiáticos não têm se mostrado como uma forma eficiente de se combater efetivamente a corrupção, no mais da vez o principal efeito prático é a repercussão midiática.

São incontáveis os casos em que tais operações, espetacularmente realizadas, não resultam em denúncias aceitas pela justiça, em processos instaurados, em julgamentos e condenações. Quantas condenações resultaram da espetaculosa “Operação Carne Fraca”, que causou enormes prejuízos à indústria frigorífica, a qual foi deflagrada de forma açodada e com base em informações inconsistentes, onde, por exemplo, “papelão” citado como embalagem, em conversa gravada, foi interpretado pela investigação como adição de papel às carnes?

Mas não é só alhures que tal acontece. Quem não se lembra no final de 2012, quando o ex-prefeito Roberto Sobrinho foi sumariamente afastado e vários secretários municipais foram presos, por semanas e até meses? Sete anos depois qual o resultado prático daquela operação de grande repercussão? De todos os que foram presos, nenhum foi condenado e seus bens bloqueados foram liberados; ou seja, restou comprovado suas inocências do ponto de vista judicial, já que no “Tribunal da opinião pública e da mídia” todos foram condenados perpetuamente.

Há 21 dias o ex-presidente Michel Temer e outros foram presos em mais uma espetacular operação da Lava Jato, “por tempo indeterminado”. Juristas e advogados de renome declararam de imediato que não havia qualquer base legal para tais prisões, sendo que horas ou dias depois todos foram soltos.

Sobre a prisão de Temer, o jurista e professor de Direito Constitucional na PUC-SP, Pedro Serrano, foi categórico ao afirmar que “a prisão cautelar pode ser aplicada, mas com indícios concretos de que o acusado realmente esteja atuando contra as provas do processo. “Não podem utilizar suposições para isso. Uma pessoa não precisa estar presa para ser investigada. Esse método que vem sendo utilizado é um espetáculo midiático que enfraquece o Estado Democrático de Direito”, afirmou.

Em matéria publicada em 21 de março último no jornal a Gazeta do Povo constou que: "A forma como a prisão do ex-presidente Michel Temer (MDB), de 78 anos, foi executada nesta quinta-feira (21) repercutiu negativamente entre ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), parlamentares da situação e da oposição, e juristas. Todos viram no episódio uma certa espetacularização e pouco embasamento jurídico para justificar a prisão preventiva". Eu particularmente acho que o Temer já deveria ter sido processado e estar preso há décadas, mas isso dentro do devido processo legal e não como um justiçamento para agradar a opinião pública.

Vamos aguardar uma rápida divulgação dos fatos que teriam justificado a prisão dos citados na investigação, para se fazer um juízo mais abalizado deste caso concreto, ressaltando que os presos e os que sofreram busca e apreensão gozam do direito constitucional da presunção de inocência e poderiam ter sido poupados, juntos com seus familiares, desse tipo de espetáculo midiático.

* Itamar Ferreira é advogado.

Winz

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Comentários

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    Tito 15/04/2019

    QUEM VEM SOFRENDO HUMILHAÇÃO NESTE PAIS HA MUITO TEMPO É O POVO BRASILEIRO, A EXEMPLO DAQUELES JOGADOS NOS CORREDORES IMUNDOS DO AÇOUGUE CHAMADO HOSPITAL JOÃO PAULO II. QUANTO A MIM, NÃO TEMO COISA ALGUMA NESSE MUNDO DE HOMENS INÍQUOS, POIS MINHA SEGURAMÇA E MINHA VIDA ESTÁ ABSOLUTAMENTE NAS MÃO DE DEUS, O CRIADOR DE TUDO QUE EXISTE.

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    Itamar Ferreira 15/04/2019

    Caros, Euzinha e Tito, O questionamento feito no artigo não é para se defender supostas impunidades ou que figuras públicas sejam intocáveis e não devam ser investigadas. A polícia e o MPT, e, posteriormente o judiciário devem sempre agir com o máximo rigor. Não se trata de defender 'Daniel Pereira', por ele ser isso ou aquilo, se trata de defender o direito constitucional da presunção de inocência, primeiramente. Em segundo lugar, o que se questiona é sobre o que parece ser uma busca desenfreado por holofotes da mídia por parte de algumas autoridades. Para se fazer uma busca e apreensão e até mesmo prisões de investigados, não seria necessário convocar toda imprensa para filmar o constrangimento e a humilhação do investigado e sua família. A polícia deveria fazer isso com uma certa discrição.. Até porque, é muito comum, que a maior parte dos investigados em grandes e espetaculosas operações, no final das investigações, sequer são denunciados à justiça, ficando patente suas inocências ou ausência de provas das suspeitas levantadas. Todavia, a reputação, o nome e o sofrimento desse cidadão que foi preso ou teve busca e apreensão em sua residência, o sofrimento e constrangimentos de seus familiares, jamais serão reparados; pois a ação policia é realizada sob os holofotes de toda mídia e quando há a comprovação da inocência as autoridades não convocam entrevistas coletivas para informar que o cidadão foi inocentado. Por fim, ressalta que não se trata de "Daniel Pereira" e sim de qualquer cidadão, do mais humilde, até um ex-governador ou ex-presidente da República. Por exemplo, notoriamente Michel Temer está envolvido em denúncias de corrupção há décadas, mas o poder público, não se sabe ao certo o motivo, nunca se empenhou em fazer as necessárias investigações, oferecer as denúncias à justiça e obter condenações para tê-lo colocado na cadeia, depois do devido processo legal. Entretanto, a prisão dele há poucos dias, também sobre os holofotes da grande mídia, foi flagrante ilegal, com afirma o renomado jurista da PUC-SP citado no meu artigo, tanto foi ilegal que Temer e todos os demais foram soltos logo em seguida. Havia necessidade de prender e expor o ex-presidente e outros, independente das suspeições de corrupção que pesem sobre ele, para em pouquíssimo tempo depois ser colocado em liberdade? Havia necessidade de se informar antecipadamente à toda imprensa sobre a realização da nova etapa da "Operação Pau Oco", inclusive fivulgando-se fake news de que o ex-governador estaria ou seria preso? Não desejo nunca que esse tipo de coisa lhe aconteça Tito, mas se algum dia você for vítima de tal situação eu me posicionarei contra, não porque tenha maiores considerações por você ou achasse que não mereceria ser investigado, mas porque como cidadão você tem a direito à presunção de inocência prevista em nossa Constituição Federal e não mereceria ter a si própria e sua família expostas na mídia por simples suspeitas. Abraços,

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    Euzinha 14/04/2019

    E daí que o Daniel Pereira seja é "advogado, sindicalista, ex-deputado estadual e ex-governador" ?! Aliás, na atual conjuntura de nosso país isso já virou requisito para ser corrupto. Basta ver ai na mídia como você mesmo cita na sua matérias. Se até mais de um ex-presidentes já fora presos né?! Inclusive o Daniel Pereira tem uma agravante por até já ter sido petista na época em que era professor, Oriundo do sindicalismo, Daniel Pereira começou carreira política como vereador pelo PT, sendo eleito deputado estadual posteriormente! Hummm.... Sei lá! Uma coisa é verdade...Onde a fumaça, a fogo!!!!! De repente, vai que cavucando mais, a policia possa encontrar mais ainda nesse "balaio de gatunos" .

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    Tito 14/04/2019

    Deus que me livre de ser defendido por sertas "figuras inúteis" do cenário político desse país! No mais, tudo faz parte do imenso teatro nacional de hipocrisias que envolve justça, mp, policia, advogados carniceiros, políticos, etc. Políticos que estão há anos convivendo passivamente com a corrupção, ajudando a mascarar toda sorte de crimes praticados no âmbito público não é vítima de coisa alguma quando a justiça age!

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