O Cabaré e a escola

A República de Brazundônia é um país muito parecido com aquele criado por Lima Barreto. Muitos chegam a dizer que se trata da mesma nação.

​​​​​​​Professor Nazareno*
Publicada em 26 de fevereiro de 2018 às 09:01

A República de Brazundônia é um país muito parecido com aquele criado por Lima Barreto. Muitos chegam a dizer que se trata da mesma nação. Porém, muitos anos separam os dois lugares e os costumes já estão hoje um pouco diferentes nos dois territórios. Em Brazundônia o governo local tinha como missão fazer duas grandes construções: uma escola, que aprovasse todos os alunos para os cursos inferiores, e um inferninho, onde todos pudessem ser devassos sem ter que pagar nada às putas. Como se tratava de um puteiro público, todos iriam ali para se divertir e fazer as suas orações. Verbas havia de sobra para as duas construções, mas o bordel estava sendo construído em tempo recorde enquanto a escola sofria com a burocracia, a má vontade e o atraso de recursos.  Os empresários e políticos do lugar só destinavam verbas para o prostíbulo.

As autoridades brazundonenses colocavam anúncios na televisão e nas redes sociais dizendo que estavam muito preocupadas com a construção da escola e de tudo fariam para que não houvesse nenhum atraso no início do ano letivo. Mas era tudo mentira, uma vez que as empreiteiras contratadas para as obras só davam prioridades para embelezar o lupanar. Na verdade aquela casa da luz vermelha nunca deixou de funcionar. As ações inerentes à orgia eram realizadas ali mesmo, à luz do dia ou na escuridão da noite. A reforma era apenas proforma só para satisfazer os pagadores de impostos mais enjoados. Já na escola, tudo parado, nada andava. Um dia levantavam uma parede e no outro a derrubavam alegando erro de cálculo ou qualquer outra coisa. As desculpas para que aquela obra nunca ficasse pronta a tempo sempre apareciam.            Nem a escola nem a casa de massagens estavam prontas, mas enquanto em uma não havia aulas, reuniões nem debates de conhecimentos na outra as lascívias funcionavam normalmente todos os dias. E parece que esta situação esdrúxula não incomodava muita gente. Os cidadãos de Brazundônia dizem que a educação de qualidade vem em primeiro lugar, mas é no rendez-vous que passam o dia inteiro enquanto na escola apenas meio turno por dia para seus filhos. Sem aulas, muitos alunos estão felizes. Muitos até brincaram o Carnaval sem preocupações com provas, aulas chatas ou testes. A maioria dos professores ri feito criança, pois ganham o salário integral sem precisar dar uma única aula. Os pais nem se preocupam. “Os professores e a Direção sempre darão um jeito para as coisas terminarem bem para todos”, afirmam.

Em Brazundônia sempre foi assim mesmo: tudo para a zona e pouca coisa ou quase nada para a educação. “Fazer reformas de escolas durante as férias não tem graça, pois ninguém iria perceber que estamos trabalhando”, dizem na maior cara de pau alguns funcionários do governo local. “Investir no baixo meretrício é uma aposta correta nos futuros homens da nossa nação”, dizem outros. No país libidinoso, primeiro o futebol, depois o Carnaval e as bandas, as novelas, a fofoca, o BBB e por fim as escolas. Algumas são particulares, mas mesmo assim colocam poucos alunos para cursar o ensino inferior. Em época de eleições como agora é importante não criar problemas com a comunidade, por isso as aulas poderão começar só depois do meio do ano. Assim, todos ficarão alegres. Na nação inteira muitos entendem que é mais correto as verbas serem destinadas sempre ao alcoice e nunca para as escolas. Para que, né?

*É Professor em Porto Velho.

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