Os erros e as omissões da imprensa no caso Marielle

"As investigações avançaram mais em seis meses do que nos cinco anos anteriores", observa Bepe Damasco

Bepe Damasco
Publicada em 27 de julho de 2023 às 17:54
Os erros e as omissões da imprensa no caso Marielle

Mural de Marielle Franco (Foto: Carol Castanho/Divulgação Instituto Aurora)

Alguém já leu alguma reportagem investigativa (não vale citações de rodapé), nos veículos da mídia corporativa, explorando a estranheza do fato de um assassino profissional, como o PM reformado Ronnie Lessa, ser vizinho do ex-presidente da República, Jair Bolsonaro, em um condomínio de alto padrão, na Barra da Tijuca?

Claro que não.

Tampouco mereceram a atenção devida as relações próximas entre Lessa e Bolsonaro. Além das fotos risonhas da dupla que circulam nas redes, sabe-se que o filho mais novo do capitão chegou a namorar a filha do matador.

Mas nada disso tem grande importância para a imprensa comercial.

Também nunca estiveram no radar da mídia questionamentos sobre a discrepância entre os rendimentos de Lessa como policial e o preço de um imóvel no condomínio Vivendas da Barra.

Aliás, soa também esquisito Bolsonaro ser proprietário de uma casa neste condomínio de luxo, com seus proventos de ex-militar e o salário de deputado, mesmo que tenha exercido tantos mandatos.

E tem mais.

Quando Moro, então ministro da Justiça do governo fascista, se comportando com a canalhice e a covardia habituais, perseguiu o porteiro do Vivendas, a mídia não se manifestou de forma crítica, oscilando entre a omissão e uma cobertura favorável ao seu “herói” na época.

Cabe lembrar que o porteiro havia dito que “seu Jair autorizou”, se referindo à permissão para a entrada no condomínio de Élcio de Carvalho, réu confesso de ter participado dos assassinatos de Marielle e Anderson.

A mudança no depoimento do porteiro, depois de ser ameaçado e coagido, bem como o confisco  do sistema de som do condomínio por parte de Bolsonaro, foram tratados por Globo e companhia como a coisa mais natural do mundo.

São notórias as relações do clã Bolsonaro com as milícias do Rio. Bolsonaro e seus filhos deram várias declarações públicas de apoio a esses grupos criminosos.  

Flávio Bolsonaro condecorou o chefe do escritório do crime, Adriano da Nóbrega, com a medalha Tiradentes e empregou em seu gabinete na Alerj a mulher e a mãe do miliciano. 

Era, portanto, de uma clareza estelar que enquanto durasse o governo Bolsonaro as investigações ficariam emperradas. Mas os focos principais de abordagem da mídia sobre o assunto sempre foram as falhas técnicas das investigações e as disputas por protagonismo entre os setores das forças de segurança do estado do Rio de Janeiro, especialmente da Polícia Civil.

Não que isso não tenha ocorrido, mas são consequências e não causas da ineficiência da investigação. O inquérito não andava porque não interessava ao governo anterior.

Esse é o ponto.

Agora, ao que tudo indica, é apenas uma questão de tempo a descoberta de quem mandou matar Marielle e por que. As investigações avançaram mais em seis meses do que nos cinco anos anteriores. Bastou afastar a policia civil do Rio e colocar a Polícia Federal no caso, junto com o Ministério Público do estado.

E, principalmente, tratar a elucidação do crime como prioridade.  

Isso só foi possível depois que o véu de proteção e cumplicidade do governo Bolsonaro foi removido. As investigações caminham a passos largos para corroborar com provas o que sempre se soube: a milícia do Rio planejou e executou o crime bárbaro.

Bepe Damasco

Jornalista, editor do Blog do Bepe

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