Quem é Patrick Brito, que hackeou Bolsonaro, Mourão e fez trabalhos ilegais para a Abin Paralela

Polícia Federal deveria ouvi-lo, já que o hacker tem informações que são nitroglicerina pura e podem ajudar a desvendar o esquema de espionagem ilegal

Fonte: Joaquim de Carvalho - Publicada em 26 de julho de 2024 às 18:27

Quem é Patrick Brito, que hackeou Bolsonaro, Mourão e fez trabalhos ilegais para a Abin Paralela

O hacker, Bolsonaro e Mourão: tudo junto e misturado no caldeirão da Abin (Foto: Divulgação | Ueslei Marcelino/Reuters)

Patrick Brito começou a cursar Física na UFRJ em 2012, mas alguns meses depois abandonou a faculdade. Ele nunca teve emprego regular, mas sempre se manteve num padrão acima da média. Já morou nos Estados Unidos, durante alguns meses, e hoje reside em Belgrado, na Sérvia. Filho de uma funcionária de gráfica e de um eletricista de automóveis, como vive Patrick Brito?

“Eu sou hacker, sempre vivi da minha renda como hacker”, afirmou. Patríck Brito se tornou o  personagem central de um escândalo sobre um esquema de espionagem ilegal que teria sido utilizado por setores da Polícia Civil de São Paulo, e também por políticos de Araçatuba e Bauru, no interior do Estado. Ele cobrou por esses serviços.

Patrick também diz ter trabalhado para a Embaixada dos EUA no Brasil e para a Abin, durante o governo Bolsonaro, o que deveria motivar a Polícia Federal a ouvi-lo, dentro da operação Última Milha. Mas, apesar de sua disposição de dar o seu testemunho ou confessar seus crimes, até agora nenhum policial federal o procurou. 

Suas declarações e documentos, reveladas em primeira mão pelo jornalista André Fleury, do Jornal da Cidade, de Bauru, levaram à abertura de uma Comissão Especial de Inquérito (CEI) na Câmara daquela cidade. Os vereadores investigam a denúncia de que Patrick teria sido contratado pela prefeita, Suéllen Rosim (PSD), para espionar um jornalista e vereadores, inclusive uma parlamentar do PT.

Em entrevistas recentes, Patrick Brito abriu um pouco mais o seu baú de segredos, e contou que hackeou o próprio Bolsonaro, quando este era candidato, em 2018. Foi contratado por quem? “Esse nome eu vou manter em sigilo”, declarou.

Em 2019, o hacker teria sido procurado pelo comunicador André, filho do empresário Paulo Marinho, que é primeiro suplente do senador Flávio Bolsonaro. André Marinho lhe teria pedido  para tentar localizar o celular de Gustavo Bebianno, ex-ministro de Bolsonaro.

Bebianno faleceu em março de 2020, dois meses depois de denunciar o projeto de Carlos Bolsonaro de transformar a Abin numa polícia política, a tal Abin Paralela.

Bebianno, antes de morrer de infarto, disse que o celular estava escondido e que contém mensagens que comprometem o então presidente da república. Procurado, André negou o contato com o hacker.

A prefeita de Bauru também negou o contato com Patrick, mas seu cunhado Walmir Henrique Vitorelli admitiu que conversou com ele, em 2021, supostamente para tratar de uma reação a uma campanha de difamação que havia nas redes sociais contra sua esposa. O cunhado da prefeita diz que pretendia obter serviços “legais”.

Para quem negociou com o hacker, fica cada vez mais difícil sustentar versões como esta. Recentemente, Patrick mostrou à CEI da Câmara Municipal de Bauru recibos de depósitos de mais de R$ 160 mil em favor dele, a partir de ações de Walmir Vitorelli. 

O cunhado da prefeita é irmão de um policial civil em Araçatuba, Felipe Garcia Pimenta, da equipe do delegado divisionário Carlos Henrique Cotait, que também teria usado serviços ilegais do hacker.

A Polícia Civil em Araçatuba obteve mandado de prisão contra o hacker, mas não conseguiu cumpri-lo, porque Patrick reside na Sérvia desde março de 2021. 

Cotait está sendo investigado pela Corregedoria da Polícia Civil em São Paulo, e uma das provas é a gravação em que o delegado diz ter a intenção de matar o hacker, por conta das denúncias que este fez contra ele.

Patrick Brito chegou a ser preso na Servia, depois que o governo brasileiro pediu sua extradição, mas foi solto e agora está prestes a obter asilo naquele país, já que corre o risco de ser assassinado no Brasil, vítima de queima de arquivo.

O hacker está cada vez mais desenvolto em suas declarações, embora diga que tenha medo de morrer. A violência é um traço marcante de sua trajetória. Ele tem 30 anos de idade e, aos sete, perdeu o pai, executado com 6 tiros, alguns na cabeça.

Um ano antes, em 2000, o pai já tinha sido alvo de atentado, e havia ficado paraplégico. Em Araçatuba, o que se diz é que foi queima de arquivo. Frank Renan Alves de Brito, o pai de Patrick, teria sido ligado à banda podre da polícia e também a quadrilhas de desmanche de carros.

Dois tios de Patrick já foram presos por tráfico. O hacker foi criado pela mãe, que permaneceu solteira depois da gravidez. Frank era primo dela em primeiro grau.

“Lembro muito pouco do meu pai. A última imagem que tenho dele é ele me levantando e me passando numa máquina dessas de amolar peças. Era uma brincadeira dele. Tinha brincadeira dessas. Me lembro dessa cena”, disse Patrick.

Mesmo com essas dificuldades, o hacker sempre foi bom aluno. “Gosto muito de exatas e ensinava os colegas”, contou. Quando tinha 16 anos, redigiu um projeto de lei de apoio do Estado a pequenos agricultores, e foi selecionado para visitar a Assembleia Legislativa de São Paulo, dentro do programa Parlamento Jovem.

Quando teve a oportunidade de usar o microfone, questionou o então presidente da Assembleia, Barros Munhoz, sobre as denúncias de corrupção que pesavam contra ele. Tentaram lhe cassar a palavra, mas Patrick seguiu adiante.

O hacker diz que sua satisfação é revelar o que os poderosos tentam esconder. Sua ação é um caso de polícia, claro, mas não deixa de ser também uma ação política. Pelo que tem falado e mostrado, Patrick é nitroglicerina pura.

É preciso ouvi-lo, e as instituições têm o dever de apurar tudo, recolher as provas que tem, buscar outras e punir os culpados.

Quem tem medo de Patrick Brito?

.x.x.x.x.x.

Abaixo, a videorreportagem realizada a partir da entrevista do hacker à TV 247.

Joaquim de Carvalho

Colunista do 247, foi subeditor de Veja e repórter do Jornal Nacional, entre outros veículos. Ganhou os prêmios Esso (equipe, 1992), Vladimir Herzog e Jornalismo Social (revista Imprensa). E-mail: [email protected]

294 artigos

Quem é Patrick Brito, que hackeou Bolsonaro, Mourão e fez trabalhos ilegais para a Abin Paralela

Polícia Federal deveria ouvi-lo, já que o hacker tem informações que são nitroglicerina pura e podem ajudar a desvendar o esquema de espionagem ilegal

Joaquim de Carvalho
Publicada em 26 de julho de 2024 às 18:27
Quem é Patrick Brito, que hackeou Bolsonaro, Mourão e fez trabalhos ilegais para a Abin Paralela

O hacker, Bolsonaro e Mourão: tudo junto e misturado no caldeirão da Abin (Foto: Divulgação | Ueslei Marcelino/Reuters)

Patrick Brito começou a cursar Física na UFRJ em 2012, mas alguns meses depois abandonou a faculdade. Ele nunca teve emprego regular, mas sempre se manteve num padrão acima da média. Já morou nos Estados Unidos, durante alguns meses, e hoje reside em Belgrado, na Sérvia. Filho de uma funcionária de gráfica e de um eletricista de automóveis, como vive Patrick Brito?

“Eu sou hacker, sempre vivi da minha renda como hacker”, afirmou. Patríck Brito se tornou o  personagem central de um escândalo sobre um esquema de espionagem ilegal que teria sido utilizado por setores da Polícia Civil de São Paulo, e também por políticos de Araçatuba e Bauru, no interior do Estado. Ele cobrou por esses serviços.

Patrick também diz ter trabalhado para a Embaixada dos EUA no Brasil e para a Abin, durante o governo Bolsonaro, o que deveria motivar a Polícia Federal a ouvi-lo, dentro da operação Última Milha. Mas, apesar de sua disposição de dar o seu testemunho ou confessar seus crimes, até agora nenhum policial federal o procurou. 

Suas declarações e documentos, reveladas em primeira mão pelo jornalista André Fleury, do Jornal da Cidade, de Bauru, levaram à abertura de uma Comissão Especial de Inquérito (CEI) na Câmara daquela cidade. Os vereadores investigam a denúncia de que Patrick teria sido contratado pela prefeita, Suéllen Rosim (PSD), para espionar um jornalista e vereadores, inclusive uma parlamentar do PT.

Em entrevistas recentes, Patrick Brito abriu um pouco mais o seu baú de segredos, e contou que hackeou o próprio Bolsonaro, quando este era candidato, em 2018. Foi contratado por quem? “Esse nome eu vou manter em sigilo”, declarou.

Em 2019, o hacker teria sido procurado pelo comunicador André, filho do empresário Paulo Marinho, que é primeiro suplente do senador Flávio Bolsonaro. André Marinho lhe teria pedido  para tentar localizar o celular de Gustavo Bebianno, ex-ministro de Bolsonaro.

Bebianno faleceu em março de 2020, dois meses depois de denunciar o projeto de Carlos Bolsonaro de transformar a Abin numa polícia política, a tal Abin Paralela.

Bebianno, antes de morrer de infarto, disse que o celular estava escondido e que contém mensagens que comprometem o então presidente da república. Procurado, André negou o contato com o hacker.

A prefeita de Bauru também negou o contato com Patrick, mas seu cunhado Walmir Henrique Vitorelli admitiu que conversou com ele, em 2021, supostamente para tratar de uma reação a uma campanha de difamação que havia nas redes sociais contra sua esposa. O cunhado da prefeita diz que pretendia obter serviços “legais”.

Para quem negociou com o hacker, fica cada vez mais difícil sustentar versões como esta. Recentemente, Patrick mostrou à CEI da Câmara Municipal de Bauru recibos de depósitos de mais de R$ 160 mil em favor dele, a partir de ações de Walmir Vitorelli. 

O cunhado da prefeita é irmão de um policial civil em Araçatuba, Felipe Garcia Pimenta, da equipe do delegado divisionário Carlos Henrique Cotait, que também teria usado serviços ilegais do hacker.

A Polícia Civil em Araçatuba obteve mandado de prisão contra o hacker, mas não conseguiu cumpri-lo, porque Patrick reside na Sérvia desde março de 2021. 

Cotait está sendo investigado pela Corregedoria da Polícia Civil em São Paulo, e uma das provas é a gravação em que o delegado diz ter a intenção de matar o hacker, por conta das denúncias que este fez contra ele.

Patrick Brito chegou a ser preso na Servia, depois que o governo brasileiro pediu sua extradição, mas foi solto e agora está prestes a obter asilo naquele país, já que corre o risco de ser assassinado no Brasil, vítima de queima de arquivo.

O hacker está cada vez mais desenvolto em suas declarações, embora diga que tenha medo de morrer. A violência é um traço marcante de sua trajetória. Ele tem 30 anos de idade e, aos sete, perdeu o pai, executado com 6 tiros, alguns na cabeça.

Um ano antes, em 2000, o pai já tinha sido alvo de atentado, e havia ficado paraplégico. Em Araçatuba, o que se diz é que foi queima de arquivo. Frank Renan Alves de Brito, o pai de Patrick, teria sido ligado à banda podre da polícia e também a quadrilhas de desmanche de carros.

Dois tios de Patrick já foram presos por tráfico. O hacker foi criado pela mãe, que permaneceu solteira depois da gravidez. Frank era primo dela em primeiro grau.

“Lembro muito pouco do meu pai. A última imagem que tenho dele é ele me levantando e me passando numa máquina dessas de amolar peças. Era uma brincadeira dele. Tinha brincadeira dessas. Me lembro dessa cena”, disse Patrick.

Mesmo com essas dificuldades, o hacker sempre foi bom aluno. “Gosto muito de exatas e ensinava os colegas”, contou. Quando tinha 16 anos, redigiu um projeto de lei de apoio do Estado a pequenos agricultores, e foi selecionado para visitar a Assembleia Legislativa de São Paulo, dentro do programa Parlamento Jovem.

Quando teve a oportunidade de usar o microfone, questionou o então presidente da Assembleia, Barros Munhoz, sobre as denúncias de corrupção que pesavam contra ele. Tentaram lhe cassar a palavra, mas Patrick seguiu adiante.

O hacker diz que sua satisfação é revelar o que os poderosos tentam esconder. Sua ação é um caso de polícia, claro, mas não deixa de ser também uma ação política. Pelo que tem falado e mostrado, Patrick é nitroglicerina pura.

É preciso ouvi-lo, e as instituições têm o dever de apurar tudo, recolher as provas que tem, buscar outras e punir os culpados.

Quem tem medo de Patrick Brito?

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Abaixo, a videorreportagem realizada a partir da entrevista do hacker à TV 247.

Joaquim de Carvalho

Colunista do 247, foi subeditor de Veja e repórter do Jornal Nacional, entre outros veículos. Ganhou os prêmios Esso (equipe, 1992), Vladimir Herzog e Jornalismo Social (revista Imprensa). E-mail: [email protected]

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