Questão de saúde pública, hanseníase ainda é causa de preconceito e discriminação

Não há perda de partes do corpo em casos de hanseníase. Além disso, em razão de puro desconhecimento, esse estigma causa discriminação e preconceito com a doença e o doente

Rossana Vasconcelos
Publicada em 17 de janeiro de 2022 às 15:40
Questão de saúde pública, hanseníase ainda é causa de preconceito e discriminação

Desde 2016, o Ministério da Saúde realiza a campanha Janeiro Roxo, de conscientização sobre a hanseníase. Doença milenar – segundo registros médicos, uma das mais antigas da história da humanidade –, a hanseníase é uma enfermidade infecciosa e contagiosa que evolui de forma crônica e atinge pessoas de qualquer faixa etária. Ela afeta, principalmente, nervos, mucosas (como a boca, por exemplo), olhos e pele, mas é passível de diagnóstico precoce e tratamento. Atualmente, o Brasil é o segundo país do mundo no ranking de todos que ainda registram casos da doença. Em razão disso, a condição é tratada como questão de saúde pública e tem tratamento gratuito pelo SUS.

Segundo Boletim Epidemiológico publicado pelo Ministério da Saúde no início de 2021, de todos os casos registrados nas Américas em 2019, 93% foram no Brasil – o que mostra a importância do combate à doença enquanto ameaça à saúde pública. O diagnóstico tardio representa maior ônus para o sistema de saúde e, principalmente, um grande ônus para o doente que, além de enfrentar todos os problemas desencadeados pela doença em si, passa a conviver também com o medo da rejeição.

O estigma causado pela hanseníase - que, entre outros enganos, diz que as pessoas doentes “perdem” partes do corpo - é um fenômeno observado em todo o mundo, provocado principalmente pelas incapacidades e deformidades causadas pelos casos graves da doença. Não há perda de partes do corpo em casos de hanseníase. Além disso, em razão de puro desconhecimento, esse estigma causa discriminação e preconceito com a doença e o doente.

O contágio se dá de uma pessoa para a outra, por meio de convivência muito próxima e caso haja contato, também muito próximo, e prolongado com as secreções expelidas por alguém que tenha a doença (gotículas de fala, tosses ou espirros). Importante salientar que tocar a pele de um portador não transmite a hanseníase, e a maioria das pessoas possui uma boa resistência contra o causador da doença, a Mycobactherium leprae, sendo, portanto, resistente a ela.

A forma inicial da hanseníase pode se manifestar apenas como uma mancha (geralmente mais clara que a pele, podendo ser também acastanhadas ou avermelhadas) com perda de sensibilidade local. Há outros sintomas comuns, entre eles a sensação de formigamento, fisgadas ou dormência nas extremidades, áreas da pele com aparência normal, mas com alteração da sensibilidade e da secreção de suor, caroços e placas em qualquer local do corpo e força muscular reduzida (dificuldade para segurar objetos, por exemplo).

Qualquer pessoa, de qualquer sexo ou idade, pode ter hanseníase. Contudo, em razão de centenas de estudos realizados, hoje se sabe que existe, sim, um componente genético associado à doença (o que torna algumas pessoas mais suscetíveis a ela). Desta forma, o entendimento da comunidade médica é que parentes de pessoas com a doença têm mais chance, proporcionalmente, de contrair a doença.

Quando curados, os pacientes de hanseníase podem ter sequelas que vão desde a diminuição da sensibilidade no local das lesões até deformidades e incapacidades físicas irreversíveis, quando a condição atinge níveis mais graves.

O cuidado mais importante a ser tomado pelo portador dessa enfermidade é iniciar o tratamento assim que a doença for diagnosticada, para evitar sequelas. Os demais cuidados variam com o grau e local das lesões, sendo as lesões em nervos as mais relevantes. É imprescindível que todos os pacientes com os sintomas citados acima e aqueles que convivem ou conviveram com pessoas com diagnóstico de hanseníase sejam examinados no mínimo uma vez ao ano por um dermatologista, para que o profissional mapeie possíveis alterações. Assim, é possível manter um controle da doença e a qualidade de vida do paciente monitorado.

* Rossana Vasconcelos é dermatologista e professora do curso de Medicina da Universidade Santo Amaro – Unisa.

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