STF atende OAB e declara constitucionalidade da Lei de Cotas no serviço público federal

"É com muita satisfação que recebo a decisão do Supremo Tribunal Federal em confirmar a constitucionalidade da Lei de Cotas, que prevê a reserva de 20% das vagas em órgãos públicos federais para negros”, afirmou Lamachia.

Com informações do STF e Correio Braziliense.
Publicada em 11 de junho de 2017 às 13:08
STF atende OAB e declara constitucionalidade da Lei de Cotas no serviço público federal

Brasília – O presidente nacional da OAB, Claudio Lamachia, comemorou  a decisão do Supremo Tribunal Federal, que concluiu o julgamento da Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) 41 e reconheceu a validade da Lei 12.990/2014, que reserva 20% das vagas oferecidas em concursos públicos para provimento de cargos efetivos e empregos públicos no âmbito da administração pública federal direta e indireta, no âmbito dos Três Poderes. A decisão foi unânime.

"É com muita satisfação que recebo a decisão do Supremo Tribunal Federal em confirmar a constitucionalidade da Lei de Cotas, que prevê a reserva de 20% das vagas em órgãos públicos federais para negros”, afirmou Lamachia.

O presidente relembrou que o STF tomou a decisão em ação proposta pela OAB, com base no trabalho da Comissão Nacional da Verdade da Escravidão Negra no Brasil. Lamachia fez uma saudação especial ao presidente da comissão, Humberto Adami, pelo seu trabalho abnegado na defesa do tema.

Lamachia esclareceu ainda que a posição do Judiciário não vinha sendo uniforme, o que tem gerado situações de insegurança jurídica em concursos públicos federais. Além disso, declarações de inconstitucionalidade da Lei de Cotas por outras instâncias da Justiça contrariavam a posição do próprio STF pela validade das cotas.

A lei pretende criar ações afirmativas de combate à desigualdade racial e proporcionar mais representatividade aos negros e pardos no serviço público federal. O processo de inclusão passa pela ampliação de oportunidades oferecidas pelo sistema escolar, pelo estado e pelo mercado de trabalho.

“Dessa forma, a decisão do STF reforça ações que combatem a desigualdade, o que deve ser muito festejado por toda a sociedade. Hoje foi dado mais um passo em direção à igualdade de oportunidades num país que ainda sofre com a desigualdade", ressaltou Lamachia.

O ex-presidente nacional da entidade e presidente da Comissão Nacional de Direito Constitucional da OAB, Marcus Vinicius Furtado Coelho, afirmou que a decisão é “uma histórica vitória da afirmação da igualdade de todos os brasileiros. Uma dívida histórica do Brasil. A nação fica mais republicana com essa decisão”.

Já, Humberto Adami, comemorou a decisão e afirmou que outras ações afirmativas virão em breve para a população afrodescendente e de toda a população brasileira.

O julgamento teve início em maio, quando o relator, ministro Luís Roberto Barroso, votou pela constitucionalidade da norma. Ele considerou, entre outros fundamentos, que a lei é motivada por um dever de reparação histórica decorrente da escravidão e de um racismo estrutural existente na sociedade brasileira. Acompanharam o relator, naquela sessão, os ministros Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Rosa Weber e Luiz Fux.

Na sequência do julgamento na sessão desta quinta (8), o ministro Dias Toffoli lembrou, em seu voto, que quando exercia a função de advogado-geral da União, já se manifestou pela compatibilidade de ações afirmativas – como a norma em questão – com o princípio da igualdade. Para o ministro, mais do que compatível com a Constituição, trata-se mesmo de uma exigência do texto maior, em decorrência do princípio da isonomia prevista no caput do artigo 5º.

Esse entendimento, inclusive, prosseguiu o ministro, está em sintonia com a jurisprudência do STF, que já confirmou a constitucionalidade da instituição da reserva de vaga para portador de deficiência física, bem como a constitucionalidade do sistema de cotas para acesso ao ensino superior público.

O ministro explicou, contudo, que seu voto restringe os efeitos da decisão para os casos de provimento por concurso público, em todos os órgãos dos Três Poderes da União, não se estendendo para os Estados, Distrito Federal e municípios, uma vez que a lei se destina a concursos públicos na administração direta e indireta da União, e deve ser respeitada a autonomia dos entes federados.

O julgamento do Supremo na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 186, quando foi confirmada a constitucionalidade do sistema de cotas raciais para ingresso nas universidades públicas, foi citada pelo ministro Ricardo Lewandowski em seu voto. Ele recordou que em sua gestão à frente do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), foi editada a Resolução 203/2015, que reservava 20% de vagas para os negros no âmbito do Poder Judiciário. A resolução levou em conta, segundo ele, o primeiro censo do Judiciário realizado pelo Conselho, que apontou que apenas 1,4% dos juízes brasileiros se declararam negros, e apenas 14% pardos, dados que divergiam dos números do censo demográfico brasileiro de 2010, do IBGE, segundo o qual o percentual da população brasileira que se declarou negra foi de 7,6% e parda 43,1%.

O ministro Marco Aurélio revelou que, nos anos de 2001 e 2002, quando ocupou a presidência do STF, e diante de quadro que persiste até os dias atuais, determinou que fosse inserida em edital para contratação de prestadores de serviço a exigência de reserva de 30% das vagas para prestação de serviços por negros. Para o ministro, uma sociedade justa e solidária repousa no tratamento igualitário, mas é notória a falta de oportunidade para os negros, frisou o ministro, concordando que as estatísticas sobre a questão são vergonhosas.

O decano do Supremo, ministro Celso de Mello, iniciou seu voto citando a história do advogado Luiz Gama (1830-1882), que ficou conhecido como advogado dos escravos, para demonstrar “como tem sido longa a trajetória de luta das pessoas negras em nosso país na busca não só de sua emancipação jurídica, como ocorreu no século XIX, mas de sua emancipação social e de sua justa, legítima e necessária inclusão”.

Ao defender as políticas de inclusão, o decano salientou que de nada valerão os direitos e de nenhum significado serão revestidas as liberdades se os fundamentos em que esses direitos e liberdades se apoiam, além de desrespeitados pelo Poder Público ou eventualmente transgredidos por particulares, também deixarem de contar com o suporte e o apoio de mecanismos institucionais, como os proporcionados pelas políticas de ações afirmativas.

Para o ministro, “sem se reconhecer a realidade de que a Constituição impõe ao Estado o dever de atribuir a todos os que se situam à margem do sistema de conquistas em nosso país a condição essencial de titulares do direito de serem reconhecidos como pessoas investidas de dignidade e merecedoras do respeito social, não se tornará possível construir a igualdade nem realizar a edificação de uma sociedade justa, fraterna e solidária, frustrando assim um dos objetivos fundamentais da República, a que alude o inciso I do artigo 3º da Carta Política”.

Com base não só nos fundamentos já trazidos por todos os ministros, mas também no princípio do direito à busca da felicidade, o ministro se manifestou pela constitucionalidade de medidas compensatórias como a inserida na lei em questão.

Ao também reconhecer a constitucionalidade da norma em debate, a ministra Cármen Lúcia salientou que muitas vezes o preconceito – contra negros ou contra mulheres, entre outros – é insidioso e existe de forma acobertada, e outras vezes é traduzido em brincadeiras, que nada mais são do que verdadeiras injúrias, que indignam. Para a presidente do Supremo, ações afirmativas como a que consta da Lei 12.990/2014 demonstram que "andamos bem ao tornar visível o que se passa na sociedade".

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