Trama golpista é o filé da delação verde-oliva
"O caso das articulações para desmoralizar as urnas eletrônicas e promover uma intervenção nas instituições do Estado Democrático de Direito, é o filet mignon"
Mauro Cid (Foto: Geraldo Magela/Agência Senado)
Os integrantes da atual cúpula das Forças Armadas têm lá suas razões para ver com bons olhos a delação premiada do tenente-coronel Mauro Cid. Segundo um deles, é uma chance de "separar o joio do trigo”, a partir de nomes de militares que venham a ser entregues, e virar a página. Quem não for mencionado pode então seguir em frente e sair dos holofotes — o que, nessa visão, compensaria o grande constrangimento que o modelito farda-tornozeleira eletrônica trouxe, por exemplo, neste fim de semana em que Cid saiu da cadeia. A ver. Até porque, que ninguém se iluda, os citados podem não ser tantos assim. E, sem passar por depuração mais profunda, a instituição corre o risco de ter problemas mais adiante por seguir carregando joio golpista entre ramos de trigo.
Quem fizer previsões detalhadas sobre os caminhos de uma delação premiada estará mentindo. Mas quem conhece os investigadores da PF e do STF crê que o ministro Alexandre de Moraes não teria homologado a colaboração de Cid tão rapidamente — e nem acolhido tão prontamente o pedido da defesa para soltá-lo — se não tivesse recebido, em troca, sinalização de que virá chumbo por aí.
Nessa perspectiva, o caso que mais poderá avançar com as informações do ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro é a investigação da trama golpista. Na prática, há lacunas a serem preenchidas no inquérito sobre a venda de joias presenteadas ao Estado, sobretudo em relação à ordem ao tenente-coronel para vendê-las — e só ele poderá confirmar se vieram do ex-presidente. Haveria também pontos a esclarecer no caso da falsificação das carteiras de vacinação. Mas essas investigações caminham bem e talvez não justificassem, pelo que se sabe até agora, o esforço por um acordo de delação.
O caso das articulações para desmoralizar as urnas eletrônicas e promover uma intervenção nas instituições do Estado Democrático de Direito, porém, é o filet mignon da colaboração de Mauro Cid — não por acaso celebrada no inquérito das milícias digitais. Essa investigação vem se abrindo em numerosos tentáculos, que vão das conversas de Bolsonaro com o senador Marcos Do Val às incursões do hacker Walter Delgatti no Alvorada e na Defesa, passando pelas minutas de golpe encontradas pela PF no armário de Anderson Torres e no celular do ex-auxiliar.
Além de detalhes sobre conversas desses personagens com o então presidente, Cid pode contar, por exemplo, de quem recebeu o roteiro golpista que previa decretação de GLO e fechamento do TSE. Pode dar conta de reuniões no Planalto em que o assunto teria sido discutido com generais como Augusto Heleno, Luiz Ramos e Braga Netto. Pode confirmar tratativas para o então ministro da Defesa, Paulo Sérgio, receber Delgatti no Ministério.
Mauro Cid pode, se quiser, contar muito mais, coisas que não conseguiríamos sequer imaginar, envolvendo militares que nem estão ainda nas investigações. Pode. Se quiser. Aí é que está. O tenente-coronel é o dono da delação, por mais que tenha prometido na negociação. Pode entregar os generais do Planalto e fazer algo mais minimalista em relação a Bolsonaro — afirmando, por exemplo, que o ex-presidente apenas ouviu as conversas golpistas. Cid provavelmente entregará o ex-chefe no caso das jóias, que rende processo por peculato e lavagem de dinheiro. Já a tentativa de armar um golpe de Estado é crime bem mais grave, e o depoente pode dizer que não tem provas disso.
Por outro lado, o tenente-coronel, cuja colaboração tem o objetivo maior de salvar o pai, general Lourena Cid, e a mulher, Gabriela, certamente estará mirando o futuro ao falar. O futuro dele passa pelo Exército — a depender da sentença que receber no STF, pode ser expulso da Força. Ou não, caso agrade a seus superiores de hoje com uma espécie de delação-reversa. Agradaria muito, por exemplo, um relato detalhado da versão que propagam nos bastidores — a de que foram seus comandantes que evitaram o golpe quando Bolsonaro e os trogloditas o propuseram.
Quem viver, verá. No momento, tudo são especulações. Mas há muito mais em jogo do que a cabeça de um ex-capitão.
Helena Chagas
Helena Chagas é jornalista, foi ministra da Secom e integra o Jornalistas pela Democracia
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