Venci a Covid: Carolina Brazil conta como encarou a quarentena em casa

Jornalista da Rede Amazônica contou como foram os dias de isolamento em casa, com muita reflexão, leitura e produção de textos sobre a rotina de enfrentar a doença. Ela conversou para o Tudo Rondônia com o jornalista Felipe Corona.

Felipe Corona/Tudorondonia
Publicada em 26 de dezembro de 2020 às 10:58

Ela é um dos rostos mais conhecidos da Rede Amazônica Rondônia: Carolina Brazil. Ela tem 41 anos, nascida em Jandaia do Sul, Norte do Paraná. Mora em Porto Velho há 21 anos. É jornalista e trabalha na afiliada da Globo há mais de 15 anos. Desde 2018, edita e apresenta o programa Rondônia Rural.

Tudo Rondônia - O que você achava dessa doença no começo da pandemia, lá no mês de março, quando ela mal tinha chegado no Brasil?

Carolina Brazil - No início de março estive na Terra Indígena Rio Branco, em Alta Floresta do Oeste, fazendo uma reportagem sobre um aplicativo de celular usado por indígenas para calcular os custos da produção de castanha dentro da floresta. A viagem foi rápida, apenas um dia de gravação, mas muito produtiva. E na estrada, entre os assuntos com o cinegrafista eram os noticiários, que davam cada vez mais informações sobre os casos no Brasil.

Ainda na segunda quinzena de março bateu a dúvida se faríamos ou não o primeiro Café com Conteúdo das AgroMulheres de Rondônia, movimento da qual eu faço parte. Junto com a comissão organizadora providenciamos álcool em gel para as quase 200 participantes de vários municípios de Rondônia. O evento foi sábado de tarde num galpão de uma fazenda perto de Ariquemes. Na época, o uso de máscara ainda não era obrigatório e não tivemos relatos de pessoas contaminadas após o evento. Na semana seguinte, as restrições impostas por decretos começaram a ser intensificadas pelo poder público e a rotina começou a mudar pra muita gente.

TR - Como e quando você descobriu que estava com a doença?

CB - Dia primeiro de junho foi meu aniversário numa segunda-feira. Já estava em sistema de trabalho em homeoffice (indo pra TV gravar e editar o programa em dois dias da semana). Ganhei bolo de alguns colegas de trabalho (via delivery) e permaneci em casa com a família. No dia seguinte acordei estranha. Dores nas costas, na região das costelas e na cabeça (coisas que não costumo ter). Tomei café da manhã e voltei pra cama. O corpo com aquela sensação de gripe, mas não tinha coriza e nem espirros. Na quarta-feira, os mesmos sintomas. Tomei analgésico para aliviar a dor nas costas. Mas, a moleza e vontade de ficar deitada permaneceram. Na sexta-feira, minha filha que era interna de medicina na época, começou a desconfiar e a monitorar batimentos cardíacos, frequência respiratória, pressão arterial, febre. Ao conversar com colegas médicos e analisar os sintomas, mesmo com exames clínicos normais, veio a suspeita de Covid-19. Na mesma noite, por orientação de um médico, amigo da família, começamos o tratamento com a medicação polêmica e isolamento total no meu quarto.

TR - Como você passou por ela? Como foi o tratamento? Chegou a ficar na UTI? Ser intubada?

CB - Perdi olfato, paladar, não tive febre nenhum dia, nem tosse, pouca coriza e logo passou. Muito cansaço, de quase não conseguir ir ao banheiro e voltar pra cama. Com as orientações médicas e os cuidados da filha, estudante de medicina e do marido, não precisei ser internada. As medicações injetáveis e orais eram feitas em casa mesmo. Saí apenas para fazer exames e permaneci no quarto por 15 dias em quarentena.

TR - Você chegou a ter medo em algum momento?

CB - Na semana que começaram os sintomas, ou seja, início de junho, nosso sistema de saúde estadual, tanto público quanto particular entrou em colapso. Faltavam leitos clínicos, UTI, médicos, medicação nas farmácias, por conta da corrida em busca de prevenção. Confesso que tive medo em ver meus colegas de trabalho dando notícias de hospitais lotados e o aumento de infectados e mortos. Como jornalista, passei a escrever e relatar o que estava acontecendo. Acho que isso me manteve com a mente sadia diante de tantos acontecimentos ruins. Incentivei uma amiga jornalista a criar uma página onde as pessoas pudessem contar o que quisessem durante essa pandemia. O ‘Para Externar’ abriga relatos e desabafos de um momento nunca vivido nos últimos tempos pela humanidade mundial. E eu sobrevivi diante das milhares de mortes e hoje estou aqui para contar...

TR - Como sua família reagiu à doença? Eles também foram infectados?

CB - Somos uma família de profissionais essenciais, em meio a uma pandemia. Saúde, comunicação e produção de alimentos. Ninguém parou totalmente, apenas redução de jornada de trabalho. Não posso afirmar com exatidão onde me contaminei, mas acredito que, pelo fato da minha filha mais velha ter contato com postos de saúde por conta do último ano de faculdade, pode ter trazido o vírus pra dentro de casa. Na roupa, calçado ou algum acessório. Ela também fez o teste rápido e testou positivo para Covid-19 na mesma época em que eu estava com a doença, porém ela esteve totalmente assintomática e cuidou de mim o tempo todo. Meu marido, que é médico veterinário e a filha mais nova não tiveram sintomas e nem testaram positivo para a doença.

TR - Como foi a reação do público que te acompanha? Muitas manifestações de carinho? Orações? Soube de tudo?

CB - Preferi ficar em silêncio. Apenas familiares e amigos próximos souberam durante o período de quarentena. Mas depois dos 15 dias de isolamento sozinha dentro de um quarto, a alegria de vencer é tão grande, que postei o vídeo das minhas filhas fazendo surpresa. Pra mim, receber o abraço delas, flores e uma caixa de doces simbolizou o fim de um ciclo e o início de outro muito mais vibrante. A partir daí a reação e comoção das pessoas foram manifestadas de várias formas nas redes sociais, telefonemas, presentes. Antes do meu retorno ao trabalho também participei ao vivo de casa do JRO1 com a Yonara Werri e o público que acompanha a Rede Amazônica também soube que estava tudo bem comigo.

TR - E após a saída do hospital ou da quarentena? Como foi?

CB - Depois da quarentena pude voltar a frequentar outros cômodos da casa. Mas o cansaço ainda era bastante persistente. Subir escada, arrumar a mesa para o almoço, a cama, varrer... Tudo ainda era bem cansativo. Então, foi preciso fazer fisioterapia respiratória para melhorar a passagem do ar pelos pulmões. Foram 10 sessões e logo senti a melhora em retomar atividades simples.

TR - Teve alguma sequela grave? Ainda está fazendo tratamento após algum tempo de curada?

CB - Não tive sequela grave. Olfato, às vezes sinto que ficou meio diferente do que era antes, porque por muito tempo sentia apenas cheiro de fumaça, depois melhorou. Hoje faço atividade física remota e mantenho minha rotina normal.

TR - Qual a sua reação com o novo pico de casos em Rondônia?

CB - Lamento profundamente que voltamos ao aumento de casos e mortes no estado. Porque não tem como saber quem vai agravar ou não. Quem vai precisar de UTI ou não. Caso tenha se contaminado, o melhor a fazer ainda é o isolamento para evitar a contaminação de outras pessoas. Precisamos parar esse vírus. Ainda estamos sem a vacina!

TR - Qual o seu recado para quem está enfrentando a doença, já enfrentou, e principalmente, quem não leva à sério o vírus?

CB - Para uma pessoa agitada como eu ficar tanto tempo sozinha e debilitada dentro de um quarto não foi fácil. Passar o Dia dos Namorados com o marido dentro da mesma casa e sem poder abraçar porque você tem uma doença muito contagiosa e ninguém pode chegar perto, faz a cabeça girar em muitas reflexões e aprendizados. Mas aproveitei para repensar tantas coisas que estavam no “automático” da vida.

A importância da família na minha vida é muito evidente e ficou ainda mais. Estar com eles ali, mesmo que naquelas condições, foi marcante e profundo. Entendo que é perto deles que quero ficar cada vez mais. Também entendo que o emprego, o salário, a rotina corrida são importantes, mas não mais do que a vida na sua essência. Eu ganhei mais uma chance para continuar contando histórias. Minhas ou de outras pessoas, lugares, momentos, sonhos. Será que as pessoas que não estão acreditando neste período de transformação do universo vão ter mais uma chance?

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