Viva a burrice
A ridícula ideia de nomear um filho como embaixador é suficiente como exemplo
Eduardo Bolsonaro e Jair Bolsonaro (Foto: Reprodução)
Apesar dos tempos bicudos que vivemos, há uma maneira fácil de ganhar um dinheirinho: apostar que, na hora em que tomar qualquer decisão, o capitão Bolsonaro fará uma burrice. Problema talvez seja encontrar quem aceite a aposta inversa.
A ridícula ideia de nomear um filho como embaixador é suficiente como exemplo. Estava vago o posto de embaixador nos Estados Unidos e o que faz Bolsonaro? Sai-se com uma invenção tosca.
Perderia seu dinheiro quem apostasse que manteria o atual embaixador ou nomearia alguém à altura. Filho, desqualificado e em Washington, alguém imaginaria que o capitão fosse capaz de tanta burrice? Pois foi.
A relação que com ele guarda uma parte da elite a obriga a procurar algum sentido em suas patuscadas. Não é que apareceu um diretor da Confederação Nacional da Indústria para declarar que o filhinho embaixador faria milagres, alavancando as exportações brasileiras? Pode haver quem tente tirar leite das pedras, mas o fato permanece: foi mais uma burrice, das grossas.
E viva as burrices! O apetite do capitão para cometê-las é uma das razões para ter certeza de que sua passagem pelo primeiro plano de nossa vida politica será breve.
Houve um momento em que era possível que Bolsonaro se tornasse uma liderança respeitável, capaz de representar uma parcela significativa de nossa sociedade, logo após a vitória no segundo turno da última eleição.
Naquela altura, um político inteligente poderia, até com facilidade, agregar outro terço do eleitorado ao que votara em seu nome, constituído pelas pessoas menos politizadas e de menor participação. Estava a seu alcance chegar ao final de 2018 tendo-as a seu lado, o que o tornaria uma figura política de primeira grandeza. Bastava que não fosse o velho capitão Bolsonaro, sempre a fazer burrices, mas era.
Completa seis meses de governo em situação frágil, com Moro e a Lava Jato desmoralizados, e o horizonte nublado. Não por acaso, põem-se a assobiar no escuro, tentando afastar os fantasmas da insignificância e da impopularidade, fingindo-se animado com as chances de reeleição. Faz o mesmo que seu amigo Michel Temer, que se pavoneou como candidato “forte” durante uns três meses em 2017, para terminar assistindo a eleição pela televisão, escondido no Palácio do Jaburu.
As pesquisas mostram que Bolsonaro foi incapaz de expandir sua base de apoio desde a eleição. Os números da avaliação positiva que preserva sugerem que não conseguiu incorporar praticamente ninguém, nem entre as pessoas que votaram em Haddad, nem entre quem ficou indiferente a ambos.
Há de haver várias razões para isso e uma delas é a burrice de Bolsonaro, que o faz achar que precisa dialogar apenas com seus eleitores, supondo que, com eles, ganha toda eleição. Ou então que, à custa de mutretas como as que o beneficiaram em 2018, conseguirá impedir que qualquer adversário o derrote.
O capitão, ao que tudo indica, acredita que seu eleitorado é estável e homogeneamente ideológico, constituído por pessoas movidas a chavões da ultradireita primitiva. Essa gente existe, fantasiada de verde-amarelo, falando besteiras e seguindo perfis que disseminam idiotices na internet. Mas não passa de uma pequena minoria, que se pode estimar em algo próximo a 10% da população.
Muito mais que a metade dos eleitores que votaram em Bolsonaro nem sabe qual é sua ideologia, nunca ouviu falar em anticomunismo, anti-esquerdismo ou bobagens do gênero. São pessoas que acreditaram que o capitão entregaria, no curto prazo, três resultados palpáveis: a retomada do crescimento econômico, com mais renda e empregos, o aumento da segurança, com a derrota da criminalidade, e a regeneração dos costumes políticos. E, se há hoje uma certeza, é que nenhuma delas está acontecendo ou ocorrerá em seu governo.
É apenas uma questão de tempo para que o terço de apoio do capitão comece a minguar. Com a qualidade de sua turma e da liderança que exerce, não há hipótese de que consiga, em prazo razoável, entregar aquilo com que se comprometeu. A cada nomeação canhestra, a cada escolha despropositada de prioridades, a cada iniciativa sem pé nem cabeça, a possibilidade de que faça um bom governo fica mais remota e menor sua sustentação.
Não será pequeno o custo social em que implicará, nem bonito o espetáculo do fracasso administrativo do governo do capitão Bolsonaro, mas já entrou em cartaz e logo estará à vista de todos. Graças, em parte relevante, à sua burrice.
*Marcos Coimbra é sociólogo e presidente do Instituto Vox Populi
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