ZÉ ATRACA - UM REGISTRO DIFÍCIL

“Zé, minha dívida só está crescendo com você e nem sei se vou poder pagar”, eu dizia sempre, a última vez faz menos de duas semanas

Lúcio Albuquerque
Publicada em 30 de outubro de 2021 às 12:28
ZÉ ATRACA - UM REGISTRO DIFÍCIL

Há muitos anos procuro anotar fatos importantes da história rondoniense, há coisa de dois anos incluídos na coluna “O Dia na História”, cujo destaque especial sempre é fato ligado a Rondônia. Essa madrugada ouvi o celular tocar, bem baixo porque sempre coloco no “silencioso”, e como tenho sono leve, vi o que era. E não era notícia boa: acabara de falecer o Zé Catraca. 

Não deu mais para voltar ao sono. Na minha vida profissional e na minha pessoal tenho feito registros de passagens (que eu chamo “pegar o expresso da meia noite”) de muitos, alguns mais difíceis, como quando de comunicar a irmãos falecimentos de nossos pais e, depois, de dois dos irmãos. Incluir o Zé na relação de fatos importantes de Rondônia, foi duro. 

Zé Catraca, ou Silvio Santos, duas formas de identificação numa só pessoa, tornou-se um nome que, relativo a cultura rondoniense, tornou-se uma espécie de “bombril”: ativista cultural, jornalista, escritor, músico, amo de boi, fundador do arraial Flor do Maracujá, compositor, fundador da Banda do Vai Quem Quer, membro da Academia Rondoniense de Letras, ocupante da cadeira 40 cujo patrono é o poeta José Ailton Bahia, a lista é grande. Um nome que em Rondônia não precisava de apresentação.

Garoto ainda ia vender no Mercado Público, sacos, feitos de sacos de cimento, para ajudar a gerar o “de comer” para sua casa. Depois arrumou um “bico” na oficina do Alto Madeira, a seguir foi ser operador de som da rádio Caiari e dali para A Tribuna onde, por sugestão do diretor Rochilmer Rocha inaugurou a coluna “Atraca” nome indicado pelo carnavalesco Manelão, tirado do bloco que eles participavam. 

De “Atraca” veio o personagem Zé Catraca, sugestão do editor do Diário da Amazônia Valdir Costa, e foi com esse arranjo que o garoto Sílvio Santos praticamente cunhou uma nova “identidade”. Numa das muitas conversas que tive com ele sempre repetia que o apelido “catraca”  vinha desde quando ajudante de tipógrafo, no Alto Madeira, o editor João Tavares o chamava alegando que falava muito.

Quando escrevo a coluna “Dia na História” uso informações e tenho auxílio de uma gama imensa de livros, registros e pessoas, muitas dessas não mais residindo em Rondônia, quando tenho dúvidas, especialmente com relação a fotografias. 

Essa pandemia já havia levado duas fontes constantes de consultas, os historiadores Francisco Matias e Anísio Goraieb, cuja falta no nosso dia-a-dia se faz sentir e não apenas por mim, tenho certeza. O Zé Catraca há tempos que estava na lista de consultores. 

“Zé, minha dívida só está crescendo com você e nem sei se vou poder pagar”, eu dizia sempre, a última vez faz menos de duas semanas. Agora, como com os outros dois, minha forma de saldar meu débito é honrar suas memórias.

Quando um personagem da nossa história “viaja” eu digo que ele “pegou o expresso da meia noite” e foi para o Valhalla - o céu dos heróis vikings. Com certeza lá já está encontrando a professora Marise Castiel, que deu ao então jovem compositor a responsabilidade de compor uma das grandes joias do nosso carnaval, “Odaiá Bahia”; na fila dos abraços também o cabeleira, da Diplomatas; os jornalistas Rochilmer Rocha e Euro Tourinho.

Para não alongar muito a lista, o respeitável Dom João Batista Costa, nosso primeiro e mais lembrado bispo que já tivemos, também estava lá, assim como o Manelão, que com o Zé e mais um grupo de amigos fundou a “Vai quem Quer”, cujo hino tem uma história.

Em artigo (*) de autoria do próprio Zé Catraca, ele conta: “Em 1980 eu estava desempregado e o Narciso Freire, do Cartório de Imóveis, me conseguiu um emprego. Bom, quando ficou decidido que Porto Velho teria sua Banda, o Narciso chegou ao cartório e foi logo me dizendo, "sua permanência no emprego fica condicionada a composição do Hino da "Banda do Só Vai Quem Quer", te vira!".

Ao meu amigo Zé Catraca, minha oração a que ele tenha sido bem recebido entre os eleitos do Senhor!
P.S. – Muito da mudança de comportamento do Zé Catraca se deve a uma pessoa muito especial em sua vida, a esposa Ana Santos, jornalista. De minha família, a ela, o desejo que consiga superar mais essa provação.

(*) https://www.gentedeopiniao.com.br/colunista/silvio-santos/banda-do-vai-quem-quer-a-verdade

Comentários

  • 1
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    Dolores 25/03/2023

    poderia disponibilizar o artigo, por favor

  • 2
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    Josemar Freire Botelho 30/10/2021

    Zá ATRACA seria o mesmo Zé KATRACA?

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Estação saudade

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É muita a gratidão a Silvio Santos pelo tanto que contribuiu com nossa herança cultural