A intentona bolsonarista de 8 de janeiro não foi contra Lula

Foi uma tentativa de golpe ao Estado democrático de direito, com planejamento, croqui e tudo o mais

Francisco Calmon
Publicada em 02 de maio de 2023 às 14:54
A intentona bolsonarista de 8 de janeiro não foi contra Lula

(Foto: Joedson Alves/Ag. Brasil)

 

A invasão e o vandalismo foram às sedes dos três PODERES da República.   

Foi uma tentativa de golpe ao Estado democrático de direito, com planejamento, croqui e tudo o mais.

Qual era o plano do golpe?

FASE 1 – Gerar o caos, através das invasões e depredações, bem violentas, nas sedes dos Poderes da República.  

Para isso, as filmagens eram realizadas sem qualquer constrangimento; assim como os militares bolsonaristas do GSI também não se preocupavam em serem filmados, fotografados e até sendo garçom de água mineral, como se estivessem entre os seus (ou estavam mesmo?), pois assistiram passivos, omissos, coniventes, com os crimes de invasão e destruição do patrimônio nacional.  

Quanto maior a balburdia dos lumpem vandálicos, mais retumbante seria a divulgação para a comoção pretendida.  

A tranquilidade e exposição dos participantes, demonstraram que eles estavam desempenhando o papel previsto no planejamento e convictos de que o golpe seria vitorioso.  

FASE 2 - Evitar que as forças de segurança impedissem as selvagerias até que elas produzissem o estado de confusão, desordem, agitação, alvoroço, no país.   

Por isso, as ordens e contraordens entre as forças de segurança do DF, do Exército e do governo federal, terem sido tensas ao ponto de quase vias de fatos.  

FASE 3 - Acionar à GLO, mecanismo através do qual o Exército assumiria o controle da Lei e da Ordem no Distrito Federal.  

Qualquer dos poderes podendo acionar a GLO, segundo o artigo 142 da Constituição, com aprovação do Presidente e comandante-em-chefe das FFAA, coube ao Ministro da Defesa do governo, José Múcio, sugerir enfaticamente ao presidente e a outros colegas ministros, a última etapa do planejado golpe.  

FASE 4 – Com os blindados e tropas nas ruas, as sedes dos Poderes estariam sitiadas.  E o golpe concretizado.  

Provavelmente imporiam um Estado de exceção, sem a presença do Lula, óbvio. Mas, não só, outros estariam na lista, como o ministro Alexandre de Moraes.  

Por derivação da memória do golpe de 64, podemos presumir uma lista grande, incluindo alguns militares.

Quais os atores responsáveis pela etapa 1?

Qual a linha de comado e subalternos executores da etapa 2?  

Além do ministro Múcio, quais os militares, policiais e civis favoráveis a essa proposta da etapa 3 (GLO)?

Os setores de inteligência e informações das Polícias, das Forças Armadas e governo federal e do DF, não detectaram nada, nem um sinal de suspeição, de alarme?

A PGR poderia e deveria ter tomado que medidas antes, durante e depois?  

Seguir essas indagações vai levar à imputação e responsabilização penal, civil e administrativa, dos envolvidos diretos, intelectual e fisicamente, e indiretos, por omissão, negligência ou imperícia.  

Essa empreitada é dever de todos os poderes do Estado, mantenedores da Carta Magna e das leis vigentes.

Apurar, criminalizar e tomar medidas para que o Estado tenha mecanismos de prevenção para que nunca mais aconteça, requer reformas no sistema de segurança da sociedade, da democracia e do Estado de direito.

Continuo a defender a separação entre a Segurança e Justiça em dois ministérios.   

Um ministro que possa concentrar-se exclusivamente na segurança, com planejamento para curto, médio e longo prazo.  

A linha de defesa dos comandos insurgentes parece sustentar a tese do apagão ou desiquilíbrio mental. Nesse caso terá que provar proveniente de quê? Drogas, depressão, incapacidade para a função?  

Se foram drogas legais e mediante receita médica, terá que mostrar a receita, o código da moléstia, a data, a dosagem recomendada, a nota fiscal da compra do medicamento.  

E a partir de quando estavam sem as faculdades mentais e emocionais para desempenho de suas funções, e os atos decorrentes dali seriam invalidados?  

A história brasileira mostra que a conspiração não é uma teoria, mas um fenômeno político regular dos militares e das oligarquias que se postam como donas da nação.

As manifestações públicas de Múcio e do comandante do Exército de que o comando da GSI deve ser de militares, significa intromissão ao que cabe somente ao presidente.  

Aliás, registrasse de passagem, o atual ministro da Defesa gosta de uma mídia e palpitar onde não lhe cabe.

Lula deveria enquadrar o Múcio com estas palavras: qualquer assunto que não diga respeito diretamente a questão militar, à luz da Constituição, não opine publicamente, se for seguramente necessário à sua opinião, me consulte antes.  

Os militares são adestrados para conspiratas, são dissimulados, utilizam do jogo da informação e contrainformação para seus intentos. Basta examinar a história para comprovar.   

O governo anterior militarizado foi catastrófico na ética, na moralidade, na competência gerencial, sendo eficaz no genocídio da covid e do povo yanomamis.    

Quem o defenda aponte em qual área foi exitoso. E era um governo prenhe de militares!

É perfeitamente adequado um quadro de experiência nas Policias, na Diplomacia ou no MP, ocupar o comando do GSI.  

Quanto menos os militares ou seus representantes civis se manifestarem na política, mais protegida estará a democracia.   

Esse cenário já é extremamente preocupante, mas aumenta sobremaneira quando aliados defendem a manutenção do Aras na PGR e quando o presidente ouve muito, sem RH, e decidi mal nas indicações ao Judiciário. 

Não entender ou minimizar a importância e o poder que acalenta um Judiciário, já não é por falta de experiência, mas de não admitir e reconhecer as escolhas erradas do passado, causas do golpe de 2016, do encarceramento por 580 dias, da eleição das fakenews de 2018 e do bolsonarismo protofascista.    

Se a intentona concretizasse o golpe, os 30 mil esquerdistas, jurados de morte pelo Bolsonaro, o fechamento do STF com um jipe e um cabo, o Congresso suspenso, seriam promessas tornadas realidade.

Não estamos no país de Alice.

Francisco Calmon

Ex-coordenador nacional da Rede Brasil – Memória, Verdade e Justiça; membro da Coordenação do Fórum Direito à Memória, Verdade e Justiça do Espírito Santo. Membro da Frente Brasil Popular do ES

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