Artigo: Libertas quae sera tamen

A Magna Charta Libertatum, assinada em 1215 pelo Rei João da Inglaterra, inaugurou um longo processo histórico que se convencionou chamar de constitucionalismo...

Bruno de Menezes
Publicada em 15 de junho de 2018 às 13:30

Bruno Sérgio de Menezes Darwich[1]

A Magna Charta Libertatum, assinada em 1215 pelo Rei João da Inglaterra, inaugurou um longo processo histórico que se convencionou chamar de constitucionalismo, ao estabelecer a limitação do poder absoluto do monarca frente as garantias e liberdades individuais.

Em um de seus artigos de maior expressão está disposto (tradução livre a partir de uma versão em inglês):

"Nenhum homem livre será preso, aprisionado ou privado de uma propriedade, ou tornado fora-da-lei, ou exilado, ou de maneira alguma destruído, nem agiremos contra ele ou mandaremos alguém contra ele, a não ser por julgamento legal dos seus pares, ou pela lei da terra."

No Brasil, como resultado desse processo histórico, os “anos de chumbo” findaram-se com o advento da Constituição de 1988, que consagrou, formalmente, o modelo garantista, ao estabelecer, logo em seu art. 1º, a dignidade da pessoa humana como um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito, bem como ao condicionar, em seu art. 5°, inciso LXI, a segregação da liberdade às hipóteses de flagrante e de ordem fundamentada de autoridade judiciária, desde que presentes os requisitos e pressupostos constantes da legislação infraconstitucional.

Contudo, todo esse rico sistema de garantias acaba coexistindo com um crescente e preocupante discurso de ódio encampado por uma sociedade que parece viver em regime de guerra civil permanente.

Aterrorizado pela exploração midiática da violência, um número cada vez maior de pessoas guiadas por sentimento nem um pouco nobre, que encontra no ódio infundado o seu ápice, e distorcendo tudo o que vê, está cada vez mais disposto a “fazer justiça com as próprias mãos” como mecanismo para conter a violência, sem perceber que está a lançar ao chão marcos civilizatórios constituídos a ferro e fogo.

Mas o que, de significativo, fez com que o legado libertário da Magna Carta fosse açoitado pelo “novo tempo do mundo”[2], em que qualquer tentativa de construção de uma sociedade livre, justa e solidária parece se esfacelar diante da grotesca realidade social, tingida pela violência desmedida e por desvios morais de toda ordem?

A abertura dos mercados, a onda de privatizações, as taxas de juros exorbitantes, o regime cambial vulnerável, a redução das verbas orçamentárias sociais, o desemprego, os índices elevados de inadimplência civil e empresarial, o sucateamento do aparelho estatal, além da subjugação do Poder Judiciário, são algumas das facetas do modelo neoliberal, implementado na país há mais de uma década.

O resultado dessa equação bombástica não poderia ser outro: enfraquecimento das instituições, desordens provocadas pela desregulamentação econômica, pela pulverização do trabalho assalariado e alarmante aumento da pobreza e a criminalidade.

Nesse cenário, a política da criminalização exsurge como a única política pública verdadeiramente eficaz para conter a grande população empobrecida e contemplada com o figurino social da criminalidade.

Isso acarretou, paulatinamente, a supressão do Estado econômico, o enfraquecimento do Estado social e o fortalecimento e glorificação do Estado penal.

Em outros termos, a era de ouro do Estado Garantista foi deixada para trás, florescendo um Estado Mínimo, em que os investimentos em ensino, saúde, habitação, cultura, lazer e segurança pública são escassos.

Em verdade, somente diminuindo o verdadeiro abismo a separar as classes sociais neste país conseguiremos diminuir os índices de criminalidade, ainda que isso importe superação de um modelo econômico excludente, que fomenta o egoísmo e a luta por supremacia.

Até lá, cabe a cada um de nós, operadores do direito, diante da complexidade de facetas que envolvem as relações de poder, manejar o próprio arcabouço jurídico vigente de forma criativa, buscando conferir novos conceitos aos institutos normativos, abertos por sua natureza, fazendo prevalecer os ditames da nossa constituição, de aspiração democrática, rejeitando a ideia absurda de que o agigantamento do Estado Repressor é a solução para todos os males que nos afligem.

Certas verdades são simples. O verdadeiro problema é saber de que lado estamos: daqueles distantes de si mesmos e da realidade social; ou daqueles que buscam respostas novas e criativas para problemas sociais, encontrando-se consigo mesmo e comprometendo-se com o próximo, certos de que o fracasso de cada membro da sociedade significa o seu próprio fracasso.

A história dirá.

 


[1]     Juiz de Direito da Vara de Execuções e Contravenções Penais da Comarca de Porto Velho

[2]     Arantes, Paulo Eduardo – O novo tempo do mundo e outros estudos sobre a era da emergência. 1 ed., São Paulo: Boitempo, 2014.

Comentários

  • 1
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    Sebastião Farias 15/06/2018

    Nossa contribuição. "Para todas as pessoas de boa vontade interessadas no assunto e às organizações de defesa da cidadania do Brasil, nossa contribuição, para se quebrar a inércia e o comodismo cívico sobre a situação do país: Caros cidadãos brasileiros e, solidários aos direitos, igualdade, fraternidade e liberdade de todos os irmãos pátrios. Urge uma iniciativa fraterna e responsável de todos nós, pelo resgate do estado de direito; pelo resgate da democracia; pela valorização da educação, da saúde e da segurança públicas, nos termos da CF; pela valorização do cidadão e respeito ao seu voto; pelo resgate da governabilidade pacífica, justa, responsável e comprometida com o bem-estar da nação e do país; pelo repúdio público aos maus cidadãos, as organizações, as autoridades e aos políticos infiéis aos cidadãos e aos eleitores e, que desrespeitam a Constituição Federal, a ética do serviço público e que, estimulam o preconceito, o ódio, a injustiça, a desigualdade e a divisão entre patrícios; pelo resgate de uma justiça que seja imparcial, justa e igual para todos os brasileiros; por um Brasil forte, independente, justo, soberano e que tenha como objetivo, servir e beneficiar aos brasileiros e povos amigos por ele acolhidos ( https://www.terra.com.br/noticias/brasil/legado-de-vargas-sobrevive-60-anos-depois-de-sua-morte,c3e4c7466edf7410VgnVCM10000098cceb0aRCRD.html ) , etc. Urge também, que as pessoas e entidades de boa vontade interessadas, lancem uma Campanha Nacional de Instrução e Conscientização Popular dos Cidadãos Brasileiros, com petição ao Congresso Nacional, dentre outros temas importantes à , para que àquela Casa de Leis, aprove em caráter de urgência, Emenda Constitucional ou algo similar, Disciplinando e detalhando em caráter obrigatório e transparente que, “todos os parlamentares das áreas Federal/Distrito Federal, Estaduais e Municipais, através de suas Comissões de Fiscalização e Controle-CFCs ou Similares, dos Poderes Legislativos competentes e, no que couber, aos Tribunais de Contas afins, monitorem, acompanhem e fiscalizem em tempo real, a execução pelos Poderes Executivos competentes, desde o início, até a conclusão final da contratação de obras, da aquisições ou da prestação de serviços públicos à população, afins às Políticas Públicas de interesse do povo”. Em função desse novo comportamento prático dos parlamentares, em benefício do povo, “que suas instituições legislativas/Fiscalizatórias/Controladoras, apresentem publicamente à população, Relatórios Bimestrais de Acompanhamento e Avaliação da Execução, detalhando cada Objeto das Políticas Públicas em andamento, para conhecimento e acompanhamento dos cidadãos e contribuintes; do status de conformidade e qualidade do andamento de cada obra em execução e/ou executada e também, a situação funcional e qualitativa em que se encontra, cada tipo de serviço público prestado à população pelo Poder Executivo competente, no âmbito dessas Políticas Públicas”. Essa prática cidadã, deve se dar com foco: i) na consciência dos parlamentares, dos Presidentes e Membros de Comissões com funções Fiscalizatória e de Controle de que, daqui em diante, sua omissão individual ou coletiva, afins as função fiscalizatória proativa e em tempo real do Poder Legislativo competente, acarretará responsabilização institucional, ética e penal, nos termos da Constituição afim e das leis específicas em vigor, proporcionais aos males e prejuízos que causaram ou permitiram em função dessa omissão, à UF e à sociedade; ii) na conformidade da boa e correta aplicação dos recursos públicos: iii) na agilidade dos cronogramas estabelecidos; iv) na qualidade técnica e padrão dos materiais utilizados; v) na segurança e adequação das obras públicas contratadas; vi) na boa funcionalidade das instalações públicas existentes e; vii) na boa e responsável funcionalidade, buscando-se, a excelência dos serviços públicos prestados à população; etc,. Obrigação de todos os Poderes Legislativos, Federal/Distrito Federal, Estaduais e Municipais, “de divulgarem em todos os meios de comunicação existentes e que atinjam todos os municípios brasileiros e, de apregoarem em locais públicos de considerada frequência e trânsito de pessoas, para conhecimento dos cidadãos, de Relações Nominais dos Parlamentares: Presidente, Secretário e Membros das Comissões Permanentes (Temáticas)-CPs e/ou Comissões de Fiscalização e Controle-CFCs ou Similares, existentes na Câmara Federal, no Senado Federal, nas Assembleias Legislativas Estaduais de cada Estado/Distrito Federal e nas Câmaras Municipais de Vereadores de cada Município. Da mesma forma, Relação Nominal dos representantes fiscais de acompanhamento de cada Política Pública ou temática existente, dos Tribunais de Contas competentes”. Assim, no âmbito dos serviços públicos, dentre outras, são essas as competências e/ou atribuições fiscalizatórias dos parlamentares e das CPs e/ou CFCs: federal ( Artigos. 44 a 46, associados aos Artigos 49 e seus Incisos IX a XI; 50 e 51 da CF) - https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm ; estaduais ( Artigos 8º; 9º; 29 e seus Incisos XXXVI e XXXVIII; 36; 46 a 49 e 135. exemplo da CE/RO) - https://www.sefin.ro.gov.br/portalsefin/anexos/167.10916376409634CONSTITUICAO_ESTADUAL_ATUALIZADA_ATE_EC_Nº_75_11.PDF ; e municipais (Artigos 47; 48 e seus incisos VII, XVI e XVIII; 49; 50; 73 e 74. Exemplo da Lei Orgânica do Município de P. Velho/RO) - https://leismunicipais.com.br/lei-organica-porto-velho-ro ; por serem elas, auxiliadas pelos TCs, as primeiras instâncias da cadeia pública de Fiscalização e Controle Cidadã, bem como apoiados pelos Ministérios Públicos no que couber, conforme Art. 38 da LC-75/1993 e similares estaduais. Para que se tenha noção clara, o que se passa com a gestão pública, a fiscalização e controle proativo no Brasil, hoje, pode ser comparado com uma família, cujo patriarca, ao necessitar realizar uma obra em sua residência, contrata a empresa prestadora dos serviços que, conhecido o projeto, inicia os trabalhos de qualquer jeito, constrói, termina os acabamentos, cobre, pinta, termina o piso, por fim, conclui e entrega a obra. Agora, duas realidades fictícias para sua avaliação e comparação com o setor público: i) A empresa, durante o seu trabalho, não foi uma única vez, incomodada pela fiscalização do contratante; ii) A empresa, durante o seu trabalho, esteve sobre permanente fiscalização do contratante; Pergunta-se: desses cenários, qual o que não é desejável e, que tem mais chance de resultar em problemas para o contratante? Não há dúvidas de que, é o primeiro ítem, certo? Pois bem, a gestão de um pais, de um Estado ou de um Município, segue o mesmo princípio de uma família. Se a família que tem o Patriarca como gestor e fiscal, as unidades federadas possuem os Poderes Constitucionais e todos os meios legais e físicos, para gerar, planejar, executar, fiscalizar, controlar e produzir boas obras públicas, bons produtos públicos e bons serviços públicos para seus beneficiários, os cidadãos e contribuintes. Mas, a) sem instrução e consciência cívica e cidadã do povo, que é dono do PODER, mantenedor do tesouro e beneficiário das Políticas Públicas, para conhecer seus direitos e responsabilidades e, para no momento certo, saber votar e escolher seus representantes e fiscais, saber exigir, cobrar e responsabilizar os seus gestores e fiscais públicos; b) sem Fiscalização e Controle responsável e em tempo real das Políticas Públicas pelos Representantes e Fiscais Constitucionais do povo, não existe, como na atualidade, efetividade da conformidade da boa aplicação dos recursos públicos em benefício do povo, portanto, isso, essa omissão, é que gera e incentiva a corrupção; c) sem foco responsável na conformidade, economicidade, na qualidade, na boa funcionalidade das instituições prestadoras de serviços públicos, etc; d) sem fraternidade, sem justiça imparcial e equânime para todos, sem respeito aos direitos dos cidadãos, sem segurança, sem paz social e sem bem-estar, sem felicidade e sem satisfação dos cidadãos, como deveria acontecer, não existe nação e sim, tribos e incentivo ao crime e a corrupção . Pensem nisso. Tudo isso, se faz necessário conhecer-se, para que, a população, ou seja, o povo, que é o Patrão de todos, tenha conhecimento de quem é quem e responsável de que, na organização e harmonização dos Poderes Constitucionais e, na cadeia pública de fiscalização e controle, interno e externo, do que lhe interessa e, para que saiba a quem se reportar para exigir protagonismo e reclamar seus direitos. O povo deve tomar consciência de que, nas reclamações de seu interesse no âmbito do serviço público, em vez de se dirigir ao executor da obra ou prestação de serviço público ( Poder Executivo), deve dirigir-se ao seu Representante e Fiscal Constitucional, para reclamar e se informar até onde, essa autoridade está harmonizada com a situação do objeto, causa da reclamação do cidadão ou omisso em sua função de fiscalização proativa e corretiva. A justificativa para tudo isso, será: o combate aos corruptores e à corrupção na sua origem; a minimização de desvios de conduta e comportamentos aéticos no serviço público, dos homens e agentes públicos, no exercício da função; concorrerá para a minimização do desperdícios de recursos do tesouro público, daí decorrentes; concorrerá, também, para a eliminação de contratos superfaturados, de da mal versação de recursos públicos, de obras/serviços atrasados e/ou inacabados, de objetos sem qualidade; concorrerá ainda, para o aumento da boa e correta funcionalidade e da qualidade das obras e da prestação de serviços públicos à população; etc. Acho que vocês, cidadãos brasileiros e formadores de opinião, podem muito, melhorarem essas ideias e multiplicá-las, para que todos os cidadãos de nosso país, conheçam e tomem consciência de seus direitos, responsabilidades e de seu Poder Constitucional e, complementado sua iniciativa sobre esses assuntos, se interessando em lê e consultar com maior frequência, as Constituições Federal e a de seu Estado, assim como a Lei Orgânica de seu Município e, para se instruírem e se prepararem para melhor defenderem seus interesse e da Comunidade, bem como reclamarem e cobrarem com maior constância e amparo legal, os Presidentes e Membros das CFCs ou Similares de sua Assembleia Legislativa e/ou Câmara Municipal de Vereadores de seu município São essas, nossas singelas contribuições e sugestões para a melhoria de nosso ambiente comunitário e, um país que acreditamos e amamos, que é o nosso BRASIL, Terra da Santa Cruz e Coração do mundo e Pátria do Evangelho de Cristo. Façam sua parte amando ao seu próximo e, confiantes na liberdade, na fraternidade, na igualdade e na justiça imparcial, dons de Deus, que não tardarão a se manifestar na defesa de nossa pátria. Que Deus salve o Brasil. https://www.brasil247.com/pt/colunistas/carlosdincao/337148/Sobre-a-ignorância.htm ; https://outraspalavras.net/brasil/o-brasil-no-epicentro-da-guerra-hibrida/ ; https://www1.folha.uol.com.br/mundo/2018/04/brasil-e-outros-cinco-paises-suspendem-participacao-na-unasul-diz-agencia.shtml ; http://impactocna.com/colombia-ingresara-a-la-organizacion-del-tratado-del-atlantico-norte-otan/ ; Sebastião Farias Um cidadão brasileiro nordestinamazônida"

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